O juiz Luiz Antonio Bonat, da 13ª Vara Federal em Curitiba, recebeu a denúncia da Operação Lava Jato contra o garçom Alexandre Inácio da Silva. A acusação formal do Ministério Público Federal aponta que o homem tentou dar um golpe de R$ 700 mil no ex-presidente da Petrobrás e do Banco do Brasil, Aldemir Bendine - condenado em março de 2018 pelo então juiz federal Sérgio Moro a 11 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro.
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DECISÃO"Presentes indícios suficientes da materialidade e autoria, evidenciada a justa causa para a ação penal, recebo a denúncia oferecida contra Alexandre Inácio da Silva", decidiu Bonat em 25 de junho.
O magistrado marcou para o dia 3 de setembro, às 14h, uma audiência de suspensão do processo.
Na ocasião, o juiz vai decidir sobre a proposta do Ministério Público Federal para 'suspensão condicional do processo, desde que favoráveis as folhas de antecedentes e certidões criminais, mediante cumprimento das seguintes condições: a) proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do juiz; b) comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e justificar suas atividades; c) pagamento de 10 salários mínimos, que poderá ser parcelado, em até cinco vezes'.
A denúncia da Lava Jato aponta que em 2 de agosto de 2017, dias após a prisão de Bendine, o garçom 'tentou obter, para si ou para outrem, em prejuízo alheio, vantagem ilícita, no valor de R$ 700 mil.
Segundo a Procuradoria da República, Alexandre Inácio da Silva enviou um e-mail à Amanda Bendine, filha do ex-presidente das estatais, por meio de um 'endereço eletrônico de falsa titularidade, induzindo-a em erro'.
Bendine foi preso em 27 de julho daquele ano - e solto em abril este ano pelo Supremo. O ex-presidente da Petrobrás foi acusado de receber R$ 3 milhões da Odebrecht em supostas propinas em 2015. A Lava Jato afirma que, no dia da prisão de Bendine, o garçom 'criou a conta de e-mail aldemirbendine63@bol.com.br'.
"Por meio do endereço eletrônico de falsa titularidade e identificando-se como Aldemir Bendine, no dia 02 de agosto de 2017, Alexandre Inácio encaminhou e-mail a Amanda Bendine solicitando-lhe a realização de transferência bancária no valor de R$ 700 mil, para a conta-corrente nº 3933-0, agência 1257-2, do Banco do Brasil, sob a dissimulada justificativa de garantir, junto a terceira pessoa, a concessão de ordem em habeas corpus, perante o Supremo Tribunal Federal", narram os procuradores.
De acordo com os investigadores, ao criar a conta do e-mail, o garçom cadastrou um endereço no bairro do Pechincha, no Rio, ligado a ele próprio.
O Ministério Público Federal relata que, no dia em que a mensagem com o pedido de R$ 700 mil foi enviada à Amanda, a conta de e-mail foi acessada por um IP - identificação única de cada computador conectado à rede de internet - vinculado a um endereço no Conjunto Cezarão, onde mora Alexandre Inácio, no bairro de Santa Cruz, na capital fluminense.
"A assinatura do serviço de internet utilizado para o encaminhamento da mensagem estava registrada em nome do próprio acusado e foi desativada em 22 de setembro de 2017", relata a Lava Jato.
"A conta bancária indicada no e-mail fraudulento para o recebimento da quantia foi aberta em 5 de dezembro de 2016, também em nome de Alexandre Inácio, através de dispositivo móvel. Trata-se de modalidade de conta com abertura à distância, com dados cadastrais fornecidos diretamente pelo cliente, sem o arquivamento de documentos comprobatórios das informações pela instituição financeira."
O Ministério Público Federal informou à Justiça que 'nos protocolos de assinatura da conta foram cadastrados dois endereços que são vinculados' ao garçom.
Segundo a Procuradoria, um dos endereços 'foi o mesmo utilizado para a criação do endereço eletrônico e de onde se identificou ter sido encaminhado o e-mail com a solicitação dos valores'.
Amanda Bendine não transferiu o dinheiro solicitado no e-mail. Em 4 de agosto, dois dias depois de ter enviado a mensagem, a filha do ex-presidente da Petrobrás recebeu um novo e-mail do endereço eletrônico 'aldemirbendine63@bol.com.br', com o assunto 'Desculpa'.
"Desculpa pela brincadeira. Eu achei esses telefones e documentos e fiz essa brincadeira. Minha mãe está brigando comigo por isso", registrou a mensagem.
O que diz Alexandre Inácio?
O garçom prestou depoimento em 10 de setembro do ano passado à Polícia Federal no Rio. Ele confirmou que a conta indicada no e-mail enviado à Amanda é sua e os endereços descobertos pela Lava Jato também, mas negou que tenha criado a conta de e-mail.
"Disse que não está entendendo nada a respeito, e que não foi o autor das mensagens", afirmou. "Não teria razão para encaminhar tal e-mail."
Alexandre Inácio disse à PF que 'perdeu um aparelho celular Positivo, do qual não se recorda o número da linha, entre março e abril de 2017, no centro de Santa Cruz, o qual se encontrava numa capa que continha, além do aparelho, o cartão da conta do Banco do Brasil, e a senha da referida conta num pedaço de papel'.
"No aparelho perdido, também havia fotos de seus documentos pessoais, tais como identidade e CPF", contou. "Não efetuou o registro à época do extravio do aparelho celular nem cancelou a linha telefônica que usava no aparelho, nem da conta fácil do BB."
COM A PALAVRA, A DEFESA
Ao ser intimado pela Justiça em 10 de julho, Alexandre Inácio da Silva 'manifestou desejo de assistência pela Defensoria Pública da União'.
A reportagem não conseguiu contato com números ligados a ele. O espaço está aberto para manifestação. (julia.affonso@estadao.com)