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Impactos concorrenciais da covid-19 para a colaboração entre empresas

Por Paula Salles e Vitória Oliveira
Atualização:
Paula Salles e Vitória Oliveira. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O enfrentamento dos impactos econômicos e sociais da covid-19 exige uma postura colaborativa entre governo e sociedade, tanto no Brasil como globalmente. Nessa ótica, quais seriam as repercussões de associações entre empresas sob o prisma da legislação antitruste?

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Diversos setores da economia estão sentindo os efeitos da pandemia. Se, de um lado, alguns segmentos sofrem com a escassez de procura - a exemplo das companhias aéreas - , outros sofrem com o excesso de demanda e esgotam seus estoques, como está acontecendo com as fornecedoras de produtos para a saúde. Nesse contexto, a necessidade das empresas somarem esforços para responder à crise é premente.

Autoridades concorrenciais do mundo todo tem se movimentado para responder aos desafios da covid-19 para a concorrência, inclusive para fomentar a colaboração entre empresas. Uma das primeiras iniciativas foi a do governo norueguês ao propor a suspensão temporária para companhias de transporte da proibição de cooperação prevista no Competition Act, com o objetivo de manter o transporte de pessoas e mercadorias na Noruega. A autoridade norueguesa determinou que as empresas que fizerem o uso dessa exceção devem notificá-la, mantendo assim a sua competência para investigar condutas que extrapolem a cooperação necessária.

No caso dos EUA, os órgãos de enforcement antitruste 'Justice Department's Antitrust Division' e 'Federal Trade Commission' declararam em nota conjunta que irão responder em até 7 dias as propostas de cooperação, alegando que "instalações de saúde podem precisar trabalhar juntas para prover recursos e serviços às comunidades", enquanto "outros negócios podem precisar temporariamente de combinar produção, distribuição ou serviços de rede de suprimentos relacionados à covid-19".

Aqui no Brasil está em trâmite o Projeto de Lei nº 1179/2020 - PL 1170/20, de autoria do Senador Antonio Anastasia, que propõe, entre outras disposições de caráter transitório, a suspensão do artigo 90, inciso IV, da Lei de Defesa da Concorrência - LDC, que determina a aprovação concorrencial obrigatória dos acordos associativos nas hipóteses previstas pela LDC.

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Enquanto começam a surgir diversas discussões sobre a adequação do PL 1179/20, empresas com atuação no Brasil devem se atentar para o fato de que nem o Conselho Administrativo de Defesa Econômica - Cade, nem o Poder Legislativo tomaram medidas de flexibilização dos parâmetros de notificação da LDC. Dessa forma, a colaboração entre empresas é incentivada apenas nos limites da legislação atual, que veda em absoluto a prática de cartéis, e analisa a troca de informações à luz da regra da razão, isso é, com o sopesamento dos efeitos pró e anticompetitivos.

Por outro lado, a Cade manteve a análise de atos de concentração, favorecendo a atuação conjunta de empresas, desde que respeitados os parâmetros definidos na LDC. Nesse tópico, cabe lembrar que, até o presente momento, os contratos associativos também devem ser notificados ao Cade caso tenham duração igual ou superior a 2 (dois) anos e estabeleçam empreendimento comum para exploração de atividade econômica, desde que haja compartilhamento de riscos e resultados dessa atividade, e desde que as partes ou seus respectivos grupos econômicos sejam concorrentes no mercado objeto da operação, nos termos da Resolução nº 17 do Cade.

É de se esperar que empresas do ramo farmacêutico e de produtos médicos firmem acordos de cooperação para a criação de medicamentos e vacinas contra a covid-19 ou para a prestação de serviços de combate à pandemia.

No entanto, ao invés de afastar a análise antitruste em absoluto como propõe o PL 1170/20 para os contratos associativos, ainda que temporariamente, parece-nos mais conveniente que Cade incentive esforços conjuntos e, simultaneamente, implante um regime de urgência para a análise desses acordos - como está sendo feito nos EUA agora.

Além disso, há a possibilidade de fechamento da operação antes da aprovação final do Cade, à exemplo da autorização precária e liminar, prevista no §1º do artigo 59 da LDC.  Esse recurso foi aplicado pela primeira vez desde a entrada em vigor da Lei 12.529/2011 no Ato de Concentração nº 08700.007756/2017-51, envolvendo a Excelence B. V. e a Rio de Janeiro Aeroportos. Em seu voto, o conselheiro relator, Mauricio Oscar Bandeira Maia, considerou que os prejuízos financeiros pela demora da medida estavam demonstrados nos autos e, o Tribunal do Cade, por unanimidade, concedeu a aprovação precária.

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*Paula Salles é sócia na área de Direito Concorrencial do Felsberg Advogados; Vitória Oliveira é advogada associada do escritório

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