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Marco Aurélio suspende inquérito que investiga Bolsonaro

A paralisação do inquérito vale até o plenário do STF decidir sobre o depoimento do presidente da República à Polícia Federal

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Por Rafael Moraes Moura e Breno Pires/ BRASÍLIA
Atualização:

O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal. Foto: Dida Sampaio / Estadão

Em uma vitória para o Palácio do Planalto, o ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou nesta quinta-feira (17) a suspensão do inquérito que apura se o presidente Jair Bolsonaro tentou interferir politicamente na Polícia Federal. A paralisação do caso vale até o plenário do STF decidir sobre como deve ser feito o depoimento de Bolsonaro aos investigadores - pessoalmente ou por escrito.

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A decisão foi tomada por Marco Aurélio Mello porque o relator do caso, Celso de Mello, está de licença médica até o dia 26 deste mês por conta de uma cirurgia. Marco Aurélio é o segundo ministro com mais tempo de atuação no STF, atrás apenas do decano.

"Mostra-se inadequada a atuação individual objetivando aferir o acerto, ou não, de entendimento do relator. Avesso à autofagia, cabe submeter ao pleno o agravo formalizado, para uniformização do entendimento", determinou Marco Aurélio Mello. "Determino a suspensão da tramitação do inquérito até a questão ser submetida ao pleno."

Bolsonaro entrou na noite da última quarta-feira (16) com um recurso no Supremo contra a decisão de Celso de Mello que determinou que ele prestasse um depoimento presencial. O relator também havia autorizado o ex-ministro Sérgio Moro a a enviar perguntas a serem respondidas pelo presidente. O inquérito foi aberto com base nas acusações levantadas por Moro, ao deixar o cargo de ministro da Justiça, em abril deste ano.

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Segundo o Estadão apurou, a decisão do decano foi vista com ressalvas por integrantes de diferentes alas do STF, que apontam que o tribunal já garantiu ao então presidente Michel Temer o direito de prestar depoimento por escrito em duas ocasiões distintas.

Mesmo assim, derrubar o entendimento de Celso, que se aproxima da aposentadoria, é considerado um gesto delicado por magistrados. Uma das figuras mais respeitadas do Supremo, Celso vai deixar o tribunal em novembro, abrindo a primeira vaga para indicação de Bolsonaro.

Caberá agora ao presidente da Corte, Luiz Fux, definir quando o caso vai ser discutido pelo plenário. De acordo com auxiliares do Supremo, Fux deverá consultar Celso de Mello antes de marcar a data de julgamento. A tendência é que a discussão só ocorra quando o decano já tiver retornado regularmente às atividades.

No Planalto, a avaliação foi a de que a estratégia jurídica de Bolsonaro deu certo e evitou uma nova polêmica com o STF, já que o chefe do Executivo "seguiu as regras" ao entrar com um recurso no próprio Supremo para contestar o depoimento presencial. O Planalto considera que o decano se tornou um militante político contra o governo e joga com o tempo para que o processo mude de mãos com a aposentadoria do ministro. Para aliados de Bolsonaro, decisões do STF que tragam impactos sobre outros poderes devem ser tomadas de forma colegiada, pelo plenário, e não individualmente.

Enquanto o depoimento por escrito cria um "ambiente controlado", em que os esclarecimentos podem ser ajustados e revistos por auxiliares antes de a resposta ser formalmente enviada ao STF, o formato presencial abre margem para novos questionamentos dos investigadores e o comportamento imprevisível do presidente da República.

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Intimação. Nesta quarta-feira, antes de acionar o STF, a Advocacia-Geral da União (AGU) recebeu um ofício da PF que informou a intimação de Bolsonaro para a realização do interrogatório. No documento, a PF ofereceu três datas para que o presidente apresentasse "declarações no interesse da Justiça":  21, 22 ou 23 de setembro de 2020, às 14 horas.

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A defesa do presidente acionou o Supremo para que Bolsonaro tenha direito a prestar o depoimento por escrito, assim como foi permitido ao então presidente Michel Temer, em duas ocasiões distintas, pelo próprio STF.

Em entrevista ao Estadão nesta quinta-feira, Marco Aurélio Mello antecipou que adiaria o depoimento de Bolsonaro. "Eu jamais examinaria o merecimento do ato dele (Celso de Mello), sozinho. Então como a Polícia Federal já adiantou os dias 21, 22 e 23 o agendamento, eu resolvi parar. A consequência da decisão de submissão ao plenário é não se ter o depoimento enquanto isso. consequência, seria o adiamento", disse Marco Aurélio à reportagem, antes de assinar a decisão.

Para Marco Aurélio Mello, não se pode julgar com preconceito. "Processo não tem capa. Processo tem conteúdo. E julgar é missão sublime, ocorre a partir da ciência e consciência do julgador - nada além disso."

Privilégio. Um dos precedentes do Supremo usados pela AGU foi a decisão tomada em 2017, pelo ministro Luís Roberto Barroso, ao permitir que Temer apresentasse esclarecimentos por escrito sobre uma investigação envolvendo irregularidades no setor portuário. O ministro Edson Fachin, relator de um outro inquérito, aberto com base na delação da JBS, garantiu a Temer o mesmo direito.

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"Note-se: não se roga, aqui, a concessão de nenhum privilégio, mas, sim, tratamento rigorosamente simétrico àquele adotado para os mesmos atos em circunstâncias absolutamente idênticas em precedentes muito recentes desta mesma Egrégia Suprema Corte", afirmou a AGU ao STF.

A avaliação de integrantes do primeiro escalão do governo é que era preciso marcar posição e confrontar o tratamento diferenciado a Jair Bolsonaro em relação a outros presidentes que também prestaram depoimento.

No recurso, a AGU pede a reconsideração da decisão de Celso de Mello ou que a determinação de depoimento presencial seja suspensa, até que o recurso do presidente seja julgado pelo plenário do STF.

Decisão. Na semana passada, Celso de Mello divulgou decisão em que contrariou o procurador-geral da República, Augusto Aras e determinou que Bolsonaro prestasse depoimento pessoalmente, no inquérito que apura suposta interferência na Polícia Federal, aberto após acusação do ex-ministro Sérgio Moro, da Justiça e Segurança Pública.

O decano do Supremo não adotou o procedimento sugerido pelo chefe do Ministério Público Federal, para quem o depoimento poderia ser tomado por escrito.

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Em sua decisão, Celso de Mello destacou que a possibilidade de depoimento por escrito é uma prerrogativa de presidentes apenas quando são testemunhas, e não quando são investigados - o que é o caso. O inquérito foi aberto em abril após Sérgio Moro pedir demissão apontando interferência indevida na PF. O ex-ministro entregou o cargo por não concordar com a demissão do diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, determinada por Bolsonaro./ COLABOROU TÂNIA MONTEIRO

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