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Lições da pandemia para a oncologia

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Por Ramon Andrade de Mello
Atualização:
Ramon Andrade de Mello. Foto: Divulgação

Os primeiros momentos da pandemia do novo coronavírus trouxeram pânico para a população mundial. O desafio de combater um inimigo pouco conhecido e com uma capacidade gigantesca de transpor continentes foi enfrentado de maneiras diferentes pelos países. Alguns adotaram medidas drásticas de lockdown como forma de conter o avanço da doença. Outros foram mais flexíveis e contabilizaram as consequências dessa decisão.

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O inevitável isolamento social ganhou dimensão particular para o grupo de pacientes oncológicos. As autoridades médicas reforçaram desde o início da pandemia os altos riscos de morte das pessoas com câncer pela Covid-19. Por outro lado, eles dependem do acompanhamento médico, apesar de toda visita a um consultório ou serviço de saúde colocá-los em exposição ao risco de contrair ao vírus.

Os impactos foram enormes e o fenômeno não foi uma exclusividade brasileira. Países de todos os continentes passaram pela mesma experiência.

Em Portugal, um estudo do Sistema Nacional de Vigilância de Mortalidade do país revelou que 10.390 pessoas morreram em julho, um número mais alto em um único mês nos últimos 12 anos. A pesquisa fez um comparativo com os dados de 2019 e descobriu um crescimento de 26% no número de óbitos, sendo que apenas 159, ou 1,5%, estavam relacionados com a Covid-19. A Holanda também registrou queda no número de diagnóstico, assim como outros países.

A necessidade de atendimento aos afetados pelo novo coronavírus impôs tanto ao sistema público quanto ao privado a destinação de um número maior de leitos para atendimento dessa emergência. Essa nova situação, aliada ao medo da infecção resultou no adiamento de 70% das cirurgias.

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Passadas as dificuldades iniciais provocadas pelo isolamento social e pelas mudanças no atendimento de saúde, o setor foi se reorganizando como forma de atender uma demanda reprimida. Hospitais, clínicas e laboratórios adotaram protocolos para separar o atendimento dos pacientes com Covid-19 dos demais. Aprovada em março de 2020 pelo CFM (Conselho Federal de Medicina), a telemedicina ampliou os canais de comunicação e atendimento entre os profissionais e seus pacientes. Essa ferramenta tem sido importante para o acompanhamento e avaliação clínica, por exemplo, pós-quimioterapia. São situações em que o médico já tem um bom conhecimento da patologia do paciente. Entretanto, ela não atende todas as demandas de uma consulta clínica, principalmente para aqueles casos que necessitam de uma avaliação minuciosa, que pode ser na primeira consulta, assim como no diagnóstico da doença.

Aos poucos, os pacientes estão retornando às consultas e aos tratamentos oncológicos. Até mesmo pela letalidade ser maior pelos tumores oncológicos do que pelo novo coronavírus. Entre 6% e 10% das pessoas diagnosticadas com Covid-19 acima de 80 anos de idade podem morrer. Já aqueles acometidos por câncer de pulmão enfrentam um cenário mais complicado, já que a letalidade alcança 99% em qualquer idade caso não seja diagnosticado e tratado adequadamente.

Uma das principais lições da pandemia é nunca parar o tratamento oncológico, qualquer que seja a situação. Assim como o diagnóstico e eventuais cirurgias. Hoje, tanto o sistema público quanto o privado já sofrem pela grande procura, principalmente pelas cirurgias eletivas, que em alguns casos se transformaram em emergência devido a longa espera. Alguns hospitais, inclusive, já registram dias com mais de 100% da capacidade de atendimento para dar conta de uma demanda represada. Pelos próximos meses, ainda teremos reflexos diretos para o atendimento dos pacientes oncológicos.

O justificável medo da Covid-19, principalmente entre as pessoas com câncer, não pode ser um impedimento para a procura do tratamento. Na oncologia, quanto mais cedo o paciente procurar tratamento, melhores serão as chances de cura. Com certeza, o médico é o profissional mais indicado para dar as melhores orientações, em qualquer caso.

*Ramon Andrade de Mello, médico oncologista, professor da disciplina de oncologia clínica da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), da Uninove e da Escola de Medicina da Universidade do Algarve (Portugal).

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