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Lei erra ao deixar custo do afastamento de gestantes exclusivamente aos empregadores

Por Roberto Baronian
Atualização:
Roberto Baronian. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Uma nova lei publicada na semana passada (nº 14.151) determinou o afastamento das empregadas gestantes do trabalho presencial durante a pandemia, sem prejuízo da sua remuneração. Durante o afastamento, elas deverão permanecer à disposição do empregador para trabalhar em domicílio.

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Não há dúvidas de que o afastamento do trabalho presencial, sem prejuízo da renda, daqueles que, sob o ponto de vista da ciência, integram o grupo de risco da doença, é uma medida benéfica e protetiva, na medida em que proporciona ao trabalhador restringir, em maior nível, sua exposição pessoal no contexto pandêmico. Isto, é claro, se o empregado beneficiado se comprometer em assim agir.

No âmbito trabalhista, a medida sempre fez parte do rol de ações de contingência para o enfrentamento da pandemia, com algumas poucas disposições normativas a este respeito, a exemplo da prevista na Portaria nº 20, de junho de 2020, do Ministério da Saúde e da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho, que pede a priorização do teletrabalho ou do trabalho remoto em residência para os integrantes do grupo de risco.

O tema, frequentemente, é alvo de investigações e de ações civis públicas a cargo do Ministério Público do Trabalho, especialmente em face de grandes empresas. O problema, no entanto, sempre consistiu em aplicar a medida nas atividades em que o trabalho à distância não se mostra possível - atividades industriais, de comércio e serviços com atendimento presencial, logística e transportes etc.

Esta nova lei específica para as gestantes endossa a determinação de que, na inexistência de atividades passíveis de serem exercidas em domicílio, o afastamento equivalerá a uma licença remunerada, já que "sem prejuízo da remuneração" e "à disposição do empregador". No direito do trabalho brasileiro, o tempo à disposição ao empregador, e não necessariamente o efetivo exercício do trabalho, é a contrapartida suficiente para o pagamento do salário.

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Assim, nesta hipótese, a empregada gestante deverá receber os salários no período de afastamento, até o início da licença maternidade.

A medida, enfim, a par de ser benéfica e realmente necessária, eis que de proteção à vida, peca ao deixar o ônus exclusivamente aos empregadores, quando da impossibilidade do trabalho remoto. E este ônus pode se mostrar extremamente pesado, especialmente para as micro e pequenas empresas, que são as que mais geram empregos no País.

Convém lembrar que não se trata de um risco do negócio, que por definição principiológica do direito do trabalho brasileiro recai sempre sobre o empregador, qualquer que seja seu porte ou capacidade econômica, mas sim de um risco social inerente à emergência de saúde pública que assola o País, atingindo toda a sociedade.

Trata-se de uma restrição ao trabalho, talvez não por efetivo estado de incapacidade, mas por motivo ou condição de saúde, que poderia ter uma cobertura previdenciária no âmbito da seguridade social, a exemplo do que determinou a lei para a hipótese de afastamento da empregada gestante ou lactante das atividades insalubres.

Para esta situação, a CLT determina que, quando não for possível à gestante ou lactante exercer suas atividades em local salubre na empresa, a hipótese será considerada como gravidez de risco e ensejará a percepção de salário-maternidade, a cargo da Previdência Social, durante todo o período de afastamento.

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Ou seja, garante-se a necessária proteção à trabalhadora gestante, com o afastamento do trabalho e manutenção da renda, mas mediante uma correspondente e imprescindível cobertura assistencial previdenciária.

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Cogita-se, inclusive, que esta nova lei contraria a Convenção 103 da OIT, em vigor no Brasil, que impõe ao Estado o dever de custear as licenças necessárias à maternidade, isentando o empregador deste encargo.

De toda forma, neste cenário já se discute, com polêmicas, a possibilidade de conjugar o afastamento determinado pela nova lei com as medidas de enfrentamento da pandemia que voltaram a ficar disponíveis, ao menos até agosto de 2021, através das Medidas Provisórias 1.045 e 1.046, de 27/04/2021: antecipação de férias e de feriados, banco de horas especial e até a suspensão do contrato de trabalho, mediante benefício emergencial pago pelo Governo e eventual ajuda compensatória paga pelo empregador.

Há contradições a este respeito. A MP 1.045, de abril, dispôs expressamente que a empregada gestante poderá participar do "Novo Programa Emergencial de Manutenção do Empregado e da Renda", que possibilita o acordo de suspensão contratual. A nova lei, agora, garante o afastamento da empregada gestante sem prejuízo da remuneração.

A medida, enfim, é protetiva e necessária, mas a escolha do legislador não se mostra acertada ao impor um ônus exclusivo aos empregadores, nas hipóteses em que o trabalho à distância não é possível.

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*Roberto Baronian, sócio do escritório Granadeiro Guimarães Advogados

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