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Estamos prontos para o IPO?

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Por André Camargo e Alexei Bonamin
Atualização:
André Camargo e Alexei Bonamin. FOTOS: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Dentre os temas mais discutidos em 2021, podemos citar 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP26) questões ESG (environmental, social, and governance) e IPO (initial public offering; em português, oferta pública inicial). Assuntos complexos, com diferentes pontos de vista e que demandam reflexões amplas e multidisciplinares. Quanto à última temática, muitas vezes tratada somente com o viés financeiro, vale relembrar muitos casos recentes de sucesso, mas, curiosamente, de adiamentos, cancelamentos e fracassos em curto espaço de tempo. O ingresso no mercado de capitais tem sido um enorme desafio para inúmeras organizações. Neste artigo, com base em nossa experiência profissional e em diversas discussões acadêmicas e com organismos nacionais e internacionais especializados, buscamos endereçar o seguinte questionamento: estamos prontos para o IPO?

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Essa discussão possui, dentre outras, ao menos quatro perspectivas distintas: estrutural, procedimental, pessoal e cultural. O processo de abertura de capital deve ser precedido de uma análise prévia (assessment material e formal) para que se levantem os pontos de atenção relevantes para essa "jornada", com a elaboração de um plano de ação e de um cronograma realistas. Trata-se de um processo responsável, transformador, de amadurecimento institucional, de crescimento de todos os envolvidos e de profissionalização, razão pela qual seu planejamento é fundamental para potencializar as chances de êxito. Frentes societária, de compliance e de mercado de capitais precisam ser formadas. Um detalhado planejamento tributário, ainda mais em tempos de reformas legislativas que se avizinham, é imprescindível nesse momento. Uma preparação prévia é fundamental como primeiro passo.

Muitos nos questionam sobre os erros mais comuns que podem ser evitados nessa jornada, que demanda mudanças no tipo societário (normalmente de sociedade limitada para sociedade anônima, relevante mudança estrutural, rotinas e custos fixos), na forma pela qual a nova S/A irá se comunicar com o mercado, na forma das decisões que serão agora tomadas e publicizadas (Conselhos de Administração e Fiscal fortes e bem estruturados surgem como novos mecanismos de governança corporativa), além de novos assessores e profissionais de auditoria, passando a rever números e processos internos. Será que tratamos bem as transações entre partes relacionadas formais ou informais que temos neste momento, afinal elas serão agora altamente visíveis pelo mercado, indicando como tratamos, por exemplo, do tema conflito de interesses? Será que temos estrutura de gestão adequada para lidar com informação privilegiada (ou seja, aquela caracterizada como fato relevante, porém, não divulgada ao mercado)? Será que temos um bom time neste projeto, incluindo nossa equipe de assessores jurídicos e não jurídicos? Meu foco é só na parte financeira ou também enxergo mais além, no longo prazo? Como posso ir além da legalidade, até porque teremos que cumprir inúmeras novas regras regulatórias e autorregulatórias, para buscar a legitimidade dos meus atuais e futuros stakeholders? Como alinhar a estratégia corporativa com questões ESG e propósito socioambiental e climático positivo?

Dentre todos os erros comuns que enxergamos o mais crítico é não tratar o passado e o presente da organização antes de trilhar o destino do mercado de capitais. Contas dos administradores não aprovadas, estrutura e relações societárias desprotegidas, sistema de compliance inexistente ou ainda imaturo, processos, regras e políticas internas ainda em construção. Será que conseguimos expandir a nossa "casa" sem antes fortalecermos os seus pilares e sua estrutura? Temos os profissionais adequados, devidamente incentivados para tal projeto? E como está a minha cultura organizacional: temos pontos ainda a percorrer, ainda que simultaneamente ao processo de abertura de capital? Treinamos, engajamos e calendarizamos projetos, até os menos ambiciosos do que este, que certamente mudará significativamente a nossa organização e, por que não, o patamar dos nossos profissionais?

Estamos prontos para o IPO? Trata-se de uma decisão relevante, que demanda planejamento e reflexões não triviais. Planejamento, calendarização, faseamento, boa assessoria e trabalhar os pilares estrutural, procedimental, pessoal e cultural são requisitos necessários, mas não suficientes. Talvez sejam os elementos sob nosso controle nesse processo. Questões políticas, sanitárias, setoriais e de mercado são muitas vezes incontroláveis, apesar de mitigáveis jurídica e financeiramente. A boa preparação para qualquer grande projeto é fundamental em tempos de incerteza, complexidade e multidisciplinaridade. Dizem que a sorte sorri para quem está no lugar certo e na hora certa, mas sempre preparado para abraçar a boa oportunidade que está pela frente.

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*André Camargo e Alexei Bonamin, sócios de TozziniFreire Advogados, integrantes do grupo ESG do escritório. André Camargo, área societária, com foco em governança corporativa e M&A. Alexei Bonamin, área de mercados financeiro e de capitais

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