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Não cabe a ministro de Estado pedir doação eleitoral, diz Moro sobre Mantega

Na decisão que mandou prender ex-ministro da Fazenda, juiz da Lava Jato aponta depoimento do empresário Eike Batista que revelou encontro em novembro de 2012

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Por Mateus Coutinho , Ricardo Brandt , Julia Affonso e Fausto Macedo
Atualização:

Guido Mantega foi preso na Arquivo X e solto horas depois. Foto:  Nacho Doce/Reuters

Na decisão que mandou prender temporariamente o ex-ministro da Fazenda, Guido Mantega e outros sete investigados, o juiz Sérgio Moro apontou que não cabia ao então ministro pedir, em 2012, doações eleitorais para o PT. Cinco horas após a prisão do ex-ministro, o juiz da Lava Jato mandou soltar Mantega por entender que ele estava acompanhando tratamento médico da esposa e não oferece riscos à investigação.

A observação de Moro foi feita ao analisar o conjunto de elementos apontados pela força-tarefa da Lava Jato para pedir a prisão do ex-ministro. Dentre os elementos há um relato do empresário Eike Batista, dono da OSX, de que teria ouvido expressamente do então ministro da Fazenda em novembro de 2012 o pedido para quitar dívidas de R$ 5 milhões da campanha do PT.

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"Seu interlocutor teria sido o então Ministro da Fazenda, a quem não cabe solicitar doações eleitorais ao partido do governo, ainda mais doações subreptícias", assinalou o juiz da Lava Jato.

Ainda segundo a Lava Jato, e conforme o próprio relato de Eike feito aos investigadores em maio de 2016, o empresário aceitou fazer o pagamento e o repasse foi acertado pela OSX com a publicitária Mônica Moura, mulher e sócia de João Santana, que foi desde 2006 o marqueteiro das campanhas de Lula e Dilma. O dono da OSX depôs como testemunha à Lava Jato.

Em dezembro de 2012, foi feito, então um contrato de prestação de serviços entre a offshore de Eike, Golden Rock Foundation, e a offshore do casal de marqueteiros Shellbill Finance no valor de US$ 2,3 milhões. A Shellbill só passou a ser declarada as autoridades brasileiras por João Santana e Mônica Moura após a deflagração da Lava Jato e, em depoimento a Moro, eles admitiram que a empresa chegou a receber, em 2013, US$ 4,5 milhões referentes a dívidas de caixa 2 da campanha eleitoral de Dilma em 2010.

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Questionado pelo Ministério Público Federal, Eike confirmou que o valor deste contrato foi efetivamente repassado ao PT, ainda que a empresa de João Santana e Mônica Moura tivesse realizado um serviço de marketing para justificar o contrato com a OSX, mas negou ter recebido ameaças de Mantega:

"MPF: Me permita que... um outro questionamento, senhor Eike. Isso tinha por objetivo de certa forma repassar valores para o Partido dos Trabalhadores?

Declarante: Claro. No fundo, no fundo sim. O Ministro de Estado me pediu, que que você faz? Eu tenho 40 bilhões investidos no país, como é que você faz?

MPF: Ele fez algum tipo de ameaça ao senhor? Fez assim, olha, se não acontecer isso, vai acontecer aquilo?

Declarante: Não, não. Não. Isso nunca existiu. Até porque o capital era meu. Não tinha o que me dar".

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Em sua versão, Eike alegou que o pagamento não tinha relação com o contrato com a Petrobrás, mas se tratava de doação eleitoral, o que chamou a atenção de Moto. "O problema é que a transferência de recurso foi feita por meio subreptício, através de contas secretas mantidas no exterior e com simulação de contratos de prestação de serviço, meio bem mais sofisticado do que o usual mesmo para uma doação eleitoral não contabilizada", aponta Moro na decisão.

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A OSX formou com a Mendes Junior o consórcio Integra, que venceu a licitação para a construção das plataformas P-67 e P-70 de exploração do pré-sal, no valor estimado em US$ 922 milhões na época em que foi fechado o contrato, novembro de 2012, no mesmo período em que foi feita a solicitação de Mantega para Eike.

Diante disso, e considerando ainda outros elementos das transações financeiras da Mendes Junior para empresas de fachada, o juiz da Lava Jato entendeu não se tratar de um episódio isolado, mas sim de uma prática que faz parte de um "complexo estratagema" criminoso envolvendo offshores e contratos fictícios para fraudar licitações na Petrobrás, que pode botar em risco a investigação, justificando assim a prisão dos investigados.

"A falsificação de documentos para acobertar crimes coloca em risco a integridade da instrução e da investigação, havendo risco da produção de novos documentos falsos para conferir suporte a contratos simulados ou superfaturados", assinala Moro.

COM A PALAVRA, O ADVOGADO JOSÉ ROBERTO BATOCHIO, QUE DEFENDE MANTEGA:

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O advogado José Roberto Batochio, que defende Guido Mantega, informou que ainda desconhece os motivos do decreto de prisão temporária do ex-ministro da Fazenda. Batochio foi avisado logo cedo da presença da Polícia Federal na residência de Mantega, na rua Leão Coroado, no Alto de Pinheiros.

Por telefone, o criminalista conversou o ex-ministro, que estava no Hospital Albert Einstein, acompanhando a mulher que luta contra um câncer.

Batochio também conversou por telefone com o delegado da PF que comandava a equipe no encalço do ex-ministro.

O advogado recomendou a Mantega que aguardasse a PF na portaria do hospital. "Vamos verificar qual é a imputação ao ministro Mantega para depois nos manifestarmos", disse o criminalista. "Mas posso garantir que o ministro jamais pediu propinas ou recursos para partido político."

COM A PALAVRA, A ASSESSORIA DO PT: O presidente nacional do PT, Rui Falcão, afirmou nesta quinta-feira de manhã que a prisão do ex-ministro Guido Mantega é "arbitrária, desumana e desnecessária". De acordo com ele, a 34ª fase da Operação Lava Jato, denominada Arquivo X, deveria se chamar "Operação Boca de Urna", uma vez que acontece às vésperas das eleições municipais. Falcão lembrou que Mantega é ex-ministro, tem endereço fixo e nunca se negou a dar esclarecimentos, sendo assim midiática a prisão em um hospital.

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Na opinião do presidente do PT há também um "excesso de coincidências" nas ações da Lava Jato. Além da proximidade das eleições para a deflagração da nova fase, ele citou o fato de o juiz Sérgio Moro ter recebido a denúncia contra o ex-presidente Lula anteontem (20/9), no mesmo dia em que Lula realizava uma teleconferência no lançamento da campanha "Stand With Lula" (Eu defendo Lula) organizada pela Confederação Sindical Internacional (UTC/CSI) em Nova York.

Sobre as suposições apresentadas hoje, de que haveriam repasses de verbas para o PT, a resposta do Partido dos Trabalhadores é a seguinte:

"O PT refuta as ilações apresentadas. Todas as operações financeiras do partido foram realizadas estritamente dentro dos parâmetros legais e posteriormente declaradas à Justiça Eleitoral."

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