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União não pode bloquear unilateralmente bens de devedores, decide STF

Para a maioria dos ministros do STF, a medida exige uma decisão judicial e não pode ser tomada unilateralmente pelo governo

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Por Rafael Moraes Moura/ BRASÍLIA
Atualização:

O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux. Foto: Dida Sampaio / Estadão

Em uma derrota para o governo, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira (9), por 7 a 4, que a União não pode bloquear unilateralmente bens de contribuintes devedores para garantir o pagamento de débitos. A medida entrou em vigor no País em janeiro de 2018, quando o então presidente Michel Temer instituiu o Programa de Regularização Tributária Rural (PRR). Na prática, o entendimento da Suprema Corte enfraquece os poderes da União na cobrança de dívidas: para a maioria dos ministros, o bloqueio de bens exige uma decisão judicial.

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Segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), a medida busca tornar mais eficiente o modelo de cobrança de dívidas e descongestionar o número de processos que inundam o Poder Judiciário. Os novos mecanismos de cobrança permitiram uma redução de 70% na quantidade de execuções fiscais ajuizadas e um aumento da arrecadação da dívida ativa, informou a PGFN à reportagem.

"Não se pode imputar ao contribuinte as mazelas do processo fiscal e a própria ineficiência do Judiciário, admitindo que se faça uma incursão arbitrária sobre o seu patrimônio, sobretudo impedindo-o de dispor livremente de seus bens", afirmou o ministro Ricardo Lewandowski.

Na avaliação do ministro Edson Fachin, o procedimento de bloqueio unilateral de bens pela Fazenda Pública traz "inovação que rompe com o histórico sistema de cobrança da dívida ativa da União".

"O Estado não pode valer-se de meios indiretos de coerção, convertendo- os em instrumentos de acertamento da relação tributária, para, em função deles - e mediante interdição ou grave restrição ao exercício da atividade empresarial, econômica ou profissional - constranger o contribuinte a adimplir obrigações fiscais eventualmente em atraso", disse Fachin.

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O Registro de Imóveis existe para garantir a propriedade do titular do bem e para proteger terceiros relativamente à situação do imóvel. Pela lei, se o proprietário, sendo devedor da Fazenda Pública por dívida ativa devidamente inscrita, vender o imóvel a um terceiro, essa venda pode ser anulada.

Prevaleceu no Supremo o entendimento de que a indisponibilidade  - isto é, a proibição de que o proprietário venda --é uma restrição que deve ser imposta pela Justiça, não unilateralmente pela Fazenda Nacional. Mesmo assim, o Supremo entendeu que é legítimo que seja informada a existência da dívida - ou seja, o comprador vai saber que aquele bem pode ser utilizado numa possível execução fiscal contra o antigo dono. Ou seja: ele vai saber o risco que está correndo.

"Considero válida a averbação, mas inconstitucional a indisponibilidade dos bens automática por ato administrativo, entendendo que, como regra, ela há de exigir a intervenção do Poder Judiciário", frisou o ministro Luís Roberto Barroso.

Além de Lewandowski, Fachin e Barroso, se posicionaram contra o bloqueio de bens por decisão unilateral da Fazenda Nacional os ministros Nunes Marques, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes e o presidente do STF, Luiz Fux.

Já os ministros Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Rosa Weber e Cármen Lúcia ficaram a favor da medida.  "Não se trata de embate de Estado e indivíduo. Esse dinheiro devido é dinheiro da sociedade, é dinheiro que vai retornar aos cofres públicos não para ficar guardado, mas para possibilitar o impulsionamento de políticas públicas, na área da educação, da segurança", afirmou Moraes.

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Julgamento. As ações julgadas pelo STF foram movidas pelo PSB, pela Associação Brasileira de Atacadistas e Distribuidores de Produtos Industrializados (Abad) e as confederações da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), da Indústria (CNI), do Transporte (CNT) e pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

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"Apesar de manter considerável obstáculo para os devedores da Fazenda Pública, o Supremo Tribunal Federal freou os poderes da União na cobrança de dívidas, exigindo que medidas constritivas do direito fundamental à propriedade passem pelo necessário crivo judicial, em respeito aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa", avaliou o advogado Felipe Corrêa, que atuou para o PSB no caso.

Para a advogada tributarista Mírian Lavocat, o bloqueio de bens por decisão unilateral do governo é inconstitucional. "O que eu vejo é que a Fazenda Nacional está procurando constranger o contribuinte para que seja feito o pagamento do tributo, ao invés de propriamente mover as ações necessárias. Essa prática da Fazenda Nacional traz um grande prejuízo aos contribuintes e, obviamente, é inconstitucional. "

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