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Justiça do Trabalho em Santa Catarina manda JBS recontratar e indenizar 43 funcionários indígenas demitidos na pandemia

Juiz considerou que houve discriminação indireta na dispensa do trabalhadores da Terra Indígena Serrinha, no oeste do Estado

Foto do author Rayssa Motta
Foto do author Fausto Macedo
Por Rayssa Motta e Fausto Macedo
Atualização:

A Justiça do Trabalho de Santa Catarina mandou a JBS recontratar 43 funcionários indígenas demitidos de um frigorífico no município de Seara, na região oeste do Estado, durante a pandemia. A empresa também foi condenada a pagar indenização de dez salários mínimos a cada um dos trabalhadores, além de uma multa de R$ 250 mil por danos extrapatrimoniais coletivos.

Documento

Leia a sentença

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A decisão foi tomada pelo juiz Adilton José Detoni, da Vara de Concórdia, em uma ação civil pública movida em conjunto pelo Ministério Público do Trabalho e pelo Instituto Kaingan. O magistrado entendeu que houve discriminação indireta da empresa na dispensa dos funcionários indígenas.

"A discriminação manifesta-se de forma direta, indireta ou oculta. O caso dos autos é de discriminação indireta consistente no impacto desproporcional da medida da empresa que, preexistente a situação de desigualdade, recrudesce tal quadro", diz um trecho da sentença.

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O grupo, demitido em maio do ano passado, mora na Terra Indígena Serrinha. De acordo com a JBS, eles foram demitidos por motivos 'puramente econômicos' em razão do custo operacional do transporte até a empresa. Isso porque a capacidade dos ônibus fretados precisou ser reduzida para respeitar as recomendações sanitárias durante a pandemia. O trajeto de ideia e volta até o frigorífico dura cerca de cinco horas. Em sua decisão, o juiz ainda lembrou que, apesar da justificativa, a JBS chegou a anunciar 'vultosas doações' para ajudar no enfrentamento da pandemia.

Sede da JBS. Foto: JF DIorio/Estadão - 29/10/2014

Quando os funcionários foram demitidos, Santa Catarina estava em estado de calamidade pública: o governo havia proibido atividades não essenciais e os frigoríficos, que continuaram funcionando, enfrentavam um surto de contágio do novo coronavírus. O cenário levou a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), vinculada ao Ministério da Saúde, a determinar o monitoramento clínico de todos os trabalhadores indígenas que usavam transporte coletivo para se deslocar até os frigoríficos catarinenses. O cacique da Terra Indígena Serrinha decidiu então impedir a entrada de civis na aldeia e determinou que os trabalhadores da comunidade ficassem em casa por duas semanas, como determinam os protocolos sanitários em caso de suspeita de contágio.

"As empresas foram comunicadas. Todas acataram, exceto a ré, que no dia imediato informou a demissão dos trabalhadores", escreveu o juiz. "Os outros frigoríficos dialogaram, suspenderam os contratos por sessenta dias ou deram férias coletivas e não demitiram. A ré não suspendeu os contratos e ignorou a tentativa de diálogo", destacou o juiz.

A advogada Lúcia Fernanda Inácio Belfort Sales, que representa o Instituto Kaingang, disse que a decisão é 'histórica'. Ela considera, no entanto, que o valor da indenização ficou aquém do esperado. "Considerando tratar-se da maior multinacional de carnes do mundo, são irrisórios em face do dano causado e amplamente comprovado", afirma.

O advogado Breno Cavalcante, que também prestou assessoria jurídica na ação, disse que a decisão de demitir os funcionários no auge da primeira onda da crise sanitária foi 'um ato cruel'. A colega Catherine Coutinho, outra advogada da equipe, lembra que a JBS fez uma doação de R$ 21 milhões ao Rio Grande do Sul. "O compromisso anunciado não se estende aos povos indígenas e configura prática de racismo, agravada pelas circunstâncias de calamidade pública em que o País está mergulhado", afirma.

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Ministério Público do Trabalho e Instituto Kaingang devem recorrer da sentença. A Procuradoria pedia que a JBS fosse condenada a pagar indenização por dano moral coletivo de R$ 8 milhões e uma indenização individual e em valor não inferior a R$ 50 mil, totalizando R$ 2 milhões para os trabalhadores demitidos.

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