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Moro põe Lula contra a parede

Durante o interrogatório a que foi submetido por quase cinco horas, ex-presidente levou bronca do juiz da Lava Jato sobre declarações que deu em evento do PT na sexta-feira, 5, de que um dia poderá prender quem o acusa; 'Talvez o sr. não devesse fazer esse tipo de declaração', advertiu o magistrado

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Por Fausto Macedo , Julia Affonso , Bruno Ribeiro , Ricardo Brandt e Luiz Vassallo
Atualização:

Lula. Foto: Reprodução

O juiz federal Sérgio Moro passou uma descompostura no ex-presidente Lula durante a audiência realizada nesta quarta-feira, 10. Moro fustigou o petista com seguidas indagações sobre declarações que ele fez durante em evento do PT na sexta-feira, 5. "Se eles não me prenderem logo, quem sabe um dia eu mando prendê-los pelas mentiras que eles contam', disse Lula, na ocasião, o que provocou irritação entre os investigadores da Lava Jato.

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"O que o sr. quis dizer com esse tipo de declaração?", questionou o juiz durante o interrogatório a que Lula foi submetido na ação penal do caso triplex.

"Eu quis dizer o seguinte. A história não para com esse processo, a história um dia vai julgar se houve abuso ou não de autoridade nesse caso do comportamento, tanto da Polícia Federal quanto do Ministério Público, no meu caso."

"E o sr. pretende mandar prender os agentes públicos?", insistiu o magistrado na admoestação. "Como é que vou saber, nem sei se eu vou tá vivo amanhã", esquivou-se Lula.

"Foi o que o sr. afirmou lá (no evento do PT)."

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"Uma força de expressão. O dia que o sr. for candidato o sr. vai ter muita força de expressão", disse o petista.

"Acha apropriado um ex-presidente da República dizer isso?", seguiu Moro.

"Acho que não, acho que não."

Interrompido seguidas vezes por advogados de defesa, Moro destacou que sua pergunta tinha carárer jurídico. E repetiu. "O sr. acha apropriado esse tipo de declaração?'

Cristiano Zanin Martins, um dos defensores de Lula, anotou que a ação na qual o ex-presidente estava sendo interrogado se refere ao caso do triplex do Guarujá. "Manifestações políticas do ex-presidente não devem ser objeto desse depoimento", disse Zanin.

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Outro defensor de Lula, o criminalista José Roberto Batochio, disse que 'vossa excelência só tem autoridade para julgar'.

Moro voltou a pôr Lula contra a parede. "Vou manter a minha pergunta jurídica. A afirmação feita pelo sr. no curso do processo, o sr. acha apropriado esse tipo de declaração pública?"

"Já falei que foi um ato de força de expressão. Sabe, primeiro presidente não manda prender."

"E o sr. vai continuar fazendo esse tipo de declaração?"

"Não sei, não sei, não sei."

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"Que vai prender os agentes públicos?", perguntou Moro.

"Não sei, não sei, não prendo. Presidente não prende ninguém, não conheço na história, a não ser no regime autoritário."

"Então, talvez o sr. não devesse fazer esse tipo de declaração", advertiu o juiz da Lava Jato. Lula, então, falou dos grampos da Lava Jato que pegaram diálogos dele com a ex-primeira dama Marisa Letícia e outros familiares. "Com todo o respeito, todos nós devemos tomar cuidado com as declarações. O sr. sabe, por exemplo, da mágoa profunda, eu tenho mágoa profunda, conversas minhas com minha mulher. Eu nunca falei nada. Eu tô tranquilo, vamos esperar. O tempo se encarrega de contar a história."

A denúncia do Ministério Público Federal sustenta que Lula recebeu R$ 3,7 milhões em benefício próprio - de um valor de R$ 87 milhões de corrupção - da empreiteira OAS, entre 2006 e 2012. As acusações contra Lula são relativas ao recebimento de vantagens ilícitas da empreiteira por meio do triplex 164-A no Edifício Solaris, no Guarujá (SP), e ao armazenamento de bens do acervo presidencial, mantido pela Granero de 2011 a 2016. O petista é acusado de lavagem de dinheiro e corrupção.

Moro aceitou a denúncia em 20 de setembro de 2016.

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Fachada do Condomínio Solaris, no Guarujá. Foto: MOTTA JR./FUTURA PRESS

Triplex. O Edifício Solaris era da Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop), a cooperativa fundada nos anos 1990 por um núcleo do PT. Em dificuldade financeira, a Bancoop repassou para a OAS empreendimentos inacabados, o que provocou a revolta de milhares de cooperados. O ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto foi presidente da Bancoop.

A ex-primeira-dama Marisa Letícia (morta em 2017) assinou Termo de Adesão e Compromisso de Participação com a Bancoop e adquiriu 'uma cota-parte para a implantação do empreendimento então denominado Mar Cantábrico', atual Solaris, em abril de 2005.

Em 2009, a Bancoop repassou o empreendimento à OAS e deu duas opções aos cooperados: solicitar a devolução dos recursos financeiros integralizados no empreendimento ou adquirir uma unidade da OAS, por um valor pré-estabelecido, utilizando, como parte do pagamento, o valor já pago à Cooperativa.

Segundo a defesa de Lula, a ex-primeira-dama não exerceu a opção de compra após a OAS assumir o imóvel. Em 2015, Marisa Letícia pediu a restituição dos valores colocados no empreendimento.

Bens. A Lava Jato afirma que a OAS pagou durante cinco anos pelo aluguel de dez guarda-móveis usados para armazenar parte da mudança do ex-presidente Lula quando o petista deixou o Palácio do Planalto no segundo mandato. A empreiteira desembolsou entre janeiro de 2011 a janeiro de 2016, R$ 1,3 milhão pelos contêineres, ao custo mensal de R$ 22.536,84 cada.

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Toda negociação com a transportadora Granero teria sido intermediada pelo presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, que indicou a OAS como pagante com o argumento de que a empreiteira é uma "apoiadora do Instituto Lula." Para investigadores da Lava Jato, os fatos demonstram "fortes indícios de pagamentos dissimulados" pela OAS em favor de Lula. Isso porque o contrato se destinava a "armazenagem de materiais de escritório e mobiliário corporativo de propriedade da construtora OAS Ltda", mas na verdade os guarda-móveis atendiam a Lula.

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