Sou matuto, típico do pantanal.
Do interiorzinho, inexpressivo, mas alegre, terra do "Opa, tudo bem? Dedo em riste e indagando: cê tá bão mesmo!?"
Cidadezinha liliputiana.
Meus pais eram professores e com salários parcos e sempre atrasados. Compravam a prazo nas mercearias e cada um tinha em casa a sua fatia determinada do alimento, especialmente da rara guloseima.
Eu, por exemplo, além de dividir o quarto e as roupas com meu irmão, tinha que também contar as cartelas de iogurte e fazer a conta entre nós (de vez em quando, um dos potinhos sumia, e não se sabia como...).
Aprecio amigos singelos, de mãos calejadas, olhos sinceros, que comem arroz e feijão e deixam o bife por último...
Eu me sinto ótimo na casa de quem me serve pão francês com margarina, tubaína e mortadela, salada de alface com tomate e abre o largo sorriso e diz: "fiz pro cê. É simples, mas é com carinho".
Amigo que te abraça e chora, dizendo que está com rinite. E que dá "voadora" em quem te ataca e pergunta depois o motivo.
Amigo que toma cerveja sem marca e até quente em copo americano e ri das suas piadas sem-graça.
Não gosto de sapatos caros, andrajos empertigados, de sodalícios e excelsos pretórios, muito menos de escólios insólitos e nefelibatas.
Odeios as normas da ABNT e quem as valorize.
São inúteis. Preservam a forma em detrimento da essência.
Também me enojam pessoas pernósticas, soberbas, jactantes.
Admiro o bom e sofrido suor na tez, o cheiro do trabalho árduo e decente, virtude e a sensatez.
Gosto mesmo é de quase tudo que me recorda a infância.
E de estar com "ocês"!
*João Linhares, promotor de Justiça do Ministério Público de MS. Integrante da Academia Maçônica de Letras de MS. Mestre em Garantismo e Processo Penal pela Universidade de Girona (Espanha). Especialista em Controle de Constitucionalidade e Direitos Fundamentais pela PUC-RJ