Os ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia proferiram decisões suspendendo duas reintegrações de posse que iriam afetar mais de mil pessoas em situação de vulnerabilidade econômica e social, cada, nos Estados de Pernambuco e Rondônia. Ambos os ministros consideraram que as ordens de reintegração de posse afrontaram decisão do Supremo que suspendeu a desocupação de áreas coletivas habitadas antes da pandemia da covid-19.
O despacho de Cármen Lúcia derrubou decisão da 7ª Vara Cível de Porto Velho com relação aos imóveis rurais "Fazenda Norbrasil" e "Gleba Arco-Íris", onde mais de mil agricultores em condição de vulnerabilidade socioeconômica, incluindo 10 famílias indígenas da etnia Oro Waran, ocupam o acampamento Tiago Campin do Santos.
Já a decisão proferida por Fachin diz respeito a uma área no Recife (PE) ocupada por cerca de 200 famílias em situação de vulnerabilidade econômica e social integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). A ordem derrubada pelo ministro do STF foi deferida pela 30ª Vara Cível da capital pernambucana, a pedido da empresa Anbar Participações Ltda., que alega ser proprietária do terreno situado no bairro de Boa Viagem.
No caso relatado por Cármen Lúcia, a ministra avaliou que os documentos juntados aos autos revela 'situação de extrema gravidade social' em razão de 'quadro de conflituosidade na região a sugerir aparente animosidade entre autoridades policiais locais e habitantes do acampamento Tiago Campin, aliado a violência empregada na reintegração ocorrida no local há um ano'.
De acordo com a ministra, tais fatores, 'são indicativos do risco de que a desocupação dos imóveis possa se desenvolver com uso de violência a afligir não apenas a população vulnerável, mas também agentes públicos, com consequências desastrosas humana e socialmente'.
Para Cármen Lúcia, mesmo se tratando de ocupação irregular reincidente, ocorrida após o início da pandemia, não há indicação de que estejam sendo adotadas medidas para assegurar moradia adequada à população vulnerável nem que os desalojados estejam sendo conduzidos a abrigos públicos, para preservar sua saúde e sua incolumidade física, psicológica e social. Tal situação, na avaliação da ministra, justifica a suspensão cautelar da ordem de reintegração.
A mesma condição imposta pelo STF para reintegração de posse de áreas ocupadas após o início da pandemia - de que elas só poderão ser desfeitas se a população vulnerável for conduzida a abrigos públicos ou tiver assegurada outra forma de moradia adequada - ocupou papel central na decisão dada por Fachin.
O ministro atendeu um pedido da Defensoria Pública do Estado de Pernambuco, que questionava decisão do juízo da 30ª Vara Cível do Recife que determinou a desocupação voluntária e integral de área localizada em Pernambuco em 15 dias. Segundo a Defensoria, o prazo terminou no último dia 21, sem que o Tribunal de Justiça de Pernambuco tenha julgado recurso contra a decisão. Assim, o local estava em vias de sofrer desocupação forçada, com o apoio de força policial.
A reclamação sustentava que o cumprimento da ordem implicaria a remoção de mais de uma centena de núcleos familiares, formados por mulheres, crianças e trabalhadores informais de uma área subutilizada há anos, sem oferecimento de soluções ou alternativas habitacionais adequadas.
Em sua decisão, o ministro Fachin considerou que a análise preliminar da situação narrada indica, com razoável grau de certeza, que não foi cumprida a condição estabelecida pelo STF para reintegração de posse de áreas ocupadas após o início da pandemia. O ministro ainda considerou 'inegável' o risco da demora na avaliação do caso, 'seja pela condição de vulnerabilidade da população, seja por sua extensão, seja pela irreversibilidade das medidas atacadas'.