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Mais um enigma nas delações da Lava Jato

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Por Daniel Gerber
Atualização:
Daniel Gerber. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Mais uma vez o vazamento de uma declaração que deveria ser mantida sob sigilo mostra que a Operação Lava Jato, a despeito de suas inegáveis conquistas, avança sobre limites que deveriam ser intransponíveis em uma sociedade democrática de Direito. É lamentável o vazamento da declaração atribuída ao empresário Marcelo Odebrecht imputando ao ministro Dias Toffoli um determinado codinome junto ao sistema de controle de propinas mantido pela empreiteira durante o governo Lula.

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De acordo com notícias divulgadas pela imprensa, o delator enviou e-mail a dois executivos da empreiteira, Adriano Maia e Irineu Meireles, mencionando o seguinte: "Afinal vocês fecharam com o amigo do amigo de meu pai?".

O empresário disse à Polícia Federal que a mensagem se referia a tratativas que o então diretor jurídico da empreiteira, Adriano Maia, tinha com a Advocacia Geral da União sobre temas envolvendo as hidrelétricas do rio Madeira, em Rondônia. Além disso, mais nada. Sequer foi usado um fato específico para justificar o motivo pelo qual o então advogado geral da União, Dias Toffoli, teria importância em negócios desenvolvidos pela empreiteira.

O primeiro ponto que salta aos olhos é que, mesmo após inúmeras denúncias quanto à ilicitude de vazamento de informações sigilosas, principalmente quando estão sob guarda de agentes públicos (Polícia e PGR), eles continuam ocorrendo.

Mas o espanto não termina aí. Pelo contrário, é no mínimo estranho à natureza humana que um delator somente se lembre de citar em sua delação um ministro do Supremo Tribunal Federal anos depois de firmar seu acordo.

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Obviamente que se fosse um lobista menor o esquecimento se justificaria em virtude do volume de informações prestadas. Mas esquecer um ministro, com o devido respeito, ninguém esquece.

É fácil concluir que existe algo mais em tal declaração do que uma simples 'memória reavivada'. Podemos imaginar que o delator estava sonegando informações ou pior - que está fazendo adequações à pauta da acusação. O que não podemos crer - por ferir a lógica que governa o espírito e natureza humana - é que ele simplesmente tenha esquecido um nome tão importante.

Enfim, este é apenas mais um capítulo na história de uma operação que trouxe para o cenário jurídico e social pátrios a certeza de que leis servem como balizas, mas jamais como limites.

Em solo tupiniquim temos recall de delações, vazamentos seletivos, magistratura ativista que deseja inconscientemente o papel de legislador e uma forte campanha midiática que classifica a acusação como 'time do bem' e todos os demais como simples opositores.

Aguardemos os próximos capítulos, sem jamais esquecer que toda revolução acaba por eliminar seus próprios revolucionários.

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*Daniel Gerber é criminalista, professor de Direito Penal e Processual Penal, sócio da Daniel Gerber Advocacia Penal

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