A julgar pelo cenário econômico cada vez mais incerto que se desenha para os próximos meses, o segundo semestre deve concentrar ainda mais pedidos de recuperação judicial. Isso porque muitas empresas ainda têm dificuldade para vislumbrar o real impacto da quarentena em sua operação, dificultando a determinação do foco da reestruturação necessária.
A recuperação judicial é um eficiente recurso muito utilizado para alongamento do passivo. Comum em momentos de recessão econômica, como este, é um instrumento que traz a possibilidade de reestruturação de empresas endividadas, que ganham um novo fôlego para pagamento de credores.
É claro que cada realidade empresarial demandará medidas personalizadas visando a recuperação completa da organização. Porém, em linhas gerais, algumas práticas tornam-se fundamentais para que a recuperação tenha início e mantenha-se de forma efetiva, evidenciando os resultados necessários para a manutenção do negócio.
Quando a empresa entra na fase do "stay period", após o difererimento do pedido de recuperação judicial, a lição de casa na gestão precisa ser feita. É necessário organizar a empresa de forma eficiente e otimizada, identificando produtos não-rentáveis, custos sem benefício e reduzir despesas fixas. A ideia é que se fortaleça o negócio para prepará-lo para desafios futuros, que vão desde demandas do mercado até o pagamento de dívidas alongadas, mantendo e aumentando o EBITDA.
Também é fundamental ir a campo e explicar a fornecedores e clientes o objetivo da recuperação judicial como ferramenta de alongamento do passivo. Esta comunicação clara mostrará que somente com a continuidade do relacionamento comercial será possível gerar novos negócios, reforçando a possibilidade de recebimento de valores retidos no plano.
Esta comunicação fundamental estende-se a outras partes envolvidas no processo, como colaboradores e sindicatos, com o objetivo de tranquilizá-los e buscar apoio para a evolução do projeto. A transparência e o pragmatismo são a chave para o sucesso em todas as fases de recuperação que se seguem.
A revisão da estratégia tributária também se faz necessária, assim como a adesão a planos de financiamento de longo prazo, para que se tenha controle sobre a dívida, evitando-se a execução e a penhora de bens de produção ou instalações. Sempre que possível, torna-se essencial capitalizar a empresa via aporte de sócios, com a venda de ativos para formação de capital próprio, reduzindo as altas taxas de financiamento de mercado.
Todas essas melhorias precisarão ser preservadas após a aprovação do plano de recuperação judicial. A controladoria precisará projetar um orçamento empresarial de médio prazo, capaz de assumir os fluxos de caixa advindos da amortização do pagamento da recuperação. A estruturação do capital de giro também deve estar planejada e não depender em sua totalidade de terceiros, o que traria um risco constante ao projeto.
Em linhas gerais, ajustáveis à realidade particupar de cada empresa, uma recuperação judicial bem sucedida precisa contar com o apoio dos acionistas e manter, acima de tudo, a viabilidade econômica do projeto. Embora seja um recurso para ganhar tempo para a reestruturação interna, a recuperação judicial precisa trazer lições que sejam enraizadas de forma perene, não apenas para reerguer, mas para fortalecer o negócio.
*Ricardo Vastella é Diretor Sênior de Reestruturação da Naxentia