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O caráter inadiável da PEC dos Precatórios

Por Fernando Bezerra Coelho
Atualização:
Fernando Bezerra Coelho. FOTO: MARCOS OLIVEIRA/AG. SENADO Foto: Estadão

A pandemia da Covid-19 expôs o Brasil e o mundo a uma crise sanitária, econômica e social sem precedentes, exigindo dos governos e da sociedade esforços de grandes proporções. Entre os seus efeitos mais perversos, está a redução generalizada da renda no País. Segundo dados recentes do IBGE, o rendimento médio mensal do brasileiro sofreu queda recorde em 2020, atingindo o menor valor em oito anos. No período mais agudo da pandemia, ampliou-se o número de famílias que passaram a depender dos programas sociais do governo, sobretudo do Auxílio Emergencial, elevando de 0,7% para 24% a proporção de domicílios que dependia desse tipo de ajuda, além de outros benefícios. Na região Nordeste, o índice de pessoas vivendo dos programas sociais, aposentadorias e pensões foi maior do que aquelas que viviam da renda de trabalho.

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É indiscutível, portanto, a necessidade de se abrigar um programa social robusto no espaço fiscal a ser aberto pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 23, de 2021, enviada pelo governo para análise do Congresso Nacional no sentido de compatibilizar o pagamento dos precatórios com o teto do gasto público. Entre os aperfeiçoamentos ao texto aprovado pela Câmara dos Deputados, propusemos em nosso relatório transformar o Auxílio Brasil em programa permanente, vinculando parte do espaço fiscal do Orçamento da União de 2022 ao financiamento do benefício de R$ 400,00 para 17 milhões de brasileiros. Isso significa que R$ 52 bilhões dos R$ 91,6 bilhões do espaço fiscal serão destinados ao Auxílio Brasil, e a diferença será usada para custear os gastos corrigidos pelo valor do salário mínimo, que são as despesas previdenciárias e assistenciais, os mínimos constitucionais aplicados em saúde e educação e a transferência para os demais poderes. Dessa forma, evoluímos para superar as divergências quanto ao tamanho do espaço fiscal que resulta da alteração da base de correção do teto de gastos, que passará a acompanhar o período de referência utilizado para o ajuste das despesas obrigatórias. E ao introduzir o caráter permanente do Auxílio Brasil no arcabouço constitucional, a PEC 23 afasta eventual vinculação entre o programa e o processo eleitoral que se aproxima, atendendo à demanda do Senado Federal.

Também tivemos o cuidado de incluir na emenda constitucional um comando para que uma fonte de recursos seja identificada para financiar o Auxílio Brasil a partir de 2023, como determina dispositivo da Lei de Responsabilidade Fiscal. Com isso, reiteramos o compromisso do governo com o controle dos gastos e a sustentabilidade da dívida pública. Considerando os impactos da PEC 23, o cenário que se apresenta é de déficit de -1,5% do Produto Interno Bruto em 2022, o menor em sete anos, fazendo do governo atual o primeiro nas últimas duas décadas a entregar uma despesa em relação ao PIB menor do que recebeu. Ademais, o avanço da vacinação e a retomada da atividade econômica apontam para o aumento estrutural da arrecadação em R$ 110 bilhões - recursos mais do que suficientes para financiar o Auxílio Brasil.

Portanto, são injustificáveis as desconfianças apregoadas por setores da sociedade em relação ao compromisso do governo com os pilares da responsabilidade fiscal, sugerindo, inclusive, a ruína do teto de gastos. Lembro outras medidas de fortalecimento dos alicerces fiscais do País que sucederam ao teto, como a Reforma da Previdência e a PEC Emergencial, que colocou a sustentabilidade da dívida como ponto central da gestão fiscal.

O relatório que apresentamos à PEC 23 ainda enfrenta a necessidade que se impõe de se discutir o crescimento das despesas da União com o pagamento de precatórios. Para se ter uma ideia, em 2010, foram pagos R$ 14,3 bilhões com o cumprimento de decisões judiciais, o que equivalia a 0,35% do PIB. Para 2022, a conta dos precatórios alcança surpreendentes R$ 89,1 bilhões ou 0,95% do PIB projetado - aumento nominal de 78,7% em relação ao que foi pago em 2020. Ao propor a criação de Comissão Mista do Congresso Nacional para aprofundar os debates sobre as despesas com sentenças judiciais, o Parlamento faz jus à prerrogativa constitucional de controle e acompanhamento dos gastos públicos, hoje pressionados pelo expressivo volume de precatórios.

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Tenho a convicção de que a PEC 23, em sua essência, enfrenta o desafio inadiável de oferecer alento e dignidade aos milhões de brasileiros que sofreram os efeitos mais perversos da pandemia ao mesmo tempo em que preserva os fundamentos da política fiscal, assegurando a continuidade do processo de consolidação fiscal e de recuperação econômica. É imprescindível, neste momento, ter muito claras as prioridades do povo brasileiro, sendo as mais prementes o enfrentamento da crise social e a retomada da economia. É na consecução desses objetivos que se revela, afinal, o conteúdo mais importante da noção de responsabilidade dos homens públicos. Estou convencido que o Senado Federal não faltará ao País, e a grandeza e o espírito público que regem esta Casa prevalecerão sobre os ruídos e as divergências políticas.

*Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), líder do governo no Senado Federal e relator da PEC dos Precatórios

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