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Ministro ou sabujo?

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Por Wálter Fanganiello Maierovitch
Atualização:
 

Até um primeiranista de faculdade de Direito sabe que um ministro de Estado é um agente da autoridade do presidente da República.

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Não tem o ministro de Estado, em essência, autoridade própria, mas delegada pelo presidente. Isso não quer dizer, no entanto, que tenha o ministro de Estado de ser um cumpridor de ordens. Um ajudante de ordens, para usar um jargão castrense.

Se lembrarmos o acontecido com Moro, houve uma legítima resistência quando ele se recusou, por falta de justa causa, a substituir dirigentes da Polícia Federal: diretor-geral e superintendentes regionais.

Mais ainda, Moro resistiu ao perceber que a real intenção do presidente Bolsonaro era, por interposta pessoa, interferir na Polícia Federal. Tudo no interesse pessoal, familiar e político. Ou seja, as substituições pretendidas não tinham por foco o interesse público.

Esse quadro pós-saída de Moro, com vaga aberta no Ministério da Justiça e da Segurança Pública, deixa Bolsonaro na chamada "sinuca de bico".

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Buscar um nome de respeito e conhecimento nos temas da pasta, Justiça e Segurança, ou "alguém" com a tarefa principal de blindar o presidente e os filhos? No último caso seria um conivente em ilegalidades, com abuso de autoridade.

Bolsonaro, pelo que se sabe, foi aconselhado pelos militares a buscar uma solução técnica e um nome acima de suspeitas. Puro sonho: ninguém emprestaria um bom nome a um presidente ignorante, impulsivo e fronteiriço.

Como já sabem até as carpas dos espelhos d'água do Palácio do Planalto, nenhum jurista ou operador do Direito e de Segurança Pública, com inteligência a dominar a vaidade e vocacionado à legalidade democrática, aceitou o convite de Bolsonaro.

O mesmo deu-se, pelo que se sabe, com consultados ex-ministro do Supremo. Não quiseram nem ouvir falar.

Todos os ministros que passaram pela excelsa Corte recordam da justificativa de Célio Borja. Esse ex-ministro do Supremo aceitou ser ministro da Justiça do já enredado Collor de Mello. Depois do desastre do impeachment alegou ter aceitado o convite para evitar golpe, manter a legalidade e o regime democrático. Quis sair como herói, num atentado à inteligência dos brasileiros.

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Por outro lado, convenhamos: integrar um governo de presidente amalucado e sempre na contramão do mundo civilizado não atrai homens públicos de bem.

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De se acrescentar. No governo Bolsonaro, os filhos de cabeças desmobiliadas influenciam e existe, para completar, o ideólogo Olavo de Carvalho, autointitulado filósofo e, no fundo, um Rasputin de trópicos bananeiros.

Bolsonaro encontrou portas fechadas. Daí, partiu em busca de solução tirada da própria cabeça. Buscar um amigo: Jorge Oliveira.

Com certeza, um amigo "careca" de saber, até por ser secretário-geral da Presidência da República, estar Bolsonaro sob risco iminente de sofrer um processo de impeachment. E, se perder o advogado em panos de procurador-geral da República, Augusto Aras, terá complicações processuais penais. Sem olvidar os três rebentos investigados criminalmente, incluído o vereador licenciado, gerente do chamado "gabinete do ódio". A propósito, o deputado Eduardo Bolsonaro, eleito por São Paulo, está sob risco, na Câmara, de responder a processo disciplinar por quebra de decoro.

Também  existem os inquéritos apuratórios no Supremo, com o ministro Moraes a não abrir mão dos delegados federais auxiliares. O mais novo pedido de abertura de inquérito, com o ínclito ministro Celso de Mello como relator, poderá resultar em surpresa para Aras e isto no caso de desmembramento, a se manter no Supremo só as imputações a envolver Bolsonaro: Moro não tem mais foro privilegiado.

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Jorge Oliveira não tem currículo com peso para alcançar uma prestigiosa pasta, que recebeu a ampliação para cuidar da Segurança Pública, ou seja, para dar, na atividade principal de coordenação, tranquilidade e paz social.

Seu principal atributo é ser amigo da família Bolsonaro. O pior do seu currículo é o de ter sido chefe de gabinete de Eduardo Bolsonaro.

Jorge Oliveira deverá assumir a pasta sem contar com um mínimo de confiança dos cidadãos brasileiros. Evidentemente, terá o apoio da escumalha que participou do ato golpista ocorrido na frente do Quartel-General do Exército, certamente com Caxias e Osório a girar de indignação nas sepulturas.

Quando Bolsonaro fala ser ele o presidente e estar legitimado a fazer as designações na Polícia Federal, procura dar verniz de legalidade à fala. A película de verniz é frágil, pois o agir de Bolsonaro, dado o interesse privado, caracteriza improbidade na administração. Falta de retidão e ética.

Na Pinacoteca Nacional de Capo di Monte, em Nápoles, está exposto o famoso quadro de Pieter Brugel, pintado em 1568. Trata do cego a guiar cegos na direção do abismo. Jorge Oliveira será um deles, sob o governo, a condução, de Bolsonaro.

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Num pano rápido, Jorge Oliveira poderá chegar ao ministério em panos de sabujo e com a tarefa de salvar vidas políticas danadas: damnatus, para lembrar o padre Vieira.

*Wálter Fanganiello Maierovitch, 72 anos, jurista, professor, conferencista, desembargador aposentado e Cavaliere della Repubblica Italiana

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