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Ministro que se aposenta no STF terá seu voto validado

Por João Badari
Atualização:
João Badari. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Em sessão do dia 9 de junho de 2022, o STF decidiu que os votos apresentados por ministros que se aposentaram continuarão valendo, caso o julgamento que foi iniciado em plenário virtual passe a ser levado para análise do plenário físico. Este procedimento de "reinício do julgamento" em plenário presencial pode ser requerido pelo pedido de destaque.

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O pedido de destaque, previsto na resolução 642/19, é a requisição de um ministro ou das partes envolvidas no processo, para que este seja retirado do plenário virtual e o seu julgamento passe a ocorrer no ambiente presencial, reiniciando todo o julgamento. Com isso os votos juntados pelos ministros também são zerados, porém a dúvida trazida: "e caso o ministro venha a se aposentar?".

Este é um novo procedimento adotado pela Corte, e sua otimização está ocorrendo aos poucos, conforme surgem os obstáculos processuais. A Revisão da Vida Toda deixou claro que o pedido de destaque realizado por um ministro pode ferir frontalmente o RISTF, o CPC e princípios constitucionais que mantém o Estado Democrático de Direito, por isso a necessidade de suas readequações.

O pedido realizado na Revisão após 11 votos já juntados, foi o estopim para que ocorresse o debate sobre o aperfeiçoando dos pedidos de destaque, e os julgamentos em plenário virtual fossem aperfeiçoados, por este ser um importante meio tecnológico, trazendo julgamentos mais céleres e menos custosos.

A RVT já contava com 11 votos juntados, inclusive o do ministro divergente que solicitou a anulação do julgamento. E um detalhe chamava ainda mais a atenção: um julgamento com um novo colegiado, desconsiderando assim o voto do Ministro Relator, que se aposentou no final de 2021 e foi favorável aos aposentados. Temos aqui um caso em que o ministro já havia votado, todo o colegiado havia se pronunciado e faltando apenas 20 minutos para o encerramento da questão o pedido de destaque foi suscitado.

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A realização deste pedido após o Ministro juntar seu voto, e após 8 meses que este processo esteve com pedido de vistas, trouxe grande preocupação para os juristas, pois um perigoso precedente estava sendo criado, com a possibilidade de diminuir a importância do colegiado, onde um integrante da Corte, desafeto da solução trazida pela maioria poderia anular todo o julgamento realizado.

O procedimento adotado passaria a afetar a credibilidade da Corte, trazendo também grande insegurança jurídica ao cidadão, com uma questão que afeta a vida de milhares de aposentados. O processo já possuía a manifestação de todos os ministros, e se mostrava encerrado.

Levanto aqui uma questão: é um processo que dura quase uma década, e no STF o processo já teve seu julgamento iniciado há um ano. Lembro que os aposentados estão falecendo no curso deste processo, e outros estão perdendo o direito de obter a tão almejada justiça revisional em razão do prazo decadencial de 10 anos. Não houve um fato novo para que o direito não lhes fosse garantido pela decisão tomada, e este processo até o momento não foi concluído.

O destaque necessita ter motivação, que fundamente a sua requisição e posteriormente a aceitação do órgão. Este foi o entendimento externado pelo próprio ministro Nunes Marques na ADIn 6.630/DF, e o fato do colegiado votar diferente do que um Ministro espera não é motivo de anulação de julgamento, e deve ser respeitada a vontade da Corte.

Notem como este processo se mostrou emblemático, pois teve em sua relatoria o ministro aposentado Marco Aurélio que, após exaustiva produção de provas fundamentou sua decisão pelo desprovimento do recurso trazido pelo INSS. Sua decisão se pautou em precedentes da Corte e também em princípios fundamentais previstos na Constituição Federal, dentre eles a segurança jurídica.

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E mais, a relatoria do processo passou a ser exercida pelo ministro André Mendonça, que era membro da AGU quando este já possuía 10 votos juntados. Lembro que a AGU é interessada na causa, em favor do INSS.

