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Igualdade de gênero no júri, uma proposta promissora

Por Victoria de Barros , Silva e Gabriela Tonin Brusamarello
Atualização:
Victoria de Barros e Silva e Gabriela Tonin Brusamarello. FOTOS: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

Tendo em vista a discussão acerca da participação de mulheres na formação do corpo de jurados do Tribunal do Júri, o senador paranaense Flávio Arns apresentou o Projeto de Lei 1.918/2021, em trâmite no Senado, que propõe a alteração dos dispositivos previstos nos arts. 433 e 447 do Código de Processo Penal. Com isso, pretende-se promover a paridade de gêneros na constituição do Conselho de Sentença, ao determinar que, dos 7 jurados escolhidos, ao menos 3 sejam mulheres.

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Ademais, a proposta prevê que, durante a realização do sorteio presidido pelo juiz, dos 25 jurados sorteados, no mínimo 13 deverão ser mulheres. Nos crimes em que a vítima for do sexo feminino, como é o caso do feminicídio, o conselho terá que ser composto por, no mínimo, 4 juradas.

O senador justifica a implementação do projeto de lei devido ao histórico cultural de viés machista no país, que pode interferir nos vereditos do Tribunal do Júri quando compostos apenas por homens. Assim, verifica-se a necessidade da criação de conselhos de sentença que representem a sociedade, levando em conta as disposições expressas da Constituição Federal a favor da isonomia entre gêneros.

Um caso de bastante repercussão que influenciou a reflexão sobre o assunto foi a recente sessão de julgamento de Luis Felipe Santos Manvailer, condenado por assassinar sua esposa, a advogada Tatiane Spitzner. Dos 7 jurados selecionados para o julgamento, nenhum era do gênero feminino. Não se trata da imposição de minorias ao Conselho de Sentença, mas de uma regra que busca que a mulher passe ter maior presença na composição do corpo de jurados do Tribunal do Júri. É um direito feminino, baseado na igualdade de gênero, e, caso aprovado o projeto, reforçará um dever das cidadãs brasileiras. Compor um Conselho de Sentença é, antes de tudo, uma grande responsabilidade, e ambos os gêneros devem ter sua representatividade garantida de forma paritária.

É essa, no fim das contas, a intenção do Júri: fazer com que a sociedade seja ouvida em crimes dolosos contra a vida. É ela quem vai decidir o futuro do acusado, e essa decisão deve levar em consideração a igualdade de gêneros, especialmente quando se trata de acusação de feminicídio.

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Para que a mudança seja efetiva, é necessário analisar a forma como é selecionada a lista geral de possíveis jurados. A dinâmica funciona da seguinte maneira: existe uma lista geral, que pode ser extraída a partir de um cadastro no Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, em que as pessoas se voluntariam para compor um júri (na capital do Paraná, ao menos, este é o método utilizado). A lista pode ser formada também a partir de requisições a empresas, prefeituras, locais de ensino, Ministério do Trabalho ou de Tribunais Eleitorais, mas as regras podem variar conforme cada estado e/ou município.

A partir dessa grande lista geral, é feito um sorteio, e 25 pessoas são intimadas para comparecer à Vara do Tribunal do Júri em data determinada. Então, há um novo sorteio, para estabelecer as 7 que de fato vão compor o Conselho de Sentença. Nessa fase, tanto a acusação (representada pelo Ministério Público e, eventualmente, assistentes) como a defesa (advogados atuando em favor do acusado) podem, sem qualquer justificativa, recusar até 3 jurados (acusação e defesa). Ou seja, a lista geral tem fundamental importância na hora da seleção, e deveria, desde logo, ser composta com proporção entre os gêneros. Em um município rural, em que a lista é retirada de cadastros ligados ao Ministério do Trabalho, por exemplo, sabendo-se que a maioria dos trabalhadores rurais são homens, não surpreende que a lista geral seja composta por uma proporção maior de homens do que de mulheres. Assim, é elogiável a proposta de que o sorteio inicial, de 25 pessoas, contenha o mínimo de 13 juradas mulheres. Parece que seria também relevante que a lista geral, da qual os 25 são selecionados, contenha proporção de gêneros.

A ideia do projeto é bastante promissora e pode ter um resultado real em futuros julgamentos, principalmente de crimes contra a vida de mulheres, com decisões mais justas e representativas.

*Victoria de Barros e Silva é advogada do Núcleo de Direito Criminal da Dotti e Advogados; Gabriela Tonin Brusamarello é acadêmica de Direito e estagiária da Dotti e Advogados

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