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Lava Jato tem 20 presos sem condenação em segunda instância

Decisão do Supremo Tribunal Federal de soltar José Dirceu e outros dois condenados pelo juiz Sérgio Moro, deve abrir caminho para novos pedidos de revogação de prisões preventivamente, de alvos sem sentença em segundo grau

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Foto do author Julia Affonso
Por Ricardo Brandt , Julia Affonso , Fábio Seraepião e de Brasília
Atualização:

 

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de revogar a prisão preventiva do ex-ministro José Dirceu abre brecha para que 20 presos da Operação Lava Jato, com ou sem condenação, solicitem à Justiça o mesmo direito. Na lista, estão o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB), o empresário Marcelo Odebrecht, o ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e o ex-ministro Antonio Palocci.

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Em três anos de investigações da Lava Jato, em Curitiba, o juiz federal Sérgio Moro, condenou 90 pessoas em 28 processos julgados, em primeira instância. Entre eles, o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, sentenciado em dois processos a 32 anos e 1 mês de prisão, que deixou ontem a carceragem do Complexo Médico Penal de Pinhais, na região metropolitana de Curitiba. O petista estava detido desde 3 de agosto de 2015.

Nos últimos dois anos, 18 dessas sentenças foram alvos de apelações das defesas, encaminhadas ao Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, para julgamento em segunda instância. Desses pedidos, 8 foram julgados, com manutenção das condenações de Moro e com penas dos réus aumentadas. As outras 10 aguardam a confirmação ou a reformulação da sentença, como os pedidos feitos por Dirceu.

Uma das apelações pendentes de Dirceu é do primeiro processo aberto, em que ele foi condenado a 21 anos de prisão, em 18 de maio de 2016, por Moro, por crimes de corrupção e lavagem de dinheiro na Petrobrás.

O processo passou a tramitar no TRF em 29 de agosto de 2016. Foram abertos os prazos para razões de apelação dos oito réus que estão no mesmo processo, além de outras partes. O processo está sob análise pelo relator das ações da Lava Jato no TRF4, desembargador federal João Pedro Gebran Neto. Condenado pela segunda vez a 11 anos de prisão, em março deste ano, a apelação desse segundo processo ainda não começou a tramitar no TRF.

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 Foto: Estadão

 

Liberdade. Dirceu foi colocado em liberdade monitorada, por tornozeleira eletrônica, um dia depois de ser denunciado pela terceira vez pelo Ministério Público Federal, como um dos líderes do esquema de corrupção instalado na Petrobrás, que desviou mais de R$ 40 bilhões dos cofres da estatal, entre 2004 e 2014. O dinheiro, segundo as acusações, abasteceu políticos do PT, PMDB e PP, que controlavam os postos estratégicos da companhia.

A 2ª Turma entendeu que a prisão preventiva, por longo período, do petista era injustificada e determinou que Moro o soltasse da cadeia, estipulando novo regime cautelar. A medida deve gerar um efeito cascata de pedidos das defesas dos alvos da Lava Jato ainda em prisão preventiva, ao TRF e STF.

Outros réus como o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, os ex-diretores da Petrobrás Renato Duque e Jorge Zelada e o ex-deputado André Vargas têm casos semelhantes ao de Dirceu, com condenações proferidas em primeira instância por Moro e com apelações ao TRF4 ainda pendentes de julgamento.

Léo Pinheiro. Foto: Werther Santana/Estadão

Segundo grau. Em dois anos de trabalho da Lava Jato no TRF - os processos chegaram em 2015 ao tribunal -, foram julgados 8 apelações dos réus condenados no esquema de corrupção e cartel na Petrobrás.

Na prática, são réus que passaram a ter condenação em segundo grau e que já estão com os dias de prisão contando na execução de suas penas. Como o caso do ex-presidente da OAS José Aldemário Pinheiro, o Léo Pinheiro - outro candidato a delator da Lava Jato. Condenado em agosto de 2015 por Moro, o TRF manteve em novembro de 2016 os argumentos de condenação e aumentou em 10 anos o tempo de prisão: total, 26 anos e 7 meses.

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Nessa lista de réus com pena em execução já presos estão ainda o ex-deputado Luiz Argolo e os doleiros Carlos Habib Chater e Nelma Kodama.

"Metade (das apelações) já foi julgada pela 8ª Turma, especializada em matéria penal, e as demais são recentes e estão sendo preparadas para julgamento. Nos mais de três anos de julgamentos da Lava Jato, 651 processos já ingressaram no tribunal, mas a maioria trata de questões cautelares e processuais", informou o TRF4, por meio de sua assessoria de imprensa.

 Foto: Estadão

Negado. Ex-chefe da Fazenda, no governo Luiz Inácio Lula da Silva, e ex-Casa Civil de Dilma Rousseff, Palocci foi o primeiro a solicitar o direito à liberdade, com base nas decisões da Segunda Turma do Supremo, que desde a semana passada determinou a revogação de três prisões preventivas de alvos condenados por Moro. O relator dos processos, ministro Edson Fachin, negou ontem o pedido.