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O julgamento ser reiniciado sem o voto do ministro aposentado se mostraria um desrespeito com todo o trabalho e estudo realizado quando relator. E vou além, ela se mostra um desprestígio ao processo e demais Ministros que terão seus votos anulados ao aposentar-se. Em 2023 mais 2 ministros estarão aposentados: Rosa Weber e Ricardo Lewandowski.

Se mostrou evidente que a decisão do colegiado passaria a ter um peso menor que o pedido realizado pelo Ministro Nunes Marques, que não concordou com a solução da Corte na matéria e um novo julgamento sem o voto do ministro que se aposentou poderia reverter o resultado. A resolução se tornaria mais forte que o regimento interno, e a vontade unitária passaria a prevalecer sobre a dos demais.

E isso foi acertadamente corrigido pelo STF na sessão de 09 de junho ao julgar a ADIn 5399, onde o ministro Alexandre de Moraes abriu uma questão de ordem para corrigir as regras do plenário virtual. Um dos temas tratados, além da consideração de votos de ministros que já se aposentaram, foi o momento em que o destaque pode ser requerido.

O pedido de destaque realizado pelas partes possui o prazo de 48 horas antes do início da sessão, e deve ser deferido pelo Relator. Porém, para os ministros a resolução não estabeleceu um prazo. Os Ministros Moraes e Lewandowski levantaram a questão de que este pedido não poderá ser feito se todos os ministros já declararem seus votos.

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Entendo que esta correção regimental tenha por base a preclusão consumativa (e até mesmo lógica), que se mostrou uma medida impositiva ao seu pedido realizado após a juntada de todos os votos, pois deveria ser realizada enquanto os ministros votam. Com 11 votos já declarados e tendo conhecimento do resultado final, o pedido passa a ferir frontalmente a segurança jurídica e credibilidade das decisões do Plenário.

Como o julgamento em plenário virtual deve se tornar uma realidade mais presente que o presencial, é vital adequarmos a resolução para que a mesma não se sobreponha a regimentos, códigos e princípios. O pedido de destaque passa a ser reestruturado para respeitar os princípios administrativos: moralidade, finalidade e motivação, para não acabar se tornando um ato que não condiz com o espírito e a finalidade da norma.

De forma muito clara, ficou constatado que ao ter seu voto divergente não sendo seguido pela maioria da Corte, um pedido de anulação do julgamento foi solicitado. E esta anulação, pela resolução 642 não precisa ser fundamentada e posteriormente passar pela admissão do relator ou presidente. Porém, é necessário que critérios sejam respeitados para o regular andamento do processo na Corte Superior.

Em um processo que está em jogo a defesa do preceito fundamental da segurança jurídica constitucional, isso passaria a trazer um abalo também na segurança jurídica das decisões da Corte. No caso de um cenário que possa indicar uma possível derrota, qualquer ministro pode pedir destaque para zerar uma votação desfavorável a si.

Seria uma perigosa inovação processual o Ministro que teve seu voto vencido, buscar reverter votos que são contrários a seu posicionamento por meio de veto. Este mecanismo traria ofensa ao princípio da colegialidade, segurança de legitimidade democrática. Se mostrou evidente que a decisão do colegiado passa a ter um peso menor que o pedido realizado por um Ministro.

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Por tais razões, é muito importante que o STF estabeleça que após 11 votos já declarados e juntados no processo, o pedido de destaque precluiu e não poderá ser realizado por qualquer ministro. Isto se mostra como um recado da Corte de que a decisão unitária não pode se sobrepor ao que é decidido pelo seu colegiado. E também se faz como uma medida para combater a interferência externa do executivo e legislativo em suas decisões, trazendo respeito a separação dos poderes.

Passo aqui ao ponto principal do debate de ontem: a validade do voto de ministro que se aposentou no processo que teve pedido de destaque. Em razão de uma imposição processual e regimental o ministro Moraes levantou este debate, e o STF decidiu que estes votos seguem sendo respeitados e computados no plenário presencial caso o julgamento seja reiniciado. Portanto, o voto do Ministro Marco Aurélio será considerado na presente revisão de aposentadoria.

