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O ASG passa pelos dados

Por Thoran Rodrigues
Atualização:
Thoran Rodrigues. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Muito tem se falado hoje sobre as iniciativas ASG (de Ambiental, Social e Governança), ou a sigla correspondente em inglês, ESG (de Environmental, Social, Governance). Esses temas não só estão na pauta de diretoria das grandes empresas, mas também estão proeminentes na sociedade como um todo. Tanto os consumidores quanto os trabalhadores das empresas têm a expectativa de que todas as empresas estejam engajadas com questões dessa natureza. Mais do que isso, diversos estudos têm mostrado que empresas que ativamente se preocupam com esse assunto tendem a ter resultados financeiros melhores em relação às que não demonstram a mesma preocupação.

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Naturalmente, as discussões em torno do ASG tendem a focar nos processos das empresas. No âmbito social, se discute como os processos que envolvem ou tocam em pessoas podem ser mais inclusivos e respeitosos da diversidade, especialmente os processos seletivos, de avaliação e de evolução de carreira. No quesito ambiental, empresas têm cada vez mais se preocupado com o impacto ambiental de suas operações, seja no escopo do consumo de energia (e na utilização de fontes de energia alternativa), ou mesmo o impacto direto, de geração de resíduos e consumo de recursos naturais. Na governança, ampliam-se os processos de auditoria e controle que garantem que a empresa está funcionando da forma esperada, e que aumentam a transparência das operações dela para seus stakeholders e para a sociedade como um todo.

Na maioria dessas conversas, no entanto, os dados ficam de fora. Apesar de toda a sua importância para as empresas e para a sociedade como um todo, e no rápido desenvolvimento da economia dos dados, a maioria dos gestores de empresas, e até mesmo a população em geral, consideram os dados como um pequeno elemento dentro do universo de tecnologia, que, se por acaso forem considerados como um problema, são algo que as áreas de T.I. devem se preocupar em resolver.

Porém, a verdade é que o impacto dos dados sobre as questões ASG é muito maior do que as pessoas imaginam. No lado ambiental, o processamento de dados é um dos, senão o maior gerador de impacto ambiental das áreas de tecnologia. O crescimento exponencial do volume de dados sendo gerado, coletado e guardado pelas empresas faz com que a demanda por equipamentos de armazenamento (discos, memória, e outros) só aumente, necessitando de produção e mais matéria-prima, e gerando cada vez mais resíduos eletrônicos. Junto com o armazenamento, enfrentamos problemas cada vez maiores na gestão e análise desses dados. Conforme o volume de dados aumenta, as análises computacionais sobre esses dados se tornam mais complexas, requerendo mais processamento e, portanto, mais eletricidade. E, para complicar ainda mais essa questão, as técnicas mais avançadas de inteligência artificial, que tem se espalhado rapidamente pelo meio corporativo, demandam ordens de magnitude a mais de processamento.

Alguns estudos inclusive apontam que o elevado custo computacional - que, no final, é um custo ambiental - dessas técnicas tem impossibilitado a inovação nesse campo por empresas menores. Também é fácil perceber a importância dos dados para as questões de governança. De fato, é impossível se falar de governança corporativa e transparência perante a sociedade sem falarmos na geração, análise e disponibilização de dados por parte das empresas. Não só isso, mas com o tamanho e a complexidade operacional que muitas empresas possuem hoje, é praticamente impossível pôr em prática processos de governança, auditoria e controle que não sejam apoiados por automações e análises que utilizam dados. E, obviamente, a publicação e divulgação de dados para a sociedade é um dos pilares do conceito de transparência que, por sua vez, é parte integral da governança.

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O maior impacto dos dados, e o mais difícil de ser percebido, contudo, ocorre na área social. Dados são um elemento quase invisível em todos os processos das empresas, operando por trás das cenas de uma forma complexa, e muitas vezes, trazem consequências não esperadas. Imagine, por exemplo, uma empresa que quer contratar pessoas de uma forma mais inclusiva, valorizando a diversidade. Por mais que sejam implementados processos e sistemas para evitar vieses na seleção, praticamente todos os mecanismos automáticos (ou semiautomáticos) de filtragem de candidatos vão ser preconceituosos, por conta de características sociais que estão embutidas nos currículos das pessoas.

O impacto dos dados vai muito além da seleção de pessoas, permeando todos os processos operacionais das empresas existentes hoje. Modelos de concessão de crédito, em sua maioria, utilizam dados indicativos da capacidade financeira dos indivíduos (ou empresas), praticamente garantindo que quem mais precisa de acesso a recursos financeiros não vai conseguir. Os processos de prevenção à fraude, especialmente no varejo e no comércio eletrônico, dão um peso grande para o endereço de entrega do produto, carregando assim todas as distorções e preconceitos que estão embutidos na distribuição geográfica das cidades. O resultado final desses vieses inerentes dos dados que apoiam os processos de tomada de decisão das empresas é um aumento do custo social dos produtos e serviços, impactando a sociedade como um todo.

É fundamental, portanto, uma conscientização das empresas sobre todos esses impactos dos dados sobre as questões de ASG. Sem uma análise cuidadosa das informações que são utilizadas em seus processos, e da forma como essas informações são processadas e analisadas, é praticamente impossível atingir os objetivos nessas diferentes áreas. No fundo, todas as iniciativas ASG passam pelos dados, e eles precisam ser um elemento central dessas discussões.

*Thoran Rodrigues é fundador e CEO da BigDataCorp

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