Palocci, que contratou no último mês um advogado especialista em delações premiadas, apresentou, via advogados, um habeas corpus de 166 páginas ao Supremo, em que alega que sofre "indisfarçável e hialino constrangimento ilegal", decorrente de sua prisão preventiva sem "justa causa e ao arrepio da lei".

O pedido de Palocci é datado de 26 de abril, apenas 24 horas depois de o Supremo mandar soltar os dois primeiros condenados da Lava Jato, o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente Lula, e o ex-tesoureiro do PP, João Cláudio Genu.

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Nesta terça-feira, 2, os ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski, da Segunda Turma, soltaram mais um personagem emblemático do escândalo Petrobrás, José Dirceu, indicando, segundo avaliação dos investigadores da força-tarefa, uma tendência da Côrte de reverter as prisões preventivas dos alvos.

Um dos argumentos da defesa de Palocci, que está preso desde setembro de 2016, em Curitiba, ainda sem sentença, é o "excesso no prazo havido como razoável para a formação da culpa, também a reclamar a concessão da ordem de habeas corpus, ainda que de ofício".

"Não pode haver 'cegueira hermenêutica deliberada' na Corte Constitucional quando, por qualquer que seja o meio ou de que forma for, lhe seja trazida ao conhecimento coação ilegal que afronte o Texto Magno", sustenta o criminalista José Roberto Batochio, defensor de Palocci.

 Foto: Estadão

Incoerente. O procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, classificou como "incoerente" a decisão do Supremo.

Em manifestação intitulada 'A incoerente soltura de José Dirceu pelo Supremo', em sua página em uma rede social, Deltan comparou a situação de José Dirceu com a de um ex-prefeito e de dois traficantes, um preso 'com 162 gramas de cocaína e 10 gramas de maconha' e outro 'com menos de 150 gramas de cocaína e maconha'.

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"O que mais chama a atenção, hoje, é que a mesma maioria da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal que hoje soltou José Dirceu - Ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski - votaram para manter presas pessoas em situação de menor gravidade, nos últimos seis meses", afirmou o procurador.

Sobrecarga. O TRF 4 recebeu ao todo 645 processos envolvendo recursos contra decisões de Moro para análise do relator dos processos na 8ª Turma. Sem atuação exclusiva para Lava Jato, a equipe de Gebran tem que atuar nos demais processos.

Em balanço divulgado há dois meses, o tribunal informou que dos 645 processos que já chegaram ao TRF4, "419 são relativos a pedidos de habeas corpus, envolvendo não só soltura de réus presos como indeferimento de provas, por exemplo". "Destes, 365 já foram analisados e baixados e 54 estão em tramitação."

Para dar conta da Lava Jato, cinco servidores do gabinete do relator estão com dedicação exclusiva para analisar os recursos. São ações que envolvem, por exemplo, pedidos de liminares, exceções de suspeição e apelações de sentença de mérito que ingressam continuamente. "O ritmo é constante ao longo dos três anos em decorrência de cada nova fase da operação deflagrada pela Polícia Federal. Estamos analisando simultaneamente os processos de mérito do início da Lava Jato e, também, os habeas corpus que chegam das prisões das novas operações" explica Gebran.

A 8ª Turma e composta por Gebran e pelos desembargadores federais Leandro Paulsen e Victor Luiz dos Santos Laus.

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"Esses processos de mérito são de grande complexidade, pois dizem respeito a sentenças condenatórias e absolutórias. São extensos, com diversas fases e réus. Cada parte faz um recurso que muitas vezes pode chegar até a 300 páginas, demandando um esforço de todo o gabinete, que pode levar meses para examinar um único processo", afirmou Gebran, na época.

"Dentro dessa realidade processual, a 8ª Turma tem julgado com a maior rapidez possível. Analisamos com profundidade e serenidade caso a caso, reconhecendo a importância de todos eles. A minha preocupação e dos demais desembargadores é entregar a melhor jurisdição", afirma Gebran.

 

RITO DAS APELAÇÕES NO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 4

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que abrange os estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, montou um esquema para entender qual o trâmite das apelações.

Como é o trâmite dos processos na Turma:

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Até chegar ao julgamento, o processo é distribuído para o gabinete do relator que, na maioria das vezes, abre prazo para os réus apresentarem razões de apelação, prosseguindo com a abertura de prazo para as manifestações do Ministério Público Federal (MPF).

Após, o magistrado começa a preparar o voto. São elaborados um relatório e uma proposta de voto. O passo seguinte é encaminhar o voto do relator para o revisor das ações da operação na 8ª Turma, desembargador federal Leandro Paulsen. É o revisor que pauta o processo, agendando o dia para apresentar na sessão. Entretanto, antes do julgamento, os votos são disponibilizados para que todos os integrantes da turma possam ter ciência do entendimento dos colegas.

Quando as decisões da turma são por maioria, o réu pode entrar com novo recurso no TRF4 pedindo a prevalência do voto mais favorável. Os embargos infringentes são julgados pela 4ª Seção, que reúne a 7ª e 8ª Turmas, especializadas em matéria criminal. Nesse colegiado composto pelos seis desembargadores das turmas e presidido pelo vice-presidente do TRF4, a relatoria das ações da Lava Jato é da desembargadora federal Cláudia Cristofani.

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