Aos 52 anos, a dona de casa Francisca Wanda de Oliveira recebeu autorização da Justiça para obter a certidão de nascimento. Nascida em Santa Maria de Suacuí, no Vale do Rio Doce, ela precisou do documento pela primeira vez para tomar a vacina contra a covid-19.
Como a falta da certidão de nascimento trava a emissão de qualquer outro documento, como RG e CPF, aqueles que não têm acesso ao registro sequer são consideradas cidadãos pelo governo. É o caso de Francisca, que cresceu na roça, nunca se matriculou na escola, jamais teve acesso a benefícios sociais ou votou numa eleição.
No início da pandemia, ao procurar o posto de saúde na Vila Pinho, no Barreiro, região sudoeste de Belo Horizonte, a dona de casa saiu sem receber o imunizante contra o coronavírus. O caso, no entanto, foi encaminhado pela assistente social e a agente comunitária da unidade ao Cartório do Barreiro.
A juíza Maria Luiza Rangel Pires, da Vara de Registros Públicos de Belo Horizonte, foi quem autorizou a emissão da certidão quando o pedido chegou à Justiça. "É preciso ter esse olhar humanizado para efetivamente resolvermos a situação de cada cidadão", afirma.
As certidões de nascimento tardias não são raras no Brasil, sobretudo entre pessoas que passaram a vida em situação de rua ou que nasceram no interior, distante dos cartórios.
Para autorizar o registro, a Justiça precisa fazer uma série de diligências para evitar fraudes ou uma dupla emissão. De início, é preciso uma busca detalhada em diversos cartórios da região onde a pessoa nasceu.
"O problema é que essas pessoas quando precisam do documento de identificação é em situações urgentes, como uma internação em hospital, para se aposentar ou receber um benefício social", analisa a juíza.