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Novas alíquotas previdenciárias criam disparidade na magistratura sem solucionar déficit

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Por Fernando Mendes
Atualização:
Fernando Mendes. Foto: Ajufe/Divulgação

Passou a valer, nesta segunda-feira (02/03), a mudança no modelo de custeio do sistema previdenciário, com alíquotas progressivas para as contribuições. A alteração implementada pela Reforma da Previdência, contudo, criou uma disparidade de tratamentos entre a Justiça da União e a Estadual e esse é um dos principais pontos da Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI 6258 - movida pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) contra a reforma.

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A  Emenda Constitucional 103/19, que estipulou as novas regras para a previdência social, ao não incluir estados e municípios na Reforma, fez com que apenas servidores federais tivessem sua parcela de sacrifício aumentada e, em relação à Magistratura, provocou uma completa fragmentação de tratamento, permitindo, em tese, que diversos sistemas contributivos sejam previstos para  os juízes, o que vai de encontro ao entendimento do Supremo Tribunal Federal que, na ADI 3854, estabeleceu a unidade nacional da Magistratura.

Mas o modelo de alíquotas progressivas, propagandeado pelo Executivo e Parlamento como necessário para reequilibrar o caixa da previdência, produzirá efeito contrário ao pretendido:  relatório de fevereiro da Instituição Fiscal Independente (IFI) revela que, em 10 anos, a progressividade das alíquotas previdenciárias causará diminuição de arrecadação na casa dos R$ 7,9 bilhões.

Isso porque no antigo formato de escalonamento das alíquotas previdenciárias no Regime Geral, a variação era de 8% a 11%, divididas em três faixas salariais. Com as atuais regras, as alíquotas vão variar de 7,5% a 14%, com quatro faixas salariais.

A mudança nas alíquotas de contribuição do regime geral será diferente do impacto fiscal da alteração na contribuição para o servidor público federal. Os servidores federais passarão a seguir uma tabela progressiva que varia de 7,5% a 22%.

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Dessa forma, embora o novo modelo provoque o aumento líquido de arrecadação no regime próprio dos servidores da União (RPPS ) na ordem de R$ 18 bi, no Regime Geral de Previdência (RGPS), exatamente o que apresenta hoje maior déficit,  haverá uma queda de arrecadação de mais de R$ 26 bi, provocando um redução de 7,9 bilhões em 10 anos no quando analisado em conjunto os dois regimes.

Esses dados trazidos pelo IFI contradizem o que vinha argumentando o Executivo, que sempre defendeu a necessidade da progressividade das alíquotas como forma de reequilibrar o caixa da Previdência.

No ímpeto de avançar as negociações em torno da Reforma, e com a consequente exclusão dos estados e municípios do texto da Emenda Constitucional 103, a tabela progressiva das alíquotas se transfigurou em um instrumento de tratamento desigual, ferindo o princípio da isonomia.

Torna-se agora difícil entender quais vantagens para a sociedade, e para o modelo de Previdência social, serão conquistadas com a progressividade das alíquotas. Não bastasse, gera a disparidade de tratamentos dentro do Sistema de Justiça. Até o momento, como vimos,  a única "recompensa" é a queda no montante total de arrecadação previdenciária.

A progressividade das alíquotas no regime próprio da União também provocou outro efeito colateral: grande parte dos servidores públicos que haviam ingressado nas carreiras antes de 2013, optaram pelo migração de regime, passando a contribuir no sistema que limita o valor da contribuição ao teto do RGPS, o chamado regime de previdência complementar, o que se consubstanciou em mais um fator de redução na arrecadação do RPPS.

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Durante a tramitação da PEC da reforma da previdência, a AJUFE defendeu que a adoção de alíquota única, no patamar de 14%, evitaria essa distorção. Mas a propaganda foi bem feita e se vendeu, infelizmente, a ilusão de que o sistema de progressividade seria melhor para os cofres públicos.

A ADI 6258 proposta pela Ajufe na Corte Suprema pode corrigir esse erro, sem causar qualquer prejuízo para o Governo Federal no objetivo do reajuste das contas públicas. Ao contrário, contribuirá para essa finalidade.

*Fernando Mendes é juiz federal e presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil

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