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ESG como oportunidade de investimento no Brasil

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Por Luiz Felipe Amaral Calabró e Larissa Campos Machado
Atualização:
Luiz Felipe Amaral Calabró e Larissa Campos Machado. Fotos: Divulgação  

A crescente consideração de fatores ambientais, de governança e sociais (em inglês environmental, social and governance ou, simplesmente, "ESG") nas decisões de investimento tornou-se uma tendência global entre investidores, gestores e demais atores do mercado. No Brasil também se tem presenciado um crescente movimento em direção à auto-regulamentação em empresas de capital aberto, a fim de alinhar sua governança corporativa, incluindo divulgação de informações relevantes ao mercado, com padrões internacionais que garantam maior transparência, clareza e precisão para os investidores.

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A B3, responsável pela bolsa de valores brasileira, desenvolveu o Índice de Sustentabilidade Empresarial - ISE para medir o desempenho médio das ações de empresas que se comprometem a adotar políticas sustentáveis. O ISE compreende atualmente ações de 30 empresas que somam R$1,64 trilhões em valor de mercado. Curiosamente, desde sua criação em 2005 até 2019, o desempenho acumulado do ISE é melhor do que o desempenho do Ibovespa. O Índice de Ações de Governança Corporativa - ICG, que mede o desempenho das ações de empresas que adotam um nível mais elevado de padrões de governança corporativa, também indica que referido índice tem superado o benchmark. A B3 possui ainda o Índice de Carbono Eficiente - ICO2, índice criado em parceria com o BNDES, que leva em consideração o grau de emissões GEE das empresas que aceitaram participar do indicador; e o novíssimo S&P/B3 Brazil ESG, criado em conjunto com a S&P Dow Jones, a fim de promover companhias que apresentarem melhores avaliações ESG. 

O setor público também demonstrou preocupação em tratar de questões de sustentabilidade. A Lei das Estatais obriga empresas públicas e empresas de economia mista a preparem relatórios de sustentabilidade ou relatórios integrados; no mesmo sentido, a Diretriz Normativa n. 170 do Tribunal de Contas da União exige a apresentação de relatório integrado por todos os órgãos e entidades da administração direta e indireta. O relatório integrado, utilizado em muitas outras jurisdições, resume os insumos e atividades adotados na produção de bens e serviços por meio da utilização de taxonomia coerente, clara, rastreável, abrangente, auditável e útil relacionada a fatores ESG. A lógica do relatório integrado é apresentar aos investidores dados que lhes permitam verificar os efeitos da adoção de critérios ESG na receita e nos custos da empresa, bem como na redução de externalidades negativas e no aprimoramento das externalidades positivas ao longo dos anos. Isto leva a investimentos responsáveis que tendem a ser muito valorizados por investidores e consumidores.

Com exceção de instituições financeiras, que devem divulgar suas políticas sociais e ambientais de acordo com uma resolução emitida pelo Conselho Monetário Nacional, a Comissão Brasileira de Valores Mobiliários (CVM) exige que as empresas de capital aberto informem apenas suas práticas e estrutura de governança corporativa, bem como informem se divulgam informações socioambientais e qual a exposição a riscos sociais e ambientais relacionados às suas atividades. Portanto, a divulgação de informações relacionadas a estratégias e políticas de ESG por empresas não financeiras listadas em bolsa é inteiramente voluntário.

Ainda assim, administradores de companhias listadas na bolsa têm levado em conta fatores dos ESG e adotado relatórios integrados de acordo com a estrutura da Global Reporting Initiative (GRI) e da International Integrated Reporting Council (IIRC), a fim de atrair investidores estrangeiros e institucionais.

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Associações formadas por agentes do mercado financeiro, como a Associação Brasileira de Mercados Financeiros e de Capitais ("Anbima"), prepararam códigos de melhores práticas não vinculativos recomendando que os gestores de ativos e investidores institucionais analisem fatores ESG relevantes a fim de cumprir suas obrigações fiduciárias. De acordo com uma pesquisa da Anbima de 2018, 48,54% dos gestores de ativos e fundos declararam ter algum tipo de política de ESG e declararam que a estratégia preferida de investimento ESG é a best in class, na qual é criado um ranking estabelecendo os melhores setores ou projetos para receber investimentos de acordo com um critério ESG previamente escolhido.

Independentemente de posições recentes assumidas pelo governo brasileiro, as empresas estão, mais do que nunca, interessadas em manter uma imagem corporativa alinhada com uma agenda sustentável, uma vez que bancos, investidores estrangeiros e outros financiadores de capital vem aumentando a pressão por metas sustentáveis. Os três maiores bancos privados do Brasil, por exemplo, declararam recentemente que deixarão de financiar empresas que não se comprometam com a preservação da floresta amazônica.

Embora não existam normas específicas sobre a adoção de critérios ESG até o momento, o ordenamento jurídico já está equipado com regras gerais que permitem e encorajam as empresas, gestores e fundos de investimentos analisarem referidos critérios em suas decisões de investimento.

As disposições da Lei das Sociedades Anônimas podem ser interpretadas de tal forma a entender que as companhias devem observar fatores ESG no processo de tomada de decisões. A Lei das Sociedades Anônimas exige que o acionista controlador utilize seu poder de controle para fazer com que a companhias realizem seu objeto social e cumpram sua função social. Assim, as companhias têm que "cumprir sua função social" no exercício de suas atividades. Ou seja, as companhias são obrigadas a considerar outros interesses além dos interesses dos acionistas e da própria companhia, que podem incluir os interesses dos trabalhadores, consumidores, outras partes interessadas e da comunidade em geral.

O atual cenário é favorável para investimentos ESG. A integração de ESG e finanças contribui para um processo completo de análise do investimento que, ao considerar e analisar efetivamente os riscos envolvidos, tende a levar a um melhor desempenho a longo prazo.

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*Luiz Felipe Amaral Calabró, advogado com experiência no mercado de capitais. Professor Convidado no Insper, PUC-SP e FGV-SP. Doutor em Direito Comercial pela USP (2010). Consultor no escritório Levy & Salomão advogados

*Larissa Campos Machado, advogada com experiência nas áreas de Direito societário, fusões e aquisições e relações governamentais. Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Mestre em Direito Civil pela Universidade de São Paulo (USP) e MBA em Administração de Negócios pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP). Advogada no escritório Levy & Salomão advogados

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