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Entenda por que Marcelo Crivella está preso; Leia a decisão da Justiça que põe o prefeito do Rio no topo do 'QG da Propina'

Desembargadora Rosa Guita apontou a existência de esquema de corrupção dentro da Prefeitura envolvendo servidores, empresários e 'laranjas' que interferiam em licitações e em tomadas de decisões em troca de propinas

Por Paulo Roberto Netto
Atualização:

O prefeito do Rio de Janeiro Marcelo Crivella (Republicanos-RJ) foi afastado do cargo e preso nesta terça, 22, sob acusações de integrar 'intrincado esquema criminoso' para interferir em licitações para beneficiar empresários em troca de propina. As investigações começaram com a delação do doleiro Sérgio Mizrahy, que relatou como funcionava o 'QG da Propina' dentro da Prefeitura carioca.

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A prisão de Crivella foi determinada pela desembargadora Rosa Helena Penna Macedo Guita, e atingiu outras seis pessoas: o empresário Rafael Alves, o delegado aposentado José Fernando Moraes Alves, o ex-tesoureiro de Crivella Mauro Macedo, o ex-senador Eduardo Benedito Lopes (ainda não localizado e considerado foragido), Christiano Borges Sotckler Campos e Adenor Gonçalves.

Segundo a magistrada, o Ministério Público do Rio relatou a existência de esquema de corrupção dentro da Prefeitura envolvendo servidores, empresários e 'laranjas' que 'interfeririam nas tomadas de decisão, agilizando pagamentos a empresas específicas e interferindo nos processos de licitação' para beneficiar empresas que consentiam em pagar propinas a agentes públicos, como o homem de confiança do Prefeito Marcelo Crivella, Rafael Alves, que, por sua vez, contava com o doleiro Sérgio Mizrahy para 'branquear os valores recebidos'.

Na delação, Mizrahy afirma que o esquema criminoso teria se intensificado na campanha de Crivella à Prefeitura do Rio em 2016, ocasião em que Rafael Alves teria lhe solicitado contas bancárias para receber quantias em espécie a serem utilizadas na campanha.

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"Uma vez eleito, Marcelo Crivella, o denunciado Rafael Alves passou a ocupar uma sala na sede da Riotur, mesmo sem exercer qualquer cargo público, local onde o colaborador esteve por diversas vezes para lhe entregar valores em espécie provenientes das operações de troca de cheques mediante cobrança de 'taxa de serviço'", detalha a desembargadora. "Relatou ainda o colaborador Sérgio Mizrahy que Rafael Alves cobrava propina para autorizar o pagamento de faturas atrasadas a empresas credoras, destinando o percentual de 20% a 30% a Marcelo Alves, seu irmão, então presidente da Riotur, e outro percentual ao prefeito Marcelo Crivella".

Além das confissões, o doleiro entregou mensagens de WhatsApp trocadas com os envolvidos no esquema envolvendo a cobrança de recebimento de determinadas quantias em espécie a pedido do 'Zero Um', codinome atribuído a Crivella. Segundo a magistrada, as conversas entre investigadores demonstram a ciência e participação do prefeito no esquema de desvios.

"Algumas bem explícitas, sobre a 'roubalheira' no seu governo e a sobre a exigência de 'retorno financeiro' no 'investimento' que nele (leia-se, Crivella) havia sido feito", detalhou a magistrada. "Ora, em assim sendo, é evidente que o prefeito se locupletava dos ganhos ilícitos auferidos pela organização criminosa, que, na realidade, se instalara no município já com tal propósito, pois, do contrário, não colocaria o futuro político em risco apenas para favorecer terceiros, como mera 'dívida de campanha'.

O prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella. Foto: Gabriela Biló / Estadão

Para a desembargadora Rosa Guita, Rafael Alves, mesmo sem ocupar qualquer cargo na Prefeitura, 'influía diretamente nas mais variadas tomadas de decisões' de Crivella, incluindo na escolha de empresas para prestar serviços para a administração carioca.

"Tudo a firmar a imagem de que realmente era o homem de confiança do Prefeito Marcelo Crivella, de modo a sugerir que este não só anuía com os esquemas criminosos, mas deles também participava, chegando, inclusive, a assinar pessoalmente documentos a fim de viabilizar os negócios do grupo criminoso".

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Crivella foi detido em casa na manhã desta terça e levado à Cidade da Polícia, onde passará por exame de corpo de delito às 15h. No local, declarou à imprensa que é vítima de 'perseguição política' e disse que foi o governo que 'mais atuou contra a corrupção no Rio de Janeiro'.

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O Republicanos, partido do prefeito, divulgou nota afirmando que aguarda 'detalhes e os desdobramentos' da prisão. "O partido acredita na idoneidade de Crivella e vê com grande preocupação a judicialização da política", afirmou a legenda.

Investigações avançam, empresários confessam. As investigações contra Crivella avançaram em setembro, com buscas contra o prefeito e a apresentação voluntária de quatro empresários que decidiram fechar acordos de delação premiada: João Alberto Felippo Barreto, Ricardo Siqueira Rodrigues, Carlos Eduardo Rocha Leão e João Carlos Gonçalves Regalo.

João Felippo Barreto relatou à Promotoria que pagou propinas a Rafael Alves por meio de cheques emitidos por suas empresas, administradas por 'laranjas'. Segundo o Ministério Público do Rio, os repasses alcançaram a cifra de R$ 1,3 milhão entre julho de 2017 e janeiro de 2019.

"No ponto, este colaborador esclareceu que pagava 2% de propina sobre o valor de todas as faturas que viesse a receber do Tesouro Municipal, e relatou que, a partir do momento em que firmou o acordo com Rafael Alves, jamais teve problemas para receber os seus créditos", anotou a desembargadora.

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Os empresários João Carlos Gonçalves Regado e Carlos Eduardo Rocha Leão, do setor da saúde, afirmaram ao investigadores que pagavam 3% de propina sobre o que receberiam dos contratos firmados para a prestação de serviços da Prefeitura do Rio. Os repasses eram feitos mensalmente por contratos fictícios e notas frias, variavam entre R$ 1,5 milhão e R$ 2 milhões e foram registradas em planilhas levadas às autoridades.

"Ou seja, há nos autos prova documental em abundância apta a demonstrar a verossimilhança dos depoimentos prestados pelos colaboradores João Carlos Gonçalves Regado e Carlos Eduardo Rocha Leão", apontou a desembargadora.

O empresário Ricardo Siqueira Rodrigues confessou ter adiantado R$ 1 milhão em propinas à organização criminosa para 'adiantar' benefícios com a Prefeitura. O repasse ocorreu após encontro com Rafael Alves intermediado por Arthur Cesar Menezes Soares, o 'Rei Arthur', em 2016.

Em outro episódio, envolvendo a empresa Mktplus, é frisado que Crivella 'abdicou de sua usual cautela, tratando pessoalmente do pagamento dos créditos da citada empresa' e pressionou Paulo Messina, então chefe da Casa Civil da Prefeitura, a efetuar os repasses.

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