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Incompetência geral e irrestrita

Por Letícia Lins e Silva
Atualização:
Letícia Lins e Silva. FOTO: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, após longa espera, reconheceu a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para processar e julgar os fatos envolvendo o ex-presidente Lula, por não guardarem relação com os crimes praticados no âmbito da Petrobras.

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A decisão solitária anulou as condenações do ex-presidente e causou enorme rebuliço no País e na própria Corte, tornando-se alvo de críticas, inclusive, pelos seus tímidos efeitos, muito menos abrangentes do que aqueles que ainda se esperam do reconhecimento da escandalosa suspeição do ex-juiz Sergio Moro, objeto de habeas corpus cujo julgamento está em curso.

Contudo, a crítica que aqui se propõe tem a ver com o posicionamento da Corte, reproduzido na decisão do ministro Fachin, diante da - desde sempre - inexistente competência do juízo curitibano para julgar, inclusive, os crimes praticados no âmbito da Petrobras.

É regra básica em matéria criminal que competente para processar e julgar um fato alegadamente criminoso é o juízo do local onde o crime se consumar. Nenhum dos atos alegadamente ilícitos praticados no âmbito da Petrobras se consumou no Paraná. A Petrobras tem sede no Rio de Janeiro e as empresas envolvidas em outros estados da federação, nenhuma no Paraná.

Portanto, a incompetência de quaisquer das Varas Federais da Seção Judiciária do Paraná para processar e julgar crimes envolvendo executivos de empreiteiras e funcionários da Petrobras é absoluta e, assim sendo, impedia a utilização de qualquer outro critério subsidiário de fixação de competência - conexão ou prevenção, por exemplo - que só podem ser utilizados quando há concorrência entre duas jurisdições que detenham competência de foro. Não era este o caso das Varas Federais do Paraná.

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Mas o criativo ex-juiz construiu um código próprio e ali introduziu, dentre outros ineditismos, um novo critério de atribuição de competência baseado na pessoa do delator. No caso, o falante doleiro Alberto Youssef.

O doleiro estreou no ramo da delação no chamado Caso Banestado, que teve curso na 2ª Vara Federal de Curitiba, hoje 13ª Vara Federal. Esta delação foi o criativo link encontrado pelo ex-juiz para, por meio de uma distribuição dirigida pelo próprio, abraçar as investigações de outra rumorosa investigação, o chamado Caso Janene, que envolvia o falecido ex-deputado José Janene. A posteriormente denominada Operação Lava Jato tem origem nesta investigação, a partir da colaboração do mesmo Alberto Youssef.

Ocorre que as três investigações nada tinham em comum, a não ser a presença do doleiro falastrão, cujas delações, relacionadas aos supostos crimes no âmbito da Petrobras, deveriam ter sido encaminhadas para a Justiça Federal do Rio de Janeiro. Mas não foi o que fez o ex-juiz. E, ao deixar de fazê-lo, violou regras básicas - e caras! - de definição de competência, com eficácia garantidora dos princípios constitucionais do juiz natural e do devido processo legal.

O que se seguiu daí foi um odioso juízo de exceção, com a condescendência dos Tribunais Superiores.

O tempo consolidou os abusos e reforçou o receio da negativa repercussão que o reconhecimento da notória incompetência e a consequente anulação de todos os atos praticados pelo juízo universal poderia gerar.

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Mas os últimos acontecimentos na Corte trazem novos e bons ventos. A sociedade também está se dando conta da importância da preservação de princípios constitucionais fundamentais. Ninguém deseja ser julgado por um tribunal de exceção, nem admite ser processado fora dos limites da lei.

Assim se espera! Afinal, quanto mais tempo for mantida esta manifesta ilegalidade, maior será o prejuízo para a própria sociedade.

*Letícia Lins e Silva é advogada criminalista

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