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Execução Penal ou Diarreia Prisional?

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Por Rodrigo Merli Antunes
Atualização:
Rodrigo Merli Antunes. Foto: FELIPE RAU/ESTADÃO

Após quase 15 anos atuando na Justiça Criminal brasileira, especialmente com delitos dolosos contra a vida, sinto dizer que estou cada vez mais desanimado com os rumos de nossa Nação. Aliás, nem sei dizer por qual motivo ainda não desisti de tudo e fui trabalhar com outra coisa. Talvez seja teimosia, ou até mesmo ignorância. Sei lá! Só sei que não aguento mais ver homicidas, assaltantes, traficantes e corruptos recebendo todos os dias algum benefício legal existente em nossa permissiva legislação. Essa semana tivemos mais um exemplo disso, ou melhor, mais uma agraciada com essas excrescências jurídicas só existentes em terras tupiniquins: Ana Carolina Jatobá.

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Mesmo condenada há mais de 26 anos de reclusão pela morte da enteada Isabella Nardoni, é certo que, com pouco mais de 09 anos de cadeia, já foi ela agraciada com uma progressão de regime. A partir de agora, poderá sair da prisão por 05 semanas ao ano, poderá cursar uma faculdade, um curso profissionalizante qualquer ou até mesmo trabalhar de dia e se recolher ao cárcere de noite, isso se não permitirem desde logo que ela durma não na prisão, mas sim em sua própria casa. É o chamado regime semiaberto, cujo nome mais apropriado seria "sempre aberto".

São tantas as regalias de nossos presos que as pessoas de bem já começam a se questionar se vale a pena ser honesto no Brasil. Primeiro que já é difícil por demais alguém ser condenado criminalmente por aqui. Só para se ter uma ideia, nossa cifra negra da criminalidade gira em torno de 92 por cento. Isso significa que apenas 8 por cento dos delitos praticados em território nacional são efetivamente elucidados. E, dentro desse número desprezível, mesmo quando os delinquentes são processados e condenados, recebem eles uma gama tão grande de benefícios que o efeito intimidatório e repressivo é praticamente nulo. Às vezes eu me sinto um verdadeiro idiota ao me apresentar como um Promotor de Justiça.

Tenho vergonha de dizer que as leis de meu país, e pelas quais eu luto, consideram isso daí como um efetivo exemplo de justiça para a sociedade. Os presos no Brasil possuem direito a tantas coisas que até parecem heróis nacionais. Aliás, devem ser mesmo! Ora, se atualmente as pessoas estão até mesmo tirando selfies com o goleiro Bruno e também com a tal da Suzane Von Richtofen (ambos a já darem seus passeios por aí), por óbvio não irão se incomodar com os inúmeros benefícios legais que são concedidos a todos os sentenciados brasileiros (detração penal, remição de pena, saída temporária, progressão de regime, livramento condicional, indulto, comutação, prisão domiciliar, trabalho externo, visita íntima, indenização por superlotação etc).

Por aqui é assim: ao invés de nossos legisladores prestigiarem os verdadeiros heróis nacionais (policiais e demais cidadãos que prezam pela lei, pela ordem, pela autoridade, pela disciplina e pela hierarquia), preferem eles adotar um sistema permissivo e nocivo, este pautado na ideia revolucionária e anárquica de que o desencarceramento é o remédio para todos os males brasileiros. Para esse grupo de desavisados, a polícia e a Justiça Criminal são aparatos opressores e a serviço da burguesia, a qual, na visão esquizofrênica que possuem, só quer explorar e maltratar cada vez mais os "menos favorecidos".

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Entretanto, ouso dizer exatamente o contrário. Menos favorecidos somos nós, homens e mulheres de bem, independentemente da cor ou da classe social, e que sofremos diuturnamente com a corrupção e com a violência rural e urbana que assolam nosso país. Se a repressão e o Direito Penal não são tão bons assim, pior ainda é ficar sem eles!

Na realidade, esses tais especialistas não sabem de nada. Hoje em dia temos muitas testas oleosas querendo se passar por mentes brilhantes. Se o cárcere não representa a invenção da roda ou a solução para todos os males, ao menos é aquilo que temos para hoje. Ao contrário do que se propaga por aí, o Brasil não prende muito e de forma equivocada e desenfreada. Meu colega de Ministério Público Militar (Adriano Alves Marreiros) é quem está coberto de razão ao ironizar com esse tema: Diz ele que, "Na verdade, o Brasil está ficando igual disenteria. Prende pouco e solta mal, aliás, muito mal". E estão aí os políticos corruptos e os assassinos famosos que não lhe deixam mentir, em especial a madrasta acima referida, que bem poderia fazer uma ponta nos filmes da Cinderela ou da Branca de Neve. Certamente ela tem talento para tanto!

*Rodrigo Merli Antunes Promotor de Justiça do Tribunal do Júri de Guarulhos - SP Especialista em Direito Processual Penal pela Escola Paulista da Magistratura Coautor do livro O Tribunal do Júri na visão do Juiz, do Promotor e do Advogado

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