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'Incompatível que o advogado se torne delator do próprio cliente', reage IAB à comissão da Câmara que vai mudar lei de lavagem de dinheiro

Instituto dos Advogados Brasileiros, fundado em 1843, enviou documento com oito sugestões para avaliação do grupo de juristas que vai elaborar relatório-base para reforma na legislação que versa sobre o branqueamento de capitais

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Foto do author Rayssa Motta
Foto do author Fausto Macedo
Por Rayssa Motta e Fausto Macedo
Atualização:

Câmara dos Deputados. Foto: Divulgação/Câmara dos Deputados

A Comissão de juristas formada pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para elaborar o anteprojeto de reforma da chamada Lei da Lavagem de Dinheiro recebeu um memorial do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB) com uma série de sugestões ao texto.

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Documento

O MEMORIAL DO IAB

No documento, elaborado em meados de novembro, a entidade defende oito mudanças na versão atual da legislação. Uma das propostas é a de o crime de lavagem de dinheiro só seja configurado quando o montante movimentado for derivado de outro crime com pena máxima superior a quatro anos de prisão. A entidade argumenta que, ao abranger pequenos delitos ou, nas palavras do IAB, a 'criminalidade de bagatela', a lei atual gera 'distorções' e acaba prejudicando o combate ao branqueamento de capitais.

Outra mudança sugerida é vincular as penas entre os crimes de lavagem de dinheiro e o delito anterior que gerou o lucro ilícito. A ideia é que a pena-base para o branqueamento de capitais seja diminuída dos atuais três a dez anos de prisão para dois a seis anos de reclusão, mas, em contrapartida, esteja vinculada ao delito antecedente.

O IAB pede ainda a exclusão do verbo 'ocultar' na tipificação do crime. Na avaliação do instituto, o branqueamento de capitais envolve a dissimulação da origem do produto do crime antecedente e não a sua 'mera ocultação'.

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No documento, a entidade defende também a supressão do inciso que imputa a lavagem de dinheiro a todos os integrantes de uma empresa que saibam dos atos ilícitos ali praticados, mesmo que suas funções específicas não tenham relação concreta com o crime. Para o IAB, o dispositivo estabelece uma hipótese de criminalização 'extremamente abrangente de forma injustificada'.

O instituto critica ainda a 'dicotomia' entre a persecução do crime de lavagem de dinheiro e do crime antecedente. Para a entidade, em sua redação atual, a lei incorpora uma 'anomalia sistêmica' e estimula uma 'proliferação de denúncias' sem indícios mínimos de autoria e materialidade. Nesse mesmo sentido, o IAB sugere que as denúncias por lavagem de dinheiro sejam instruídas com 'prova da materialidade do delito antecedente, e não apenas indícios suficientes da existência da infração'.

"Verificação de meros indícios não parece suficiente à propositura de ação penal", diz um trecho do documento.

A entidade de classe pede ainda que os advogados sejam excluídos no rol de categorias profissionais que, conforme a lei de lavagem de dinheiro, devem fornecer informações sobre movimentações financeiras dos clientes investigados.

"É incompatível com o nosso ordenamento jurídico e com o exercício profissional que o advogado se torne obrigado a ser delator do próprio cliente", argumenta o IAB.

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Instituída em setembro, a comissão de juristas tem 90 dias, contados a partir de sua criação, para apresentar o relatório que deve fundamentar um novo projeto legislativo para mudar as regras atuais para punição ao crime de lavagem de dinheiro. O prazo pode ser esticado, também a partir de uma decisão de Maia.

A comissão é formada por 44 integrantes, sendo 24 advogados, 13 membros do Poder Judiciário e 7 do Ministério Público. Não há representantes, por exemplo, do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), nem da Receita Federal. Nos bastidores, a preocupação é que os advogados, que são maioria no grupo de trabalho, aprovem mudanças lenientes a seus clientes. Isso porque, ao contrário de outras modalidades legislativas, a lei penal é retroativa - ou seja, vale para casos passados.

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