O Regimento do STF possui força de lei, e a resolução não poderia prevalecer sobre este, caso o pedido de destaque seja acatado, e o julgamento venha a ocorrer em Plenário presencial. Este regimento é Lei material, por disposição da Constituição, e prevê em seu art. 134, § 1º onde reiniciado o julgamento depois de vista dos autos pedida por qualquer dos ministros, "serão computados os votos já proferidos pelos Ministros, ainda que não compareçam ou hajam deixado o exercício do cargo".

Não se mostraria aceitável que a resolução tenha força de se sobrepor ao Regimento, portanto, caso um Ministro, que já votou, deixe seu cargo o seu voto deverá permanecer. O destaque é mecanismo para ampliação do debate e não pode ser utilizado de maneira estratégica, possibilitando vetar uma decisão que se mostra anunciada, com todos os votos declarados.

Vale destacar também, para a manutenção do voto do Ministro aposentado, o Código de Processo Civil em seu artigo 941, § 1º, que dispõe: "O voto poderá ser alterado até o momento da proclamação do resultado pelo presidente, salvo aquele já proferido por juiz afastado ou substituído". O texto previsto no CPC permite a alteração do voto, porém isso não será possível no caso de juiz afastado ou substituído, o que ocorreu neste processo.

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Pelo fato da deliberação colegiada já ter iniciado, o seu voto será preservado, se mostrando de acordo com o princípio da unidade da decisão do colegiado, porque o julgamento se inicia com o voto do relator. A Resolução não pode desconsiderar o julgamento anterior como ele não tivesse acontecido.

Na ADIn 6.630/DF foi apresentada questão de ordem, onde a parte requereu nova sustentação oral, em razão de pedido de destaque. Os atos que ocorreram no Plenário Virtual foram confirmados novamente, dentre eles as sustentações orais. E aqui ressalto a fundamentação utilizada pela Min. Cármen Lúcia:

"Digamos que tivesse havido ali, nos votos que já foram tomados, alguém que se aposentou, que na minha compreensão do Regimento não permite sequer o destaque, porque o Regimento impede esse tipo de situação. O voto tomado do aposentado, que estava no exercício regular, não pode ser desfeito". Note que a Corte novamente privilegiou este entendimento de manutenção, não podendo muito menos o voto de um Ministro que se aposentou ser desfeito.

A adequação da Corte em sua resolução traz respeito aos princípios como o do juiz natural, unidade da decisão do colegiado, segurança jurídica e devido processo legal substancial (garantia de que as leis sejam concebidas e definidas respeitando a legislação processual, estando de acordo com os interesses sociais e os fundamentos do Estado Democrático.

O ministro Moraes afirmou que não considerar os votos de quem se aposentou seria "subverter os comandos constitucionais da segurança jurídica e do juiz natural". E o ministro Fachin complementou que existe "simetria entre o plenário virtual e o plenário físico", não podendo invalidar os votos dos ministros aposentados.

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A Revisão previdenciária foi o holofote para a readequação da Resolução 642/19, pois trouxe a tona os problemas trazidos pelos pedidos de destaque no plenário virtual, demonstrando que este instrumento precisava de maior regulamentação, para que não fosse criado um perigoso mecanismo infralegal que possibilite o desprezo as decisões da maioria da Corte.

Ficou decidido que o voto do ministro que se aposenta será considerado se houver a mudança de plenário, e esperamos também que outro ponto presente no debate de ontem esteja expresso na resolução: após todos os votos declarados o pedido de destaque não poderá ser requerido por qualquer ministro, pois as decisões do colegiado devem ser respeitadas.

Os ministros foram claros durante o julgamentos das ADIs que após 11 votos declarados o processo não poderá mais ter pedido de destaque, e esta modificação foi solicitada pelo Presidente, ministro Luiz Fux, que seja enviada de forma administrativa para a adaptação e votação da resolução. Acreditamos que isso deve ser aplicado para os antigos processos que tiveram o pedido de destaque realizado, porém o seu julgamento ainda não foi iniciado no plenário presencial, preservando a isonomia e segurança jurídica.

Sendo assim, no caso da Revisão da Vida Toda, o único ato que falta é a proclamação do resultado de 6X5 a favor dos aposentados.

*João Badari é advogado especializado em Direito Previdenciário, diretor de demandas judiciais do IEPREV - Instituto de Estudos Previdenciários e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Advogados

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