Como se sabe, no ano passado, o Plenário do STF, em duas sessões, julgou o mérito do RE nº 574.706/PR, para concluir que é inconstitucional a inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins.
A União Federal opôs embargos de declaração requerendo a modulação dos efeitos do julgamento, bem como o aclaramento de outros pontos da decisão, relacionados ao conceito de faturamento para a legislação societária e à abrangência da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins (se deve ser excluído o ICMS pago ou o ICMS destacado nas notas fiscais).
Apesar de até hoje não terem sido julgados os aludidos embargos, fato é que o racional utilizado pelo Supremo para concluir que o ICMS não deve ser incluído na base de cálculo do PIS e da Cofins tem reverberado diretamente - e com razão - em outras relevantes discussões tributárias (jurídica e economicamente).
No julgamento de tal recurso extraordinário, prevaleceu o entendimento de que o conceito de faturamento/receita bruta constante da Constituição Federal não comporta a inclusão de qualquer ingresso no patrimônio das empresas, mas apenas aquele que se agrega definitivamente ao seu patrimônio e que corresponda ao produto da venda de bens e/ou da prestação de serviços resultantes das suas atividades operacionais.
Conclusão que deflui naturalmente do raciocínio empregado pelo Supremo é a seguinte: ainda que haja previsão legal assim exigindo, tributos que apenas transitam na contabilidade da empresa, sem configurar acréscimo patrimonial, não compõem o conceito constitucional de faturamento/receita bruta.
Assim, um primeiro debate que tem sido afetado pelo julgamento do Supremo é aquele referente à inconstitucionalidade da inclusão do ISS na base de cálculo do PIS e da Cofins.
Embora a repercussão geral deste tema em particular tenha sido reconhecida no RE nº 592.616/RS, os juízes de primeira instância e os Tribunais têm julgado a matéria favoravelmente aos contribuintes, aplicando exatamente o entendimento predominante no julgamento do RE nº 574.706/PR.
Outra questão que tem tido seu desfecho influenciado pelo julgamento do Supremo é aquela relativa à exclusão do ICMS na base de cálculo da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB), instituída pela Lei nº 12.546/11, também conhecida como "contribuição substitutiva de folha".
Por simetria, os Tribunais vêm seguindo o entendimento do STF no sentido de que o ICMS não compõe o conceito de receita bruta/faturamento e, portanto, deve ser excluído também da base de cálculo da CPRB.
Caminhando no mesmo sentido, recentemente, foram proferidas decisões favoráveis aos contribuintes no que diz respeito à exclusão do PIS e da Cofins de suas próprias bases. Este tema, bem como o da exclusão do ICMS da base de cálculo da CPRB, remontam, inevitavelmente, à alteração do conceito de receita bruta promovida pela Lei nº 12.973/14.
Com efeito, referido diploma legal alterou o Decreto-lei nº 1.598/77, de tal forma a prever que "na receita bruta incluem-se os tributos sobre ela incidentes".
Contudo, nos parece que, em relação a qualquer uma das controvérsias tributárias aqui mencionadas, demonstra-se absolutamente inaplicável esse conceito de receita bruta trazido com o advento da Lei nº 12.973/14, uma vez que ele desborda completamente dos limites do conceito constitucional de faturamento/receita bruta definido pelo Supremo no julgamento do RE nº 574.706/PR.
Por isso, o desfecho favorável aos contribuintes também nas discussões acima descritas é mera decorrência lógico-jurídica da motivação levada a efeito pela Corte Suprema para definir, nos autos do RE 574.706/PR, que o "ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins".
De fato, considerando que se julgou pela existência de um conceito constitucional de faturamento/receita bruta, pouco importa se é possível sustentar que a Lei nº 12.973/14 previu (implícita ou explicitamente) que os tributos incidentes sobre a receita bruta compõem o conceito de receita bruta, pois, ao assim dispor, acabou incorrendo em manifesta inconstitucionalidade, por afrontar a delimitação conceitual existente na Constituição Federal, tal como definiu o próprio Supremo.
Portanto, não há dúvidas de que, seja no contexto anterior à Lei nº 12.973/14, seja no cenário posterior à sua vigência, os contribuintes que se sentirem lesados em razão das discussões acima descritas devem, com amparo no entendimento firmado pelo STF no RE 574.706/PR, pleitear junto ao Judiciário o seu direito de reaver eventuais indébitos pagos nos últimos cinco anos, bem como de deixar de incluir tributos indevidos no conceito de faturamento/receita bruta.
*Marcello Pedroso é sócio e Rômulo Coutinho é advogado associado, da área tributária do Demarest Advogados