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Lira diz que voto impresso não tem apoio para chegar ao plenário; para Gilmar, proposta de Bolsonaro é 'conversa fiada'

'Me parece que essa ideia de que sem voto impresso não podemos ter eleição, ou não vamos ter eleições confiáveis, na verdade esconde talvez algum tipo de intenção subjacente, uma intenção que não é boa', afirmou o decano do STF em debate na manhã desta sexta, junto do presidente da Câmara Arthur Lira

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Foto do author Weslly Galzo
Por Pepita Ortega e Weslly Galzo
Atualização:

Atualizada às 18h59*

O ministro Gilmar Mendes, o presidente Jair Bolsonaro e o deputado Arthur Lira. Foto: Andre Dusek/Estadão, Gabriela Biló/Estadão e Najara Araújo/Agência Câmara

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O presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), disse nesta sexta-feira, 30, que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) sobre o voto impresso não terá apoio para chegar ao plenário da Casa. Lira fez as afirmações um dia depois de o presidente Jair Bolsonaro defender, em transmissão ao vivo pelas redes sociais, mudança no sistema de urna eletrônica, apesar de ter admitido não ter provas de fraude nas eleições, como vinha dizendo desde março do ano passado.

"A questão do voto impresso está tramitando na comissão especial. O resultado da comissão impactará se esse assunto vem ao plenário ou não. Na minha visão, tudo indica que não", afirmou o presidente da Câmara, em live realizada pelo Conjur. A transmissão também contou com participação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, para quem esse assunto é uma "conversa fiada".

A PEC do voto impresso está em comissão especial da Câmara, que retomará os trabalhos na próxima semana, após o recesso parlamentar. A tendência é que a proposta, defendida por Bolsonaro e seus aliados, seja derrotada. "Não temos nenhum fato que diga respeito a uma fragilidade do sistema, no que diz respeito a fraudes. Mas também não vejo problema de, com moderação, nós sabermos que há um processo de auditagem, mas alguma forma consensuada, dar mais transparência a isso. "Onde não há problema, nós temos que deixar ainda mais claro. Acredito, defendo e ratifico que não há problema, mas acho que qualquer versão sobre resultado de eleição é ruim para o País, para as instituições, para todos nós", afirmou.

O Estadão revelou que no último dia 8 Lira recebeu um recado do ministro da Defesa, Walter Braga Netto, por meio de um interlocutor político. Na ocasião, o general pediu para comunicar, a quem interessasse, que não haveria eleições em 2022 sem aprovação do voto impresso, atualmente em tramitação na Câmara. Após a publicação da reportagem, Braga Netto divulgou nota na qual disse que não se comunica por interlocutores e reiterou o apoio ao "voto eletrônico auditável", com "comprovante impresso".

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Lira procurou Bolsonaro e disse que não contasse com a Câmara para qualquer ruptura institucional. A defesa do voto impresso feita por Braga Netto foi muito criticada tanto no Supremo Tribunal Federal (STF) como no Congresso. Na live desta quinta-feira, Bolsonaro disse que os militares devem, sim, se manifestar sobre voto impresso porque essas eleições têm a ver com a soberania nacional.

Na prática, a ameaça feita por Braga Netto ao condicionar a realização de eleições à aprovação do voto impresso repetiu o que o presidente havia dito naquele mesmo dia 8, em conversa com apoiadores. "Ou fazemos eleições limpas ou não temos eleições", afirmara ele, ao insistir em que o sistema atual permite fraude.

Na transmissão ao vivo pelas redes sociais, porém, Bolsonaro disse não ter "provas", mas apenas "indícios" de fraudes nas urnas eletrônicas. Mostrou vídeos que circulam há anos as redes sociais, que já foram classificados como falsos por agências de checagem, entre as quais o Estadão Verifica, e expôs análises enviesadas sobre apuração dos votos. Em um dos vídeos exibidos aparece o astrólogo Alexandre Chut, que diz fazer acupuntura em árvores.

Decano do Supremo, o ministro Gilmar Mendes viu uma 'intenção subjacente' em torno das discussões sobre o voto impresso e as alegações de fraudes nas eleições. "Me parece que aqui nós temos talvez uma falsa questão", afirmou o magistrado no debate organizado pela TV Conjur. "Me parece que essa ideia de que sem voto impresso não podemos ter eleição, ou não vamos ter eleições confiáveis, na verdade esconde talvez algum tipo de intenção subjacente, uma intenção que não é boa".

Gilmar lembrou a 'tradição' de fraudes em relação ao voto manual e sua contabilização, apontando 'impropriedade' na discussão do voto impresso, uma vez que nunca houve problemas com as urnas eletrônicas. O sistema está em vigor no Brasil há 25 anos.

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"Se fosse a solução, se de fato temos tanta certeza de que não há problemas no voto impresso, na verdade seria melhor voltar para o voto manual, que nós tivemos ao longo da vida inúmeros problemas, inclusive na contabilização, e depois no fenômeno do 'mapismo'. Então, vamos parar um pouco de conversa fiada", disse.

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O ministro destacou que a urna eletrônica é auditável, ao contrário do que diz Bolsonaro. "No dia anterior à eleição se faz um apanhado aleatório de urnas e, no dia seguinte, se faz uma simulação com votação, com os partidos presentes. Isso tudo é transparente e nós devemos fazê-lo cada vez mais. E os partidos, a rigor, às vezes nem comparecem a todos esses eventos porque consideram que de fato o sistema funciona bem", afirmou.

Nos bastidores, tanto ministros do Supremo como do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) criticaram Bolsonaro. Um deles o definiu como "moleque", que "desrespeita as instituições". Na transmissão ao vivo pelas redes sociais, Bolsonaro mais uma vez insultou o presidente do TSE, Luis Roberto Barroso. "É justo quem tirou Lula da cadeia, quem o tornou elegível, ser o mesmo que vai contar o voto numa sala secreta e escura no TSE", perguntou ele, ao citar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que hoje lidera as pesquisas de intenção de voto.

No Congresso, parlamentares ouvidos pelo Estadão/Broadcast dão a proposta do voto impresso como "enterrada". No último dia 21, o senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) protocolou uma interpelação no Supremo para que Bolsonaro explique seus comentários sobre fraude nas eleições de 2018 "comprovando suas afirmações com provas documentais e apresentando nominalmente os supostos responsáveis pela conduta". Nesta sexta-feira, 30, ele reforçou o pedido na Corte juntando o que Bolsonaro disse na live, quando admitiu não ter provas.

"Bolsonaro precisa se comportar como um adulto, não como um alienado ocupando a cadeira de presidente. Já apresentei interpelação junto ao STF para que ele apresente provas ou se retrate sobre as várias acusações falsas de fraude eleitoral. E hoje juntamos o conteúdo da última live", afirmou Vieira.

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A ex-presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e líder da bancada feminina, Simone Tebet (MDB-MS), citou dados do Relatório Global de Expressão 2021 mostrando que Bolsonaro emitiu 1.682 declarações falsas ou enganosas em 2020, uma média de 4,3 por dia. "Pelo menos ontem (quinta-feira), disse uma verdade: que não tem provas de fraudes nas urnas eletrônicas", observou Tebet/COLABORARAM DANIEL WETERMAN E CAMILA TURTELLI

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