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Lula diz a Moro que delação virou alvará de soltura

Citado por dois candidatos a delatores da Lava Jato, em depoimentos prestados nos últimos 30 dias, ex-presidente afirma que discutir contexto dos acordos firmados com réus

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Por Fausto Macedo , Julia Affonso , e Luiz Vassallo
Atualização:

Lula. Foto: Reprodução

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou nesta quarta-feira, 10, ao juiz federal Sérgio Moro, dos processos de primeira instância da Operação Lava Jato, as delações premiadas viraram "alvará de soltura"

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"Delatar virou quase que um alvará de soltura dessa gente", afirmou Lula, interrogado por Moro pela primeira vez como réu da Lava Jato, em Curitiba - origem do escândalo Petrobrás.

O ex-presidente atacou depoimentos de réus ouvidos na Lava Jato nos últimos 30 dias, em que foi citado por candidatos a delatores, em especial ao ex-presidente da OAS José Aldemário Pinheiro, o Léo Pinheiro.

Lula é acusado de receber R$ 3,7 milhões da OAS, na reforma de um tríplex do Guarujá (SP) e no custeio do acervo pessoal de ex-presidente pela empreiteira. Para a Lava Jato, o valor seria propina do esquema de desvios na Petrobrás. O petista negou ser dono do apartamento, acusou o Ministério Público Federal de perseguição e de inventar fatos.

"O senhor entende que existe uma conspiração contra o senhor?, questionou Moro.

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"Não, eu entendo e acompanho pela imprensa e que pessoas como Léo Pinheiro está já algum tempo está querendo fazer delação. Primeiro ele foi condenado 23 anos de cadeia. Depois se mostra na televisão como que vive a vida de nababo dos delatores. E o cara fala 'poxa, eu to condenado a 23 anos e os delatores pagaram uma parte e estão vivendo essa vida'."

Nas últimas semanas, réus da Lava Jato, entre eles o ex-presidente da OAS José Aldemário Pinheiro, o Léo Pinheiro, e o ex-diretor da Petrobrás Renato Duque, que seria cota do PT no esquema de corrupção da estatal, confessaram crimes e imputaram ao ex-presidente fatos ilícitos. Os dois são candidatos a delator da Lava Jato e negociam com o Ministério Público Federal acordos, que já foram negados em outras ocasiões.

"Aqui na sua sala tiveram 73 testemunhas, grande parte de acusação do Ministério Público, e nenhuma me acusou", disse Lula.

"O que aconteceu nos últimos 30 dias, doutor Moro, vai passar para a história como o mês Lula. Porque foi o mês em que vocês trabalharam, sobretudo o Ministério Público, para trazer todo mundo para falar uma senha chamada Lula. O objetivo era dizer Lula."

Conspiração. "O senhor entende que existe uma conspiração contra o senhor?, questionou Moro.

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"Não, eu entendo e acompanho pela imprensa e que pessoas como Léo Pinheiro está já algum tempo está querendo fazer delação. Primeiro ele foi condenado 23 anos de cadeia. Depois se mostra na televisão como que vive a vida de nababo dos delatores. E o cara fala 'poxa, eu to condenado a 23 anos e os delatores pagaram uma parte e estão vivendo essa vida'."

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"Eu tenho acompanhado e estou atento e estou percebendo que há... Eu vou discutir em algum momento o contexto. O contexto está baseado no power point mal feito e mentiroso da Operação Lava Jato", afirmou Lula.

O "power point" citado é o documento montado pelos procuradores na divulgação da denúncia do tríplex, em setembro de 2016, que mostrava o nome de Lula como centro de todo esquema de loteamento político, cartel e corrupção instalado na Petrobrás.

"Aliás, o doutor (Deltan, procurador) Dallagnol, que fez a apresentação, não está aqui, deveria estar aqui, para explicar aquele power point. Aquilo é uma caçamba aonde cabe tudo. Aquele power point não está julgando Lula pessoa física, mas o Lula presidente da República, e isso eu quero discutir."

Durante sua fala, Lula reafirma que é vítima de um processo de criminalização pelo que fez no governo. "Tentam me incriminar, independentemente de que em 2 anos eu prove minha inocência". Capas de revistas, assim como volume de matérias positivas e negativas nos jornais, foram usadas como exemplo deste processo.

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Acusação. A denúncia do Ministério Público Federal sustenta que Lula recebeu R$ 3,7 milhões em benefício próprio - de um valor de R$ 87 milhões de corrupção - da empreiteira OAS, entre 2006 e 2012. As acusações contra Lula são relativas ao recebimento de vantagens ilícitas da empreiteira por meio do triplex 164-A no Edifício Solaris, no Guarujá (SP), e ao armazenamento de bens do acervo presidencial, mantido pela Granero de 2011 a 2016. O petista é acusado de lavagem de dinheiro e corrupção.

Moro aceitou a denúncia em 20 de setembro de 2016.

Fachada do Condomínio Solaris, no Guarujá. Foto: MOTTA JR./FUTURA PRESS

O Edifício Solaris era da Cooperativa Habitacional dos Bancários (Bancoop), a cooperativa fundada nos anos 1990 por um núcleo do PT. Em dificuldade financeira, a Bancoop repassou para a OAS empreendimentos inacabados, o que provocou a revolta de milhares de cooperados. O ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto foi presidente da Bancoop.

A ex-primeira-dama Marisa Letícia (morta em 2017) assinou Termo de Adesão e Compromisso de Participação com a Bancoop e adquiriu 'uma cota-parte para a implantação do empreendimento então denominado Mar Cantábrico', atual Solaris, em abril de 2005.

Em 2009, a Bancoop repassou o empreendimento à OAS e deu duas opções aos cooperados: solicitar a devolução dos recursos financeiros integralizados no empreendimento ou adquirir uma unidade da OAS, por um valor pré-estabelecido, utilizando, como parte do pagamento, o valor já pago à Cooperativa.

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Segundo a defesa de Lula, a ex-primeira-dama não exerceu a opção de compra após a OAS assumir o imóvel. Em 2015, Marisa Letícia pediu a restituição dos valores colocados no empreendimento.

Bens. A Lava Jato afirma que a OAS pagou durante cinco anos pelo aluguel de dez guarda-móveis usados para armazenar parte da mudança do ex-presidente Lula quando o petista deixou o Palácio do Planalto no segundo mandato. A empreiteira desembolsou entre janeiro de 2011 a janeiro de 2016, R$ 1,3 milhão pelos contêineres, ao custo mensal de R$ 22.536,84 cada.

Toda negociação com a transportadora Granero teria sido intermediada pelo presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, que indicou a OAS como pagante com o argumento de que a empreiteira é uma "apoiadora do Instituto Lula." Para investigadores da Lava Jato, os fatos demonstram "fortes indícios de pagamentos dissimulados" pela OAS em favor de Lula. Isso porque o contrato se destinava a "armazenagem de materiais de escritório e mobiliário corporativo de propriedade da construtora OAS Ltda", mas na verdade os guarda-móveis atendiam a Lula.

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