Foto do(a) blog

Notícias e artigos do mundo do Direito: a rotina da Polícia, Ministério Público e Tribunais

Nova onda de patinetes e as relações de trabalho

PUBLICIDADE

Por Gisela da Silva Freire e Viviane de Azevedo Rodrigues
Atualização:
Viviane de Azevedo Rodrigues e Gisela da Silva Freire. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Recentemente, a prefeitura de São Paulo anunciou a intenção de regulamentar o uso dos patinetes elétricos. Dias depois, houve a publicação de um decreto municipal incluindo meios de transporte motorizados ou não, de natureza pública ou privada, no sistema de bilhete único.

PUBLICIDADE

Quatorze capitais brasileiras já contam com serviços de compartilhamento de bicicletas; dez capitais já compartilham patinetes. Enquanto isso, circulam nas redes sociais comunicados corporativos proibindo os empregados de usarem patinetes como meio de deslocamento ao trabalho.

Mas há realmente causa para preocupação por parte das empresas? Sim, uma vez que é crescente o número de acidentes envolvendo esse popular meio de locomoção e isso causa impacto nas relações de trabalho.

De acordo com o artigo 21, IV, d, da Lei 8.213/1991, são equiparados a acidentes de trabalho os acidentes ocorridos no percurso da residência para o local de trabalho ou deste para aquela, qualquer que seja o meio de locomoção, inclusive veículo de propriedade do empregado.

Assim, se o empregado sofrer um acidente a caminho ou retornando do trabalho (não importando o meio de locomoção) e, em decorrência do sinistro, ficar afastado por mais de 15 (quinze) dias, percebendo benefício previdenciário, este terá direito à estabilidade acidentária de 12 meses após seu retorno ao trabalho.

Publicidade

Com a entrada em vigor da reforma trabalhista, em novembro de 2017, há quem defenda uma incompatibilidade entre a lei previdenciária e a nova redação do artigo 58 da CLT, que agora determina que o período de trajeto entre trabalho e casa do empregado não deve ser considerado como tempo à disposição do empregador, razão pela qual ocorrências nessas circunstâncias não poderiam ser equiparadas a acidentes de trabalho.

Mesmo sem consenso sobre o tema, a Receita Federal excluiu os acidentes de trajeto da fórmula para apuração do FAP (Fator Acidentário de Prevenção) em 2018, embora continue reconhecendo tais ocorrências como acidente de trabalho. Consequentemente, em caso de sinistros envolvendo patinetes no trajeto residência-trabalho (e vice-versa), a medida mais recomendável é emitir um comunicado de acidente de trabalho - CAT.

Além da questão previdenciária, discute-se também se haveria responsabilidade civil do empregador nesses eventos.

Da mesma forma como no caso dos acidentes típicos ou doenças do trabalho, a responsabilidade civil do empregador é subjetiva e dependerá da comprovação de sua concorrência culposa ou dolosa para o sinistro. Por conseguinte, num acidente de trajeto envolvendo patinete, não deverá haver responsabilização extracontratual por danos sofridos pelo empregado.

O fato do empregador fornecer ou incentivar o uso de tal meio de locomoção não significa que teria responsabilidade na hipótese de o empregado sofrer um acidente.

Publicidade

Em que pese tenha o Tribunal Superior do Trabalho uniformizado a jurisprudência quanto à responsabilização do empregador nos acidentes ocorridos em transporte por este fornecido, esse entendimento é baseado na hipótese em que o empregador é equiparado ao transportador, cuja responsabilidade contratual objetiva está prevista no artigo 735 do Código Civil e na Súmula 187 do STF, situação que não é análoga ao caso dos patinetes.

PUBLICIDADE

Além disso, a proibição de utilização de quaisquer meios de transporte pelo empregador, de forma unilateral, é inválida: este não pode interferir no direito do empregado de escolher seu meio de locomoção.

Por enquanto, resta ao empregador conscientizar seus empregados sobre o uso de equipamentos de proteção individual e respeito às leis de trânsito, bem como recomendar que os empregados se informem quanto à operação dos equipamentos. Não há como fugir da modernidade.

*Gisela da Silva Freire e Viviane de Azevedo Rodrigues são sócia e associada, respectivamente, do setor Trabalhista do Cescon, Barrieu, Flesch & Barreto Advogados

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.