Os executivos da maior empreiteira do País decidiram buscar o acordo de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República nos processos da Operação Lava Jato. O empreiteiro Marcelo Odebrecht, preso na Operação Erga Omnes, desde 19 de junho de 2015, está entre os que devem fazer a colaboração. O acordo depende do aval e da eventual homologação no Supremo Tribunal Federal.
Mais influente empreiteira do País, a Odebrecht mantém sólidos contatos com o universo da política brasileira. Por isso, o anúncio agitou os gabinetes de Brasília no início da noite de ontem. A expectativa é de que Marcelo Odebrecht e os demais executivos possam revelar detalhes capazes de impactar até o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff.
A empreiteira, entre outras acusações, é investigada por ter feito reformas no sítio utilizado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em Atibaia (SP) e por ter repassado valores ao marqueteiro João Santana, responsável pelas campanhas eleitorais do próprio Lula, em 2006, e de Dilma Rousseff, em 2010 e em 2014.
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Lula também é investigado pelo Ministério Público do Distrito Federal sob suspeita de tráfico de influência em favor da Odebrecht no exterior.
Nesta terça à noite, o Ministério Público Federal em Curitiba divulgou a seguinte nota: "O Ministério Público Federal não fez acordo com a Odebrecht ou seus executivos e qualquer acordo, neste momento, será restrito às pessoas que vierem antes e cuja colaboração se revelar mais importante ao interesse público".
Segundo o Estado apurou, no entanto, as negociações devem evoluir para a delação premiada do grupo comandado por Marcelo Odebrecht.
Pesou na decisão da empresa, que já está negociando acordo de leniência com a Controladoria-Geral da União, a deflagração da Operação Xepa. A 26.ª etapa da Lava Jato tem base essencialmente na colaboração da ex-secretária do Grupo Odebrecht Maria Lúcia Guimarães Tavares. Presa em fevereiro na Operação Acarajé, que teve como alvo principal o marqueteiro João Santana, ela revelou os caminhos da propina paga pela empreiteira.
Estratégia. O anúncio marca uma mudança radical na estratégia de defesa da Odebrecht e de seu presidente afastado, Marcelo, filho de Emílio Odebrecht e neto de Norberto Odebrecht. Desde o início da Lava Jato, ele optou pelo confronto com a força-tarefa da operação e o juiz federal Sérgio Moro, de Curitiba. A defesa dele recorreu, sem sucesso, das prisões decretadas pelo magistrado e chegou a comandar uma forte reação pública às investigações de corrupção e de desvios na Petrobrás.
Na residência da ex-secretária da empreiteira, a Polícia Federal apreendeu um programa de computador com os arquivos dos pagamentos ilícitos.
Também pesou na decisão dos executivos da construtora em fazer a delação a condenação do empreiteiro Marcelo Odebrecht. Acusado de lavagem de dinheiro, corrupção ativa e associação criminosa, Odebrecht, herdeiro do grupo, foi condenado a 19 anos e 4 meses de prisão pelo juiz federal Sérgio Moro no dia 8 de março.
Além de Marcelo Odebrecht, a intenção de firmar o acordo, que foi confirmada pelo grupo ontem, envolve outros executivos da construtora presos também desde junho de 2015.
Foram sentenciados com a mesma pena de Marcelo Odebrecht e pelos mesmos crimes no processo os executivos Márcio Faria e Rogério Araújo, ex-diretores da companhia.
'Reflexão'. Em uma nota intitulada "Compromisso com o Brasil", a empresa afirma que as "avaliações e reflexões" dos acionistas e executivos da empresa levaram a Odebrecht a decidir por uma colaboração "definitiva" com a Lava Jato.
"A empresa, que identificou a necessidade de implantar melhorias em suas práticas, vem mantendo contato com as autoridades com o objetivo de colaborar com as investigações, além da iniciativa de leniência já adotada em dezembro junto à Controladoria-Geral da União", informa o texto.
A empresa diz esperar que os esclarecimentos da colaboração contribuam "significativamente" com a Justiça e "com a construção de um Brasil melhor". A construtora também afirma que está em "processo avançado" de adesão ao Pacto Global, da Organização das Nações Unidas (ONU), que visa mobilizar a comunidade empresarial internacional para a adoção de "valores reconhecidos nas áreas de direitos humanos".
"Vamos adotar novas práticas de relacionamento com a esfera pública. Apesar de todas as dificuldades e da consciência de não termos responsabilidade dominante sobre os fatos apurados na Operação Lava Jato - que revela na verdade a existência de um sistema ilegal e ilegítimo de financiamento do sistema partidário-eleitoral do País - seguimos acreditando no Brasil", diz o texto da empresa.
COM A PALAVRA, A ODEBRECHT
Leia a íntegra da nota divulgada pela Odebrecht:
"Compromisso com o Brasil
As avaliações e reflexões levadas a efeito por nossos acionistas e executivos levaram a Odebrecht a decidir por uma colaboração definitiva com as investigações da Operação Lava Jato.
A empresa, que identificou a necessidade de implantar melhorias em suas práticas, vem mantendo contato com as autoridades com o objetivo de colaborar com as investigações, além da iniciativa de leniência já adotada em dezembro junto à Controladoria Geral da União.
Esperamos que os esclarecimentos da colaboração contribuam significativamente com a Justiça brasileira e com a construção de um Brasil melhor.
Na mesma direção, seguimos aperfeiçoando nosso sistema de conformidade e nosso modelo de governança; estamos em processo avançado de adesão ao Pacto Global, da ONU, que visa mobilizar a comunidade empresarial internacional para a adoção, em suas práticas de negócios, de valores reconhecidos nas áreas de direitos humanos, relações de trabalho, meio ambiente e combate à corrupção; estabelecemos metas de conformidade para que nossos negócios se enquadrarem como Empresa Pró-Ética (da CGU), iniciativa que incentiva as empresas a implantarem medidas de prevenção e combate à corrupção e outros tipos de fraudes. Vamos, também, adotar novas práticas de relacionamento com a esfera pública.
Apesar de todas as dificuldades e da consciência de não termos responsabilidade dominante sobre os fatos apurados na Operação Lava Jato - que revela na verdade a existência de um sistema ilegal e ilegítimo de financiamento do sistema partidário-eleitoral do país - seguimos acreditando no Brasil.
Ao contribuir com o aprimoramento do contexto institucional, a Odebrecht olha para si e procura evoluir, mirando o futuro. Entendemos nossa responsabilidade social e econômica, e iremos cumprir nossos contratos e manter seus investimentos. Assim, poderemos preservar os empregos diretos e indiretos que geramos e prosseguir no papel de agente econômico relevante, de forma responsável e sustentável.
Em respeito aos nossos mais de 130 mil integrantes, alguns deles tantas vezes injustamente retratados, às suas famílias, aos nossos clientes, às comunidades em que atuamos, aos nossos parceiros e à sociedade em geral, manifestamos nosso compromisso com o país. São 72 anos de história e sabemos que temos que avançar por meio de ações práticas, do diálogo e da transparência.
Nosso compromisso é o de evoluir com o Brasil e para o Brasil."