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O aumento da sinistralidade nos planos de saúde e a judicialização do direito à saúde

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Por Maria Emília de Rueda
Atualização:
Maria Emília de Rueda. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Há mais de um ano, debates sobre direito à assistência médica se intensificaram no Brasil e no mundo. A pandemia de coronavírus levou muitas pessoas a repensar a forma de utilização dos planos de saúde. Dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) apontam que em 2020 os gastos com sinistralidade - termo utilizado para os custos das operadoras com utilização dos planos - caíram pela diminuição dos procedimentos eletivos.

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Contudo, os cinco primeiros meses de 2021 já mostraram crescimento de mais de um terço nos gastos das operadoras de planos de saúde, como aponta levantamento da Associação Brasileira dos Planos de Saúde (Abramge). O aumento é motivado pela segunda onda do Coronavírus, que tem atingido mais jovens, em paralelo ao retorno de procedimentos de rotina.

A baixa utilização durante o primeiro ano de pandemia tem motivação clara. As pessoas pensaram duas vezes antes de realizarem procedimentos eletivos, comprometendo-se apenas aos exames e atendimentos necessários. Isso leva a reflexão sobre a realidade das operadoras no Brasil em tempos comuns.

Diferente do que foi observado no último ano, a taxa de sinistralidade no país apresenta grave aumento anual. O que muitas vezes é ignorado por usuários dos planos é que o aumento da sinistralidade possui reflexos não apenas para as operadoras, mas para todos os usuários que necessitam dos planos.

Os contratos de planos de saúde coletivos no Brasil costumam contar com uma cláusula de reajuste por sinistralidade, necessária para calcular o aumento das despesas das operadoras e seu reflexo nas mensalidades. Isso implica em aumento de custos e nas mensalidades dos planos de saúde, consequentemente, no acesso a mais pessoas.

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Esse aumento recorrente da sinistralidade dos planos de saúde no Brasil está particularmente atrelado a questões culturais de tentativas de desvirtuação do objeto contratado. Infelizmente, é comum identificar casos em que um membro da família (por exemplo, um dos filhos) utiliza a "carteirinha" do plano contratado para outro membro. Outro exemplo é o de fraudes de utilização recorrente do mesmo usuário em clínicas sem a real prestação do serviço, com objetivo de favorecer o médico ou a empresa que estaria "atendendo".

Se por um lado há mau uso por parte de alguns usuários, questões ainda mais delicadas costumam onerar os planos de saúde: a adoção de medidas judiciais para autorização de procedimentos não acordados no contrato. A Justiça brasileira ainda tem adotado uma postura de acatar os pedidos de cobertura na maior parte dos casos. Entretanto, deixa de ser observado que o custo gerado às operadoras, se não repassados aos demais usuários, inviabilizaria a continuidade do contrato bem como a saúde privada no país.

Há um claro dilema social sobre o direito de cada indivíduo à saúde. Apesar de decisões judiciais assegurarem determinados procedimentos que não foram estabelecidos em contrato, os reajustes provocados por esses incrementos na sinistralidade dos planos de saúde impedem centenas ou milhares de outras pessoas a aderirem a seus próprios planos.

Debates vêm sendo feitos pelas operadoras de planos de saúde, comunidade jurídica e sociedade civil, mas é preciso que se aprofunde na questão. As soluções ainda não são claras, mas certamente devem levar em consideração a atual crise econômica que o país atravessa em decorrência da pandemia e a própria situação de emprego e renda do Brasileiro. Não é simples pensar em alternativas, mas é com o diálogo entre os atores desse dilema - levando em consideração os múltiplos fatores que nos levam a essa situação - que iniciaremos práticas mais sustentáveis de saúde privada.

*Maria Emília de Rueda é sócia fundadora do Rueda & Rueda Advogados, bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco - UNICAP (2005), em Relações Internacionais pela Faculdade Integrada do Recife - FIR (2006), e especialista e em Direito Empresarial e Econômico através da Instituição Fundação Getúlio Vargas - FGV em 2013

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