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Ganho lógico-sistêmico da prisão domiciliar para as mães brasileiras

Por Pedro Machado de Almeida Castro
Atualização:

A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, em uma bem-vinda inovação jurisprudencial, concedeu habeas corpus coletivo em nome de todas as mulheres presas grávidas e mães de crianças com até 12 anos de idade. Tal decisão também se estende às adolescentes em situação semelhante do sistema socioeducativo e mulheres que tenham sob custódia pessoas com deficiência.

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Para além da inovação do meio utilizado (o habeas corpus coletivo), do mérito em si da decisão (que aplaudimos) e de seu alcance (a decisão se aplica a todas as mães, "salvo os casos de crimes praticados por elas mediante violência ou grave ameaça contra seus descendetes ou, ainda, em situações excepcionalíssimas", devidamente fundamentado pelo juiz, afirmou o ministro relator Ricardo Lewandowski), desejamos tratar de uma consequência lógica do julgamento, de uma interrogação que certamente ficou para a população: o que acontece quando a criança atingir a idade limite de 12 anos? A mãe irá para o cárcere? A resposta só pode ser um incontestável não.

É consenso na academia e nos tribunais brasileiros que a prisão cautelar (essa que pode ser substituída pela prisão domiciliar, por previsão do artigo 318, inciso V de nosso Código de Processo Penal) deve ser a última medida aplicada pelo Estado-juiz. Assim, o Estado não tem direito de prender alguém que ainda não foi definitivamente condenado se existe uma medida diversa que seja suficiente para proteger o processo e a sociedade.

Isso porque ainda não há culpa formada, mas somente indícios de criminalidade. Em outras palavras, a avaliação que se faz para aplicação de uma medida cautelar pessoal qualquer (prisão, prisão domiciliar, uso de tornozeleira eletrônica dentre outras) é de "probabilidade", nunca de "possibilidade".

É possível que alguém acusado de um crime fuja, destrua provas, corrompa testemunhas? É sempre possível. Mas para aplicação de qualquer medida é indispensável que essa possiblidade se materialize num senso de probabilidade que se apoie em provas concretas.

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Por exemplo, no caso de um acusado que possui dupla nacionalidade e está no aeroporto internacional com o passaporte de seu país natural, há risco de fuga. Quando existem depoimentos de testemunhas que se dizem ameaçadas, existe risco ao processo.Seja como for, esse critério de probabilidade é muito elástico, sendo mais forte em alguns casos e mais fraco em outros. Todavia, nunca se trata de uma certeza.

Mas, afinal, o que isso tem a ver, então, com a chegada da idade limite dos filhos para estas mães?

Apesar de a decisão do Supremo Tribunal Federal ter sido explícita em afirmar "enquanto perdurar tal condição", a mãe que estiver em prisão domiciliar só poderá retroceder ao cárcere se houver provas que demonstrem que a medida mais gravosa é necessária. Ou seja, que manter a prisão domiciliar não é suficiente para proteção do processo e da sociedade. Nesse caso, aliás, é possível determinar o cárcere mesmo quando ela esteja grávida ou houver criança menor de 12 anos. Indispensável, nesse cenário, que se comprove ter ela cometido qualquer falta ou atentado contra o processo durante o período da domiciliar.

Assim, se o filho completa 12 anos e a mãe nunca prejudicou o processo durante todo o tempo em que esteve presa domiciliarmente, o juízo de probabilidade de perigo necessário para o encarceramento se torna ínfimo ou nulo. A razão é simples: esse período de tranquilidade comprova, na prática, que uma medida mais grave é desnecessária.

Por isso, é consequência (e um ganho) lógico-sistêmica da decisão do STF que, quando o tempo demonstrar que a prisão domiciliar for suficiente, as referidas mães não podem ser enviadas às penitenciárias simples e objetivamente porque seus filhos passaram dos 12 anos.

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Por fim, não é demais lembrar, se aos olhos menos atentos a falta de grades, cela, uniforme ou condições degradantes faça supor que tais mães estão em liberdade, é bom que diga, não estão. Estão presas domiciliarmente, com todas as restrições que isso acarreta.

*Pedro Machado de Almeida Castro é advogado criminalista e mestre em Direito Processual Penal pela USP.

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