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Laudo da PF rastreia R$ 126 mi para 'empresas operadoras de lavagem'

Em único contrato de R$ 4 bilhões entre Petrobrás e consórcio de empreiteiras nas obras da Refinaria Abreu e Lima, peritos rastrearam valores pagos a consultorias, fornecedoras e empresas de fachada suspeitos de terem servido para ocultar propina

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Por Redação
Atualização:

Refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco. Foto: Wilton Junior/Estadão

Por Fausto Macedo, Julia Affonso e Ricardo Brandt

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O primeiro laudo da Polícia Federal de aprofundamento de dados sobre cartel, sobrepreço e desvios em contratos da Petrobrás aponta que em um período de cinco anos um total de R$ 126 milhões foram parar em contas de "empresas operadoras de lavagem de dinheiro". O valor é parte dos 16% de sobrepreço identificado em um único contrato das obras da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, iniciadas em 2007, em favor de consórcio de empreiteiras liderado pela Construtora Camargo Corrêa (Consórcio CNCC).

"Os exames periciais demonstraram que, garantida a vantagem advinda do sobrepreço. Estabeleceu-se um modus operandi sofisticado, planejado para dissimular o relacionamento do Consórcio CNCC com empresas operadoras de lavagem de capitais", registra o laudo 1342/2015, da Polícia Federal, anexado na semana passada aos autos da Lava Jato.

Contratado em 2009 para a construção das Unidades de Coqueamento Retardado (UCR-21 e UCR-22), da Refinaria Abreu e Lima, o consórcio CNCC recebeu da Petrobrás entre 2010 e 2015 o valor líquido de R$ 4,57 bilhões. Desse montante, foram identificados R$ 648,5 milhões de sobrepreço no material periciado.

"O CNCC utilizou-se de (empresas) integrantes/associadas e terceirizadas/fornecedoras para, fraudulentamente, destinar a empresas operadoras de lavagem de dinheiro uma parte dos recursos oriundos do superfaturamento do contrato", registram os peritos criminais federais João José de Castro Vallim, André Fernandes Britto e Adilson Carvalho Silva.

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 Foto: Estadão

O documento, de 209 páginas, é o primeiro de uma série de perícias técnicas da Polícia Federal que apontam um percentual de desvios na Petrobrás de até 20% do valor dos contratos. O percentual é superior aos 3% apontados até aqui nas investigações da Operação Lava Jato, que inclui apenas da propina dos agentes públicos e políticos.

"Assim o que se buscou foi seguir uma linha a partir da análise da licitação da obraaté a canalização de recursos para possíveis pagamentos ilícitos", explica o delegado Eduardo Mauat da Silva, um dos coordenadores das investigações da Lava Jato.

Os peritos listaram empresas "suspeitas de promoverem operações de lavagem de dinheiro" em contratos das obras da Refinaria Abreu e Lima, entre elas a JD Assessoria e Consultoria Ltda., do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu.

Só na JD e outras três empresas de delatores da Lava Jato, passaram R$ 71 milhões desses R$ 126 milhões, tendo como origem Construções e Comércio Camargo Corrêa S/A. O total destinado para empresas de lavagem foi identificado em operações financeiras entre 2009 e 2013.

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Laudo relaciona consultoria de Dirceu à propina na Petrobrás

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"No período compreendido entre 31 de maio de 2010 e 28 de fevereiro de 2011, foi identificada movimentação financeira da empresa Construções e Comércio Camargo Corrêa S/A para a empresa JD - Assessoria e Consultoria Ltda, num montante de R$ 844,6 mil", registra a perícia.

A Lava Jato apura o uso de falsas consultorias, empresas de fachadas e fornecedoras como forma de ocultar dinheiro de propina. Além de Dirceu, há empresas do doleiro Alberto Youssef, do ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa e do lobista Milton Pascowitch no rol de investigados.

Cruzamento. Para redigir o laudo, foram cruzados dados dos documentos eletrônicos apreendidos nas buscas e apreensões ou fornecidos voluntariamente, documentos dos autos da Lava Jato, material disponibilizado pela Petrobrás (como demonstrativos de formação de preços, resumos de propostas, critérios de medição, além de relação de pagamentos), dados do sigilo bancários dos alvos da investigação e outros laudos periciais da Lava Jato.

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A avaliação dos investigadores da Lava Jato é de que os apontamentos periciais corroboram o que foi levantado até aqui com maior detalhamento de números e provas materiais.

"A partir dos exames realizados nos materiais disponíveis (...) foi possível identificar a prática de sobrepreço no contrato", registra o laudo, do dia 7 de julho.

Os peritos também identificaram indícios de cartelização, com acordo entre as empresas participantes do processo de contratação - 15 construtoras investigadas por cartel.

"O certame teria sido contaminado pela ação de um grupo, aquela época, integrado por 15 empresas que, sistematicamente, praticavam condutas anticoncorrenciais no mercado de obras de montagem industrial onshore da Petrobrás."

Trecho de laudo que inclui JD em recebedora de propina / Reprodução Foto: Estadão

Uma redução nos preços, entre a primeira e a segunda proposta de contratação, é um dos elementos listados no laudo. "Apesar da discrepância exorbitante, verificada entre os valores propostos e o preço de referência na primeira licitação, no segundo certame foram convidadas praticamente as mesmas 15 empresas licitantes, contrariando as disposições do Decreto n.° 2.745/1998, que regula o procedimento licitatório simplificado da Petrobrás."

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Foram chamados técnicos da Petrobrás para auxilio nos trabalhos de análise do contrato da Abreu em Lima em relação às normas internas da estatal. "A partir dos cálculos acima, restou constatado que. na realidade, o rol de propostas apresentadas nas licitações da Petrobras não reflete a expectativa de distribuição estatística definida nas normas internacionais e por ela própria adotada."

Para os peritos, "essa diferença indica que nas licitações das Refinarias Rnest e Comperj se observa uma variação de preços muito superior à esperada, consistente com a hipótese de cartelização".

COM A PALAVRA, A DEFESA

A Camargo Corrêa, por meio do criminalista Celso Vilardi, apresentou em abril documentos nos autos da Lava Jato sobre os pagamentos e contratos com empresas de consultoria, em especial o da JD Assessoria e Consultoria. A defesa afirma que os serviços foram efetivamente prestados.

O criminalista Roberto Podval, que representa Dirceu e a JD, informou em petição protocolada em abril na Justiça Federal do Paraná que atualmente a consultoria está 'inoperante', cessadas todas as suas atividades.

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"A defesa do ex-ministro José Dirceu afirma que nunca teve contrato com o consórcio responsável pela obra da refinaria Abreu e Lima. Segundo o advogado Roberto Podval, Dirceu foi contratado pela Camargo Corrêa para atuar em Portugal, como a própria construtora reconhece. Não teve, portanto, qualquer relação com contratos e obras da Petrobrás. Todas as informações, como contrato e notas fiscais, já foram encaminhadas à Justiça Federal do Paraná em janeiro."

 

 

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