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Há vida depois da recuperação judicial

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Por Gustavo Licks
Atualização:
Gustavo Licks. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

A visão da recuperação judicial como um monstro, único caminho -  e mal assombrado - para uma empresa em dificuldades pagar suas dívidas, está com os dias contados no Brasil. Em janeiro de 2020, as alterações na legislação aplicável às sociedades empresárias em crise foram tantas, que praticamente dobraram o tamanho da Lei de Falências (11.101, de 2005).

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Houve mudanças importantes em detalhes dos processos de recuperação judicial e falimentar, preservando sua estrutura e conceitos. Com isso, a vacina contra a crise demorou, mas chegou. Aliás, são três.

A primeira, com novas possibilidades do devedor se recuperar da crise, por exemplo, o desconto de até 70% da dívida consolidada com o fisco.

A segunda está nas alterações da lei falimentar, para dar efetividade ao processo. Agora, o prazo médio dos processos não deve passar de 4 anos, e os bens precisarão ser vendidos em até 180 dias da apresentação do auto de arrecadação, sob pena de destituição do administrador judicial (antigo síndico). E os créditos devem começar a ser pagos logo em seguida.

Até então, era necessário apurar o valor de todos os créditos antes de se começar a pagar o primeiro, o que poderia durar uma eternidade, com valores expressivos depositados em juízo. A maior celeridade também beneficia o falido, que retorna à atividade "limpo", sem dívida. Muitos veem aí a única solução para o Botafogo de Futebol e Regatas, por exemplo.

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É importante entender que a falência não deve ter natureza punitiva. O retorno do empresário ao mercado é importante, assim como o pagamento rápido dos credores e a conservação dos bens da massa falida. A Lei 14.112, alterada, permite fazer do limão uma limonada, acabando com as recuperações nas quais o devedor prometia pagar só em 20 ou 30 anos.

A terceira vacina foi possibilitar, na mesma lei, a mediação antes do processo de recuperação. De forma preliminar, o juiz poderá estimular a conciliação entre devedor e credor. Os participantes da mediação tentam alcançar um ponto ótimo. Se não conseguirem, vida que segue, e começa o processo de recuperação judicial.

Credores como financeiras públicas, Banco do Brasil, Caixa Econômica, BNDES e AgeRio, cujos programas de conformidade ficaram mais rigorosos, podem encontrar aí um bom ambiente de negociação. Foi o que ocorreu na recuperação da Sete Brasil. A mediação com a Petrobras, única cliente, foi destravada em audiência promovida pelo juiz da Terceira Vara Empresarial do Rio de Janeiro, Luiz Alberto Carvalho Alves. A mediação foi a base do plano de recuperação, aprovado por aclamação pelos credores.

O remédio pode ser ministrado entre grandes devedores e credores. Se alcançarem um consenso, nem será preciso haver a dispendiosa recuperação, que demora no mínimo 3 anos. A mediação abre um novo horizonte, fora do caminho judicial, para as empresas com dificuldades de caixa. O próprio processo falimentar tem tudo para deixar de ser uma via crucis.

Esses novos caminhos prometem mudar a forma como a superação da crise do empresário é vista no Brasil, onde os resultados podem ser trágicos, como foi a falência do Barão de Mauá, em 1875. Falências importantes iniciadas nas décadas de 80 e 90 do século passado, como Mesbla, Casas da Banha e Supermercado Disco, ainda não terminaram. Também não se pode chamar de exitosos os casos da Varig e, mais recentemente, da Avianca. São poucos os processos de recuperação que conseguiram preservar a atividade das empresas e sua função social, o que aconteceu com a Casa & Vídeo, Oi, Aluthec e Grupo Peixoto de Castro. Agora podemos ter a esperança de que esses raros exemplos se tornem a regra e não a exceção.

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*Gustavo Licks é administrador judicial

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