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Especialistas preveem aumento dos acordos de delação

Penalistas e constitucionalistas analisam decisão do Supremo que autoriza delegados a fecharem negociação com investigados

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Foto do author Luiz Vassallo
Por Julia Affonso e Luiz Vassallo
Atualização:

 Foto: Nelson Jr./SCO/STF

O Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quarta-feira, 20, que a Polícia Federal e as Polícias Civis dos Estados podem negociar e celebrar acordos de delação premiada, mesmo sem o aval do Ministério Público. O julgamento foi em relação a uma ação da Procuradoria-Geral da República que contestava a possibilidade de delegados firmarem esses tipos de colaboração. A palavra final sobre a homologação segue sendo do juiz.

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Na avaliação de Daniel Gerber, criminalista e professor de Direito Penal e Processual Penal, 'a possibilidade de acordo com os delegados é legal, necessária, e muitas vezes de maior produtividade e transparência do que aqueles firmados com o Ministério Público'.

"Isso porque, além de serem eles os que verdadeiramente conhecem os detalhes da investigação, dos procedimentos de colheita de provas e dos hiatos a serem preenchidos pelo colaborador, são também a classe mais distante das influências políticas e administrativas que podem interferir em tais negociações", afirma Gerber.

Segundo Alexandre Ribeiro Filho, do Vilardi Advogados, a decisão de hoje já era prevista. "O Supremo confirmou hoje o que já se esperava, ou seja, a possibilidade de a polícia firmar acordos de delação premiada. A tendência, portanto, é de que o número de delações aumente. Espera-se que o Poder Judiciário aprecie com cautela os acordos vindouros e só aceite aqueles que efetivamente forem cabíveis, pertinentes e necessários."

Daniel Bialski, criminalista e sócio do Bialski Advogados, também elogiou o resultado do julgamento. "Acredito ser salutar essa declaração da Suprema Corte, já que a inexistência de comando único para oferta e a aceitação de delações torna o procedimento mais transparente. Realmente não havia razão para esse impedimento, já que as autoridades policiais também têm amplo e total conhecimento das causas e investigações, devendo ser ressaltado que em qualquer hipótese o referendo do Poder Judiciário é necessário, o que atende os anseios da lei e o próprio princípio do devido processo legal."

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Vera Chemim, advogada constitucionalista, enaltece a decisão do Supremo, mas alerta que a decisão final ainda caberá ao juiz. "Independentemente dos conflitos existentes entre a Polícia Judiciária e o Ministério Público, o acordo de colaboração premiada deve ser formalizado pela polícia, na fase de inquérito, com a manifestação e cooperação do Ministério Público. Sendo assim, a decisão do Plenário do STF mantém a permissão legal para que a polícia possa formalizar acordo de colaboração premiada, com a concordância ou não do Ministério Público, até porque, caberá ao magistrado, a decisão final sobre aquele acordo (no que diz respeito a sua regularidade, voluntariedade e legalidade) e a sua homologação".

Na opinião de João Paulo Martinelli, criminalista e professor de direito penal do IDP-São Paulo, o STF contrariou o entendimento do MPF. "As diretrizes editadas pelo MPF para a elaboração de colaboração premiada afirmam que há exclusividade para o Ministério Público celebrar o acordo e a polícia poderá auxiliar ou colaborar. Ou seja, a decisão do STF contraria o entendimento do MPF. A lei das organizações criminosas, que regulamentou os acordos de colaboração premiada, permite aos delegados de polícia firmarem o acordo de colaboração, porém, os benefícios concedidos precisam de manifestação do Ministério Público, que é o titular da ação penal."

Nathalia Rocha, especialista em Direito Penal Econômico, sócia do escritório Chenut Oliveira Santiago Sociedade de Advogados, acredita que o instituto da delação premiada poderá ser 'banalizado' a partir de agora.

"No nosso sistema processual penal, acusatório, cada agente tem seu papel predefinido. O juiz, imparcial, julga. O Ministério Público, parcial, acusa. À Polícia Judiciária cumpre a investigação comprometida com a reconstrução dos fatos. Em tempos de Lava Jato esses papéis têm se misturado e as consequências se apresentam indeléveis. Fato é que ao alterar esse importante equilíbrio processual, corre-se o risco de banalizar esse importante instituto", diz Nathalia Richa.

Para Luciano Santoro, sócio do Fincatti Santoro Sociedade de Advogados, 'a decisão do STF vem em consonância com a Lei n. 12.850/2013, que já resguardava a competência da autoridade policial para negociar e celebrar acordos de colaboração premiada, o que não implica, de forma alguma, em perda de atribuição ou limitação de competência da autoridade do Ministério Público'.

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Gustavo Henrique D. Paniza, advogado do departamento de Direito Penal Empresarial do Braga Nascimento e Zilio Advogados, também não vê perda de poder do MPF com a decisão de hoje.

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"A decisão do STF não fere a Constituição Federal ou a Legislação Extravagante que versa sobre o tema, vez que apenas confere à autoridade policial federal uma maior autonomia, no momento da negociação da delação premiada com o acusado, pois não mais se vincula à anuência do Ministério Público Federal, para o referido ato", assinala Paniza.

"Desta forma, a atuação da Polícia Federal se torna mais célere e efetiva, quanto à colheita de provas acerca dos ilícitos cometidos, características imprescindíveis à atividade de polícia judiciária. Vale ressaltar que esta mudança em nenhum momento retira do Ministério Público Federal as atribuições de seus membros, de forma que todo acordo firmado entre a autoridade policial e os investigados continuará passando pela análise do juiz competente, podendo ser homologado ou não", completa Paniza.

Adib Abdouni, advogado criminalista e constitucionalista, segue a mesma linha de raciocínio. "O que o STF definiu é que autoridade policial tem legitimidade para negociar o acordo (como meio de obtenção de provas), inclusive para fins de pré-validação dos elementos fornecidos pelo colaborador, sem que isso implique em usurpação da competência do Ministério Público enquanto titular da ação penal ou dispensa de manifestação sobre seu conteúdo pelo órgão acusador."

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