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Fux 'limpa' a ficha de Deltan na véspera de julgamento no CNMP

Na prática, ao afastar advertência aplicada contra Deltan Dallagnol no ano passado, Fux determina que procurador seja tratado pelo CNMP como se ainda não tivesse sido punido pelo órgão

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Por Breno Pires e Rafael Moraes Moura/ BRASÍLIA
Atualização:

Luiz Fux, do Supremo, propôs que o Plenário discutisse preliminarmente se a jurisprudência da Corte - que admite a execução antecipada de pena - pode ser revista em um intervalo curto de tempo. Foto: Daniel Teixeira/Estadão

Na véspera da sessão do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), o vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, decidiu nesta segunda-feira (17) que uma advertência aplicada contra o coordenador da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, não deve ser considerada no julgamento de outros três processos previstos na pauta do CNMP desta terça-feira que miram o procurador. A liminar de Fux garante os "bons antecedentes" do procurador e, assim, pode favorecer a defesa do procurador em um julgamento de grande importância marcado para esta terça-feira no CNMP. O que está na pauta é um pedido que pode levar ao afastamento de Deltan da Lava Jato, mas não imediatamente.

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A decisão foi vista nos bastidores do CNMP como um prenúncio de uma nova gestão no Supremo, que poderá alterar uma correlação de forças que caminhavam para uma correção dos excessos da Lava Jato. Simpático à força-tarefa de combate à corrupção, Fux assumirá a presidência do STF no dia 10 de setembro, no lugar do ministro Dias Toffoli, integrante da ala que, desde 2017, vem impondo reveses aos procuradores de Curitiba.

Segundo um conselheiro, que não quis se identificar, a decisão de Fux deve afetar o julgamento de Deltan Dallagnol, já que o antecedente da advertência poderia viabilizar uma medida mais grave desta vez. Na prática, ao manter Deltan "ficha limpa", Fux retirou um dos argumentos que poderiam basear a abertura de um processo para a remoção de Dallagnol do comando da Lava Jato.

A punição aplicada pelo CNMP a Deltan Dallagnol foi uma advertência, em novembro do ano passado, por 8 votos a 3. O julgamento marcou a primeira vez que Deltan foi punido pelo Conselho Nacional do MP, órgão responsável por fiscalizar a conduta de membros do MP. Esse processo dizia respeito à entrevista à rádio CBN na qual Deltan criticou o STF, ao afirmar que três ministros do Supremo formam 'uma panelinha' e passam para a sociedade uma mensagem de 'leniência com a corrupção'.

Na prática, a advertência é uma punição branda, que fica registrada na ficha funcional do procurador, servindo como uma espécie de "mancha no currículo". Se Deltan for punido com advertência nos outros casos que ainda tramitam no CNMP, isso pode levar a uma punição maior no futuro - a censura. A reincidência na censura, por sua vez, pode acabar em suspensão de até 45 dias.

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Na pauta desta terça-feira, está o pedido de remoção de Deltan da Lava Jato feito pela senadora Kátia Abreu (PP-TO). Antes da decisão de Fux, dois conselheiros disseram à reportagem que o cenário não era nada favorável a Deltan e que a abertura do processo de remoção por interesse público deveria acontecer, mas sem afastamento imediato.

Em conversas reservadas, conselheiros que não são defensores da Lava Jato dizem que há oito votos, dentre os onze integrantes do CNMP, contrários a Deltan. No entanto, o que estará em julgamento é a abertura do processo de remoção, e não a decisão final sobre afastar ou não. Assim, a única forma de retirar Deltan da Lava Jato, já nesta terça-feira, seria se algum integrante apresentasse uma questão de ordem, o que está sendo avaliado. Contudo, a avaliação é que, mesmo se for levantada uma questão de ordem, algum integrante do Conselho deve pedir vista.

A hipótese de afastamento imediato causou comoção entre procuradores pró-Lava Jato e os demais aliados da megaoperação de combate à corrupção, como o ex-juiz titular da maioria dos casos denunciados pela força-tarefa - Sérgio Moro, ex-ministro da Justiça. A defesa de Deltan está por conta de Francisco Rezek, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal. Rezek protocolou há uma semana uma petição no Supremo pedindo que sejam suspensos os procedimentos que pedem afastamento do procurador. O relator, Celso de Mello, pode decidir ainda nesta segunda-feira.

Visita. A cúpula da Procuradoria-Geral da República (PGR) tem promovido uma ofensiva para limitar poderes da Lava Jato desde maio, quando o procurador-geral Augusto Aras requisitou cópia integral de todas as bases de dados reunidas ao longo de seis anos de operação, não apenas no Paraná, como também no Rio de Janeiro e em São Paulo. Os ânimos se exaltaram após uma controversa visita da subprocuradora-geral Lindôra Maria Araújo ao prédio onde se aloja a força-tarefa do Paraná. Na guerra de versões, a Lava Jato apontou que não poderia fornecer as cópias de dados sigilosos de investigados sem decisão judicial específica, mas a PGR afirma que decisões de 2015 do próprio Moro e da juíza Gabriela Hardt conferem essa permissão. A PGR levou a discussão ao Supremo, que já deu duas decisões conflitantes: o presidente da corte, Dias Toffoli, mandou entregar os dados, e o relator da Lava Jato, Edson Fachin, desfez a ordem.

O PGR tem assento fixo no CNMP, mas quem tem o representado é o vice-procurador-geral, Humberto Jacques. Aras incumbiu Jacques de liderar a frente pela "correção de rumos" da Lava Jato. Foi Jacques, por exemplo, quem apresentou a ação ao Supremo em busca dos dados da operação. Jacques também está incumbido da missão de achar uma "alternativa" ao modelo das forças-tarefas de combate à corrupção. Na visão da gestão atual da PGR, expressa em notas à imprensa ou comentários públicos, as forças-tarefas são desagregadoras, podem estar atuando às margens da lei e precisam ter desvelados seus segredos. Nem Aras nem Jacques têm dito qual será o posicionamento no caso, mas interlocutores deles tratam de separar as duas coisas: o julgamento do CNMP e os eventos relacionados à força-tarefa da Lava Jato não teriam relação.

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Além da PGR, o conselho é formado pelo corregedor nacional do CNMP, Rinaldo Reis Lima, e por indicados do Superior Tribunal de Justiça (STJ), do Ministério Público Militar (MPM), do Ministério Público do Trabalho (MPT), do Ministério Público Federal (MPF), do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, do Ministério Público Estadual e da Ordem dos Advogados do Brasil - na composição atual, há apenas um integrante de cada um desses órgãos, exceto pela OAB, que tem dois.

O relator do pedido feito por Kátia Abreu para remoção de Deltan da Lava Jato é, coincidentemente, o representante do Senado no CNMP: Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho. Bandeira exerce, desde a gestão Renan Calheiros (MDB-AL), com continuidade na gestão Davi Alcolumbre (DEM-AP), o importante cargo de secretário-geral da Mesa do Senado. É dado como certo que votará contra Deltan Dallagnol.

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