Redação
15 de janeiro de 2020 | 12h55
Atualizada às 14h51 de 16.01 com posicionamento da Advocacia-Geral da União*
Foto: Emilian Danaila/Pixabay
Um portador da Doença de Fabry obteve na 1.ª Vara Federal de Araçatuba (SP) decisão judicial que obriga a União a lhe fornecer o medicamento Replagal (princípio ativo agalsidase alfa), na dosagem de oito frascos por mês, enquanto perdurar o seu tratamento. A sentença é do juiz federal Luiz Augusto Iamassaki Fiorentini.
A Doença de Fabry é rara e hereditária. É causada pelo acúmulo de gordura nas células do organismo, provocando diversos sintomas que vão desde dores nos pés e nas mãos, até problemas no cérebro, rins e coração.
O medicamento Replagal é considerado, hoje, o único capaz de combater a enfermidade, mas seu custo é alto, estimado em R$ 60 mil para o tratamento mensal.
Informações divulgadas pelo Núcleo de Comunicação Social da Justiça Federal em São Paulo (Ação nº 5002507-06.2018.4.03.6107) indicam que o autor da ação, que teve a doença detectada em janeiro de 2018, necessita do medicamento para conter o avanço da doença, que tem como estágio final e fatal a insuficiência renal e cardíaca, até um possível AVC – acidente vascular cerebral.
Apesar de o SUS não possuir sequer previsão de protocolos clínicos para o tratamento da enfermidade, quanto menos o fornecimento de qualquer medicamento que lhe cause efeitos positivos, o juiz afirma, na decisão, que ‘é direito garantido à parte autora o recebimento gratuito da medicação necessária ao seu tratamento, de acordo com a Constituição e legislação infraconstitucional’.
A União argumenta que o medicamento Replagal não foi incluído no SUS em razão dos estudos existentes ‘não serem capazes de atestar sua eficácia e segurança, bem como diante da incerteza de benefício relevante para o paciente’.
Também alega que ‘a Doença de Fabry tem sido tratada com medidas paliativas e de suporte disponíveis no SUS para alívio dos sintomas, já que não tem cura’.
Todavia, a médica que acompanha o autor da ação refutou os argumentos da União. Ela destacou que, no caso do seu paciente, o tratamento com Replagal ‘é imprescindível’.
“O tratamento eficaz para estabilizar e/ou regredir o comprometimento dos órgãos alvos da Doença de Fabry é a Terapia de Reposição Enzimática (TRE) com agalsidase alfa”, atesta a médica.
Segundo ela, ‘a escolha baseia-se nas inúmeras literaturas internacionais utilizadas como referência para a indicação do tratamento, oferecendo, segundo as publicações, a estimativa aproximada de 17,5 anos de sobrevida ao paciente tratado versus o grupo de pacientes não tratados’.
Além da Constituição Federal (artigos 6.º e 196), o juiz Luiz Augusto Fiorentini usou como base em sua decisão o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, publicado em 4 de maio de 2018, que define três requisitos para a concessão de medicamentos não incorporados pelo SUS.
No primeiro requisito, que trata da comprovação por laudo médico sobre a imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, os documentos anexados aos autos comprovaram que o autor é portador da Doença de Fabry, com graves problemas renais e recente quadro de infarto agudo do miocárdio.
Além disso, a documentação confirmou a inexistência de medicamentos previstos nos protocolos do SUS, ‘havendo risco concreto de evolução do quadro clínico do paciente’.
No segundo, sobre a incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento, ficou demonstrada a impossibilidade da parte autora de assumir os ônus financeiros da aquisição do medicamento por sua conta e risco, diante da declaração de hipossuficiência apresentada e de sua condição de analfabeto, bem como do alto custo do medicamento.
Sobre o terceiro requisito, que trata da existência de registro na Anvisa do medicamento, o juiz afirma que ‘não é matéria controvertida nos autos’. Há consulta pública disponível no sítio eletrônico da Anvisa atestando o registro.
Luiz Augusto Fiorentini julgou procedente o pedido determinando que o medicamento Replagal seja fornecido ao autor enquanto perdurar o tratamento.
A União foi condenada ao pagamento de multa no valor de R$ 250 mil devido ao atraso no fornecimento do primeiro lote do remédio, ocorrido após a liminar dada em 2018.
COM A PALAVRA, A AGU
“A decisão determinou que a União forneça o medicamento no prazo máximo de 15 dias. A Advocacia-Geral da União foi intimada da decisão e do deferimento de tutela de urgência em 10 de janeiro. No momento, a AGU analisa a sentença para eventual interposição de recurso.”
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