Ricardo Brandt e Fausto Macedo
02 de dezembro de 2018 | 05h00
Sérgio Moro. Foto: Dida Sampaio/Estadão
Sérgio Moro tem trabalhado politicamente para aprovar ainda em 2018 no Congresso um projeto de lei do Executivo sobre medidas contra criminosos e empresas envolvidos com a lavagem de dinheiro e o financiamento do terrorismo. O objetivo é evitar que o Brasil entre para a “lista negra” de nações não engajadas mundialmente com a prevenção e o combate a esses crimes e sofra assim sanções econômicas e comerciais de países como Estados Unidos e membros da União Europeia.
Nos dez primeiros dias de futuro superministro da Justiça e da Segurança Pública – completos ontem -, o ex-juiz da Lava Jato dividiu seu tempo entre o estudos de dados do governo e a composição da equipe com a tarefa estritamente política de negociar com deputados e senadores a votação e aprovação do projeto de lei 10.431/2018.
Na Câmara dos Deputados desde junho, a proposta altera legislação brasileira de sanções a pessoas físicas e jurídicas envolvidas com crimes de lavagem e terrorismo e coloca o regramento jurídico nacional em acordo com as resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas e afasta o risco do Brasil ser suspenso do Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (GAFI)
Espécie de fórum intergovernamental mundial com sede da Suíça que promove leis e normas globais contra a lavagem de dinheiro, o GAFI comunicou o Brasil em 2010 de suas deficiências na adoção das resoluções a serem adotadas pelos seus integrantes. Em junho, o País foi advertido de que o não cumprimento das recomendações poderia resultar em sanções, como a expulsão – medidas menos drásticas foram adotadas para pressionar o governo local.
Em 2015, o governo Dilma Rousseff aprovou a lei 13.170/2015, que adequou boa parte das leis às exigências internacionais para desarticular o trânsito de dinheiro ilegal pelo mundo e assim prevenir e combater o terrorismo, o narcotráfico e o crime organizado. Mas sanções decorrentes de resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas ficaram em aberto. O projeto 10.431/2018 foi apresentado ao Congresso para sanar essa lacuna.
Nomeado coordenador do grupo Técnico de Justiça, Segurança e Combate à Corrupção do Gabinete de Transição no dia 20, o ex-juiz da Lava Jato iniciou sem alarde os trabalhados nos bastidos para convencer o Congresso da importância da aprovação da lei ainda este ano. No mesmo dia, a Câmara dos Deputados aprovou requerimento de urgência de plenário para o projeto.
O Estado apurou que Moro tem afirmado a interlocutores que a aprovação do PL 10431/2018 nesse mandato ainda afastaria totalmente o risco de suspensão do GAFI ou qualquer outra punição ao Brasil. Um dos interlocutores do futuro ministro foi o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM/RJ). Além dessa proposta, os dois conversaram sobre outros temas polêmicos, como alterações nas leis de execução da pena.
Na sexta-feira, 30, Moro falou publicamente sobre sua primeira investida política no Congresso para aprovar o projeto de congelamento dos bens de lavadores de dinheiro e terroristas – parte do pacote de medidas que prometeu viabilizar ao aceitar o cargo de ministro do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL). Em conversa com jornalistas, no Centro Cultural Banco do Brasil, sede da equipe de transição, o ex-juiz destacou o risco de o Brasil ser suspenso do GAFI e a necessidade de aprovação da lei “até fevereiro”.
“O Brasil sendo suspenso dessa organização, isso vai fazer um grande mal para a imagem do Brasil, para a imagem internacional, e vai fazer um grande mal para os negócios.”
A costura política com o Congresso envolve ainda a aprovação do projeto no Senado, sem emenda, para que não tenha que passar mais uma vez pela Câmara e a sanção pelo presidente da República.Moro tem reforçado os riscos para a economia e para os negócios no Brasil, caso o GAFI promova sanções ao País. Se for suspenso do grupo e receber uma classificação de país de alto risco ou não cooperativo, operações de bancos estrangeiros podem ser suspensas, pode haver fuga de recursos internacionais, sanções em negócios internacionais e aumento do prêmio de risco país, entre outras.
Nesta sexta-feira, Moro confirmou Roberto Leonel como número um do Coaf, órgão vinculado diretamente ao GAFI que é atualmente vinculado ao Ministério da Fazenda e passará a responder à Justiça e Segurança Pública. O conselho é fundamental no trabalho de prevenção e combate aos crimes de lavagem de dinheiro, principal foco da equipe para combater não só a corrupção, mas em especial, o crime organizado e as facções criminosas.
Equipe. O trabalho político com o Congresso divide o tempo da formação da equipe que Moro montada para colocar em prática seus planos de criar um “Plano Real” de combate ao crime organizado e à corrupção no País.
Nas duas primeiras semanas de trabalho em Brasília, o ex-juiz montou boa parte de sua equipe, com confirmação de nomes chaves da pasta, como o futuro diretor-geral da Polícia Federal, o futuro chefe do Departamento Prisional Nacional (Depen), o futuro chefe do Coaf e a criação de uma nova secretaria na estrutura do ministério, a de Operações Policiais Integradas.
Levou para cargos estratégicos membros da chamada “República de Curitiba”, formada por pessoas ligadas a ele e às operações de renome em que participou no Paraná, como a Lava Jato e o caso Banestado. Moro já oficializou os nomes da delegada Erika Marena, que originou a Lava Jato como chefe do DRCI, o superintendente da PF no Paraná, Maurício Valeixo como diretor-geral da PF, o ex-superintendente da PF do Paraná Rosalvo Ferreira Franco como secretário nacional de Operações Policiais Integradas, o chefe do setor de inteligência da Receita em Curitiba, Roberto Leonel, como chefe do Coaf, o delegado chefe de Foz do Iguaçu, como titular do Depen. E ainda vai anunciar novos nomes, como o do delegado Márcio Anselmo, que iniciou o caso Lava Jato, e deve integrar sua equipe no governo. (COLABOROU BRENO PIRES/BRASÍLIA)
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