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Gás natural: um pacto nacional que não caminhará sozinho

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Por Anabal Santos Jr. e Rômulo Florentino
Atualização:
Anabal Santos Jr. e Rômulo Florentino. FOTOS: ARQUIVO PESSOAL Foto: Estadão

Foi publicado nesta sexta-feira o Decreto nº 10.712/2021, que regulamenta a Nova Lei do Gás, sancionada em abril pela Presidência da República. É mais um dos passos muito esperados pelo setor rumo ao choque de energia barata anunciado pelo Governo Federal em 2019. Para chegar lá, no entanto, ainda há um longo caminho para que a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) consolide as regras para as quais os recentes normativos trazem diretrizes, como prazos e condições para o acesso não discriminatório, negociado, transparente e sob remuneração adequada de terceiros interessados a instalações essenciais para o desenvolvimento do mercado de gás natural, como gasodutos de escoamento, instalações de tratamento ou processamento e terminais de GNL. Além disso, o grande desafio será o de garantir que todos os estados da federação adotem regras para os serviços locais de gás canalizado que não estejam em conflito com a Constituição Federal.

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Essa ainda é uma distante realidade. Apenas oito das 27 unidades federativas possuem mercado aberto e alinhado ao Novo Mercado de Gás. Só nos estados do Amazonas, Bahia, Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Sergipe e São Paulo a comercialização do gás, atividade que o Decreto nº 10.712/2021 agora não deixa mais dúvidas se classificar como concorrencial, não se confunde com a concessão da prestação de serviços de gás canalizado, ou distribuição, a monopólios locais. Embora essa seja uma boa notícia para esses estados, mais bem posicionados para receberem investimentos do setor, no mercado nacional ainda são necessários cautela e trabalho antes de comemorar.

O decreto estabelece que a urgente harmonização e aperfeiçoamento das normas estaduais para a indústria de gás natural utilizarão como mecanismos redes de conhecimento coordenadas pelo Ministério de Minas e Energia e diretrizes propostas pela ANP, cuja adesão dos estados será voluntária e registrada em um Pacto Nacional para o Desenvolvimento do Mercado de Gás Natural. É perceptível e legítimo o esforço do Governo Federal para não invadir a competência constitucional dos estados de regular a distribuição do gás natural. No entanto, sem o estabelecimento de incentivos para aderência a essas melhores práticas, o grande pacto nacional corre o risco de ficar mesmo à mercê do voluntarismo. O preço pode ser a perpetuação de um mercado incipiente na maior parte do Brasil.

O novo decreto evoluiu ao dirimir dúvidas sobre regras e excepcionalidades a serem consideradas pela ANP quando da classificação de gasodutos de transporte, estabelecer parâmetros para a cessão da capacidade de transporte e esclarecer as condições em que pode ocorrer a relação societária entre empresas que exerçam atividades em diferentes elos da cadeia de gás natural. Contudo, será fundamental um olhar mais atento nos próximos meses para o amadurecimento do pacto nacional que está sendo proposto. Um caminho pode ser o estabelecimento de mesas de coordenação regionais tratando das necessidades específicas de cada estado para o desenvolvimento do mercado de gás, vide o bem-sucedido modelo que tem sido implementado no Programa de Revitalização da Atividade de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural em Áreas Terrestres (REATE) sob coordenação do Ministério de Minas e Energia. Afinal, é justamente na prestação dos serviços locais de gás canalizado que o insumo chega - ou deveria chegar - ao consumidor. Caso o mercado não se desenvolva nesta ponta da cadeia, todos os esforços em desenvolver políticas públicas para fortalecimento nacional da indústria ficam enfraquecidos.

Como próximos passos, será fundamental uma jornada proativa e pedagógica do Governo Federal, estado a estado, para tratar da importância da harmonização das regras de distribuição. Os produtores independentes e consumidores, ansiosos para que todos os estados revisem desde já seus normativos à luz das melhores práticas, certamente serão aliados deste esforço. Se, além dos interesses próprios dos estados em desenvolver seus mercados, que já deveriam ser suficientes para garantir seus engajamentos, outros incentivos possam ser estabelecidos, melhor ainda. Assim o pacto nacional para o gás natural não ficará apenas no papel.

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*Anabal Santos Jr. e Rômulo Florentino são, respectivamente, secretário executivo e gerente de Regulação e Políticas Públicas da Associação Brasileira dos Produtores Independentes de Petróleo e Gás (ABPIP)

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