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Juiz da Lava Jato condena 'trapaça' do casal de marqueteiros

Ao revogar decreto de prisão de João Santana e Mônica Moura, juiz da Operação Lava Jato diz que álibi do casal de que 'todos' fazem caixa 2 não elimina responsabilidade individual

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Foto do author Julia Affonso
Por Ricardo Brandt , Mateus Coutinho , Julia Affonso e enviado especial a Curitiba
Atualização:

O marqueteiro do PT João Santana / Foto: AFP

Ao revogar o decreto de prisão do publicitário João Santana e de sua mulher e sócia Mônica Moura - marqueteiros das campanhas presidenciais de Lula (2006) e Dilma (2010/2014), o juiz federal da Operação Lava Jato, Sérgio Moro, condenou a 'naturalidade' e a 'desfaçatez' com que o casal confessou ter recebido valores não contabilizados.

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Moro classificou de 'trapaça' a conduta dos marqueteiros.

O casal foi preso em fevereiro na Operação Acarajé, desdobramento da Lava Jato. Na semana passada, Santana e a mulher foram interrogados por Moro e confessaram a prática de ilícitos, inclusive o recebimento de US$ 4,5 milhões em remuneração por serviços prestados na eleição de Dilma, de 2010. Ele admitiram ter recebido aquele montante via caixa 2.

Santana e Mônica alegaram, porém, que 'não tinham ciência da origem e natureza criminosa dos valores recebidos' - a força-tarefa da Lava Jato sustenta que o dinheiro para os marqueteiros saiu do esquema de propinas instalado na Petrobrás.

Moro anotou que é 'inviável' uma conclusão sua 'acerca da presença ou não do agir doloso, ou seja, se tinham ou não eles (Santana e Mônica) ciência da origem e natureza criminosa dos valores'.

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Em sua decisão de revogação da ordem de prisão do casal, o juiz da Lava Jato foi duro. "Necessário, porém, censurar em ambos a naturalidade e a desfaçatez com as quais receberam, como eles mesmo admitem, recursos não-contabilizados, o caixa dois, como remuneração de serviços prestados em campanhas eleitorais. O álibi 'todos assim fazem' não é provavelmente verdadeiro e ainda que o fosse não elimina a responsabilidade individual."

Moro faz uma comparação. "Se um ladrão de bancos afirma ao juiz como álibi que outros também roubam bancos, isso não faz qualquer diferença em relação a sua culpa. O mesmo raciocínio é válido para corruptores, corruptos, lavadores de dinheiro e fraudadores de campanhas eleitorais."

O juiz é categórico. "Rigorosamente, qualquer constatação de que a prática criminosa tornou¬se a 'regra do jogo', apenas justifica medidas judiciais mais severas para a sua interrupção. Ainda mais quando recursos não¬contabilizados e, no caso, de origem criminosa, contaminam campanhas eleitorais, comprometendo a qualidade e a integridade da democracia. Isso é trapaça e a gravidade disso, por afetar o processo político democrático, não deve ser subestimada."

Mesmo dirigindo dura reprimenda ao casal, Moro decidiu acolher pedido da defesa e revogou o decreto de prisão que ele próprio impôs na Operação Acarajé. "Não é esse o momento para avaliar as responsabilidades individuais de João Cerqueira de Santana Filho e Mônica Regina Cunha Moura e as consequências criminais de suas condutas", argumentou o juiz. "Trata¬se de avaliar apenas se a prisão preventiva é ainda necessária. Quando a decretei, tive presente, os indicativos de que as condutas criminosas de ambos eram recorrentes, pois há indícios de recebimento subreptício de valores não¬registrados de 2008 a 2015, com o possível comprometimento da integridade de diversas campanhas eleitorais no período."

Moro anotou que também levou em conta, no decreto de prisão, a presença do 'risco à instrução, pois a fraudes documentais praticadas para acobertar os crimes e o depoimento dos acusados sugeriam a possibilidade de que seriam apresentadas justificativas e provas fraudulentas em relação aos recebimentos havidos'

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Moro faz referência aos dois processos criminais em que Santana e Mônica são réus. "Nessa fase processual, após cinco meses de prisão cautelar, com a instrução das duas ações penais próximas ao fim e com a intenção manifestada por ambos os acusados de esclarecer os fatos, reputo não mais absolutamente necessária a manutenção da prisão preventiva, sendo viável substituí¬la por medidas cautelares alternativas."

O juiz da Lava Jato destaca que a situação do casal é diferente, 'em parte', da de outras pessoas envolvidas no esquema criminoso da Petrobrás. "Afinal, não são agentes públicos ou políticos beneficiários dos pagamentos de propina, nem são dirigentes das empreiteiras que pagaram propina ou lavadores profissionais de dinheiro. Embora isso não exclua a sua eventual responsabilidade criminal, a ser analisada quando do julgamento, é possível reconhecer, mesmo nessa fase, que, mesmo se existente, encontra¬se em um nível talvez inferior da de corruptores, corrompidos e profissionais do crime."

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