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Fraude em empréstimos via contratos digitais e a ausência de responsabilidade das instituições bancárias

Por Vanessa Salem Eid
Atualização:
Vanessa Salem Eid. FOTO: DIVULGAÇÃO  

A Súmula 479 publicada pelo Superior Tribunal de Justiça, no ano de 2012, versa que as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias, ou seja, quando o consumidor é lesado dentro de uma instituição bancária, seja ela física ou digital, deve ser ressarcido. Todavia, esse entendimento vem se alterando significativamente de modo a retirar tal responsabilidade diante da constante desídia dos próprios consumidores.

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O avanço tecnológico trouxe facilidades que resultaram na criação de aplicativos de comunicação digital e até mesmo de plataformas para transações bancárias. Contudo, com o aumento exponencial dessa tecnologia, as fraudes cresceram em igual proporção, atingindo não apenas pessoas físicas, como as próprias instituições bancárias.

Em decorrência de tais fraudes o número de ações judiciais também aumentou de forma extrema, tendo como objeto a restituição de valores "antecipados" por consumidores que buscam a tomada de empréstimos que nunca se concretizaram e foram, supostamente, formalizadas em nome de instituições bancárias, as quais vemos ao final das ações, foram também vítimas dos fraudadores que se valem indevidamente de seu nome, logotipo, marca, etc.

Muito embora os consumidores embasem suas alegações em suposta hipossuficiência, princípio protegido pelo Código de Defesa do Consumidor, a jurisprudência vem se sedimentando no sentido de afastar a responsabilidade das instituições bancárias em tais casos, pelo fundamento de que a excludente de ilicitude está prevista no artigo 14, parágrafo 3º, inciso II da mencionada Lei, versando que o fornecedor de serviços não será responsabilizado quando provar a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros.

Insta salientar que, a responsabilidade civil do fornecedor de serviços, independe da extensão da culpa porque é considerada objetiva, aperfeiçoando-se mediante o concurso de três pressupostos: vício do serviço, evento danoso e relação de causalidade entre o alegado vício do serviço e o dano.

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Ou seja, no caso de fraude ocasionada por terceiros que atinge o consumidor, utilizando-se do nome de instituições financeiras que não possuem qualquer conexão com o evento danoso, a elas não se aplica a responsabilidade objetiva, até porque os consumidores comumente dão causa ao evento danoso ao firmarem contratos sem ao menos conferirem os dados das instituições com as quais estão negociando, configurando-se sua culpa exclusiva.

Ou seja, ao se observar a forma com que a fraude ocorre, percebe-se que os criminosos se aproveitam da falta de atenção dos próprios consumidores, utilizando-se tão somente do nome de bancos conhecidos e instituições financeiras que sequer oferecem empréstimos em plataformas via redes sociais, como whatsapp, por exemplo.

Comumente os documentos como o suposto contrato de empréstimo apresentados nos feitos judiciais demonstram que eles foram celebrados com terceiro alheio à lide, que utiliza apenas o nome de algum banco conhecido. Isso porque os bancos processados sequer são parte do Contrato indicado pelos Consumidores e nunca celebraram ou intermediaram qualquer espécie de negociação.

Ademais, a própria jurisprudência vem acatando o fato de que os consumidores não podem se eximir de suas responsabilidades de atenção e análise de documentos que serão assinados quando da solicitação de um empréstimo, o que é esperado do dito "homem médio", a cautela mínima que se espera de uma pessoa comum, especialmente que o contratante esteja atento ao nome empresarial da instituição com a qual pretende contratar, além de seu CNPJ, endereço, telefone para contato e e-mail devidamente registrado no endereço eletrônico do respectivo Banco.

Nesse sentido entendeu o magistrado da 5ª Vara de Palmas/TO, ao julgar improcedente o feito de número 004528-86.2019.8.27.2729, ponderando que, para a existência do dever reparatório é necessário restar configurado o nexo de causalidade entre o fato, o dano e a culpa do agente, o que não ocorreu no caso daqueles autos, não cabendo se falar na responsabilização do Banco acionado.

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A 5ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis Estado do Paraná também vem sedimentando seu entendimento, conforme decisão exarada no Recurso Inominado de número 0000683-65.2019.8.16.0029, o qual trouxe em seu bojo que, não há que se falar em responsabilidade pelo risco do negócio bancário, porquanto a instituição demandada naquele feito em momento algum participou da relação jurídica descrita nos autos, não se tratando de falha na prestação do seu serviço. Não obstante, o contrato fraudulento objeto daqueles autos foi celebrado por meio não oficial, ou seja, através de um site acessado pelo consumidor através de buscas particulares pela internet.

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O Tribunal de Justiça de São Paulo já possui inúmeros julgados que destacam a ausência de responsabilidade das instituições financeiras diante de culpa exclusiva do consumidor, ressaltando que a Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça não se aplica a casos em que não houve falha da instituição financeira. Isto porque, o prejuízo decorre de atitude individual e descuidada do próprio consumidor.

Desta feita, há de se ponderar que cabe aos consumidores o dever de zelar pela segurança de seus dados e da regularidade dos negócios jurídicos por eles celebrados de modo a evitar que sejam vítimas de fraudes, estelionato e demais atos praticados por criminosos.

Não obstante, como forma de alertar os consumidores, diversas notícias vêm sendo disseminadas acerca de Fintechs fraudulentas que estão cada vez mais disseminadas nos últimos dois anos, eis que o aumento de fraudes é evidente diante da situação econômica crítica em que a sociedade brasileira se encontra.

A SERASA também indica em sua página eletrônica quais as cautelas a serem adotadas para a celebração de contratos, prática essa que também é adotada pelas instituições idôneas e pelos órgãos de proteção ao consumidor. Ou seja, é de conhecimento público e notório que os consumidores devem ser cautelosos ao celebrarem negócios jurídicos, principalmente se envolvem antecipação de valores e se são realizados fora do estabelecimento comercial.

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Os próprios Bancos têm tido cautelas similares, a partir do momento em que sabem que há falsários se valendo de seus nomes na praça, valendo sempre checar as informações da contratante antes de celebrar contratos, especialmente não presenciais.

O que se percebe é que, com o aumento da tecnologia e facilidade em solicitação de empréstimos, os consumidores devem se atentar, pois a tendência é a de cada vez mais os Bancos e Instituições Financeiras terem minimizada sua responsabilidade frente a danos causados pela falta de atenção das pessoas que buscam negociações bancárias pela via digital.

*Vanessa Salem Eid é advogada com atuação em Direito Civil e Bancário do escritório Rayes & Fagundes Advogados Associados. 

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