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ICMS no PIS/Cofins: esse seriado não tem fim?

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Por Tércio Chiavassa
Atualização:
Tércio Chiavassa. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Pouco mais de três anos após o Supremo Tribunal Federal ("STF") decidir que é ilegítima a inclusão do ICMS nas bases de cálculo das contribuições ao PIS e da COFINS, somos surpreendidos com novos episódios dessa série que já dura décadas.

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Deixando inicialmente de lado os Embargos de Declaração apresentados pela União Federal, ainda em 2017, mais recentemente os atores desse seriado não se cansam de atuar, embora saibamos que o episódio final já foi veiculado.

O episódio de dezembro foi recebido com grande surpresa por todos players do tema. A empresa Imcopa (autora) apresentou uma petição em que substituiu os advogados então responsáveis pela condução do caso.

Mais recentemente, no mês passado (maio), Imcopa inovou ao solicitar aos Ministros do STF a análise de uma solução alternativa no caso, também em resposta aos Embargos de Declaração da União Federal, oferecendo um caminho que adotaria o ICMS destacado para efeitos de liquidação, porém excluindo os créditos de ICMS da cadeia, produto por produto (sem excluir saldo credor e operações não tributadas), além de sugerir a possibilidade de uma composição com a União Federal. Anexou parecer da ex-Ministra do Superior Tribunal de Justiça, Eliana Calmon.

Vale aqui lembrar que a União Federal, em seus Embargos de Declaração, menciona que a decisão do STF contém todos os vícios possíveis e previstos pelo artigo 1.022 do Código de Processo Civil, ou seja, omissão, obscuridade, contradição e ainda erro material.

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Em relação à alegada contradição na decisão do STF, procurou demonstrar a União Federal que o voto condutor, seguido pela maioria dos Ministros, não permitiria concluir qual foi a premissa adotada pela decisão, ou seja, se (i) um tributo não pode incidir na base de cálculo de outro tributo; ou se (ii) o ICMS não seria custo da empresa adquirente e, por essa razão, não estaria contido no faturamento da empresa, sendo receita de terceiro (do respectivo Estado), o que o afasta das bases de cálculo do PIS e da COFINS.

A nosso sentir, o voto condutor da Ministra Carmen Lúcia é bastante didático, correto e enfático. A construção de seu raciocínio parte do pilar estabelecido no julgamento do Recurso Extraordinário 240.785 (caso Auto-Americano), especialmente pelo voto-condutor do Ministro Marco Aurélio Mello, que discordou da premissa do voto vencido do Ministro Eros Grau e que pretendia ver o ICMS incluído no faturamento dos contribuintes.

A Ministra Carmen Lúcia trilhou o caminho de que o ICMS não é custo dos contribuintes e, por essa razão, não é faturamento das empresas. Afirma em alto e bom som que o ICMS não compõe as bases de cálculo do PIS e COFINS. Qual ICMS? "todo o ICMS" (página 26 do Acórdão, reproduzido no item 3 da ementa). Aqui está o trailer do último episódio do seriado, segundo pensamos.

Oportuno mencionar, em oposição à afirmação da União Federal de que o ICMS pago é que deveria ter sido incluído, que o próprio voto do Ministro Gilmar Mendes (vencido no tema) expressamente menciona que a discussão está centrada em saber se o "ICMS destacado" (página 112 do Acórdão) deveria ou não ser incluído nas bases de cálculo das contribuições sociais. Inexiste tal "contradição".

Tal conclusão é intuitiva. Salta aos olhos. É só visualizar uma Nota Fiscal para verificar que há indicação do preço total da mercadoria e do respectivo destaque do ICMS. Qual valor os contribuintes incluíram nas bases de cálculo do PIS e da COFINS?

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É curioso que não há qualquer norma ou solução administrativa da Receita Federal, no passado, alertando e indicando aos contribuintes que deveriam ter incluído o ICMS pago -- e não o destacado -- nas bases de cálculo do PIS e da COFINS, já que eles estariam pagando mais do que deveriam e poderiam incluir só o ICMS pago. Ora, isso não aconteceu justamente porque não foi essa a prática que se verificava no dia a dia das empresas.

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A obviedade indica que o ICMS destacado foi incluído pelos contribuintes. A verdade é que se pretende desviar do foco da discussão e trazer temas novos para a discussão, como a não-cumulatividade do ICMS e seu sistema de débitos e créditos. Decidiu o STF que o PIS e a COFINS incidem sobre o faturamento. É ilegítima a inclusão do ICMS. Qualquer ICMS. Ou seja, a partir de tal julgamento, os contribuintes possuem direito a não mais incluir o ICMS nas bases de cálculo de tais contribuições sociais; e, evidentemente, recuperar todo o ICMS que indevidamente incluiu no passado, observados os cinco anos de prescrição. É incômodo repetirmos os episódios já assistidos tantas vezes.

Por sua vez, a petição apresentada pela Incompa encontra uma decisão já proferida pelo STF em um recurso dotado de repercussão geral. Tal decisão produz efeitos imediatamente para todos os contribuintes e, a partir do momento em que tal força é incorporada à decisão, o destino não está mais exclusivamente nas mãos da parte. Muitos já estão envolvidos. A audiência afetada é grande!

Vale mencionar que o resultado pretendido pela parte poderia ser alcançado em composição diretamente com a União Federal no âmbito de uma transação de tese, nos termos em que previstos pela Lei 13.988/20, sem que isso prejudique a todos os demais contribuintes e sem abalar a tese já definida pelo STF no julgamento de março de 2017, dada a eficácia cogente da repercussão geral originada naquele julgamento.

Outros dois episódios desse interminável seriado foram apresentados no mês passado. São as petições da União Federal pretendendo sejam suspensos os julgamentos de todos os recursos que versem sobre esse tema no Brasil e também o pedido de admissão da Confederação Nacional das Indústrias como amicus curiae.

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Acreditamos que a decisão do STF de março de 2017 é episódio final. Parece-nos que tal pleito de suspensão não deve ser acolhido. Já os contribuintes que tiverem decisões contrárias ou julgamentos suspensos poderão adotar os recursos cabíveis, além da reclamação, para fazer valer a autoridade cogente da decisão do STF.

Por fim, espera-se que a Ministra Carmen Lúcia analise e acolha o pedido de ingresso como amicus curiae da Confederação Nacional das Indústrias. O pleito é pertinente, embora o momento processual em que formulado não seja de deferimento usual. Porém, parece-nos importante diante das circunstâncias atuais e que clamam a personificação da entidade para a defesa dos interesses dos contribuintes afetados pela eficácia da repercussão geral.

Ao contrário de tantos seriados em que a audiência mal pode esperar pelo lançamento do próximo episódio, a verdade é que o último episódio desse seriado já foi exibido (em 2017), repetindo aliás o enredo do episódio de 2006. Os contribuintes estão cansados e não aguentam mais tantas manobras para impedir a eficácia do último episódio!

*Tércio Chiavassa, sócio de Pinheiro Neto Advogados

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