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Empreiteiros devem ficar afastados de empresas investigadas na Lava Jato, manda STF

Nove réus conseguiram habeas corpus; eles deverão usar tornozeleira eletrônica

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Por Redação
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Atualizada às 21h30

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Por Ricardo Brandt, Julia Affonso e Fausto Macedo

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu habeas corpus nesta terça-feira, 28, a nove réus acusados de envolvimento em no suposto esquema de desvio de corrupção e propina instalado na Petrobrás e desbaratado na Operação Lava Jato. Ricardo Pessoa (UTC), José Ricardo Nogueira Breghirolli (OAS), Agenor Franklin Magalhães Medeiros (OAS), Sérgio Cunha Mendes (Mendes Júnior), Gerson de Melo Almada (Engevix), Erton Medeiros Fonseca (Galvão Engenharia), João Ricardo Auler (Camargo Corrêa), José Aldemário Pinheiro Filho (OAS) e Mateus Coutinho de Sá Oliveira (OAS) terão a prisão preventiva substituída por medidas cautelares. Segundo o STF, eles devem se manter afastados da direção e administração de empresas envolvidas nas investigações.

 Foto: STF

Os réus citados no voto do ministro relator, Teori Zavascki, passarão a ser monitorados por tornozeleira eletrônica. Deverão ainda cumprir recolhimento domiciliar integral, comparecer em juízo quinzenalmente para informar e justificar atividades, ficarão obrigados a comparecer a todos os atos do processo, bem como estão proibidos de manter contato com demais investigados e de deixar o país. O descumprimento de qualquer dessas medidas acarretará o restabelecimento da prisão.

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Em seu voto, Zavascki citou os requisitos da prisão preventiva e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual o indício de existência de crime é argumento insuficiente para justificar, sozinho, a adoção da prisão preventiva. Para o ministro, a prisão preventiva só deve ser mantida se ficar evidenciado que se trata do único modo de afastar esses riscos contra a garantia da ordem pública e econômica, a conveniência da instrução criminal e a segurança da aplicação da lei.

"Decretar ou não decretar a prisão preventiva não deve antecipar juízo de culpa ou de inocência, nem, portanto, pode ser visto como antecipação da reprimenda nem como gesto de impunidade."

Segundo o relator, no entanto, a prisão preventiva não pode ser apenas justificada pela possibilidade de fuga dos envolvidos, sem indicação de atos concretos e específicos atribuídos a eles que demonstrem intenção de descumprir a lei. O ministro citou que, no caso dos envolvidos no suposto esquema de desvio de recursos na Petrobrás, há indícios da existência de graves crimes, como formação de cartel, corrupção ativa e lavagem dinheiro, e ressaltou a importância que teve a prisão preventiva na interrupção da prática desses crimes.

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No entanto, para o ministro relator, os riscos para a ordem social e para a apuração dos fatos foram reduzidos e a prisão pode ser substituída de forma eficaz por medidas alternativas.

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"Não se nega que a sociedade tem justificadas e sobradas razões para se indignar com notícias de cometimento de crimes como os aqui indicados e de esperar uma adequada resposta do Estado, no sentido de identificar e punir os responsáveis. Todavia, a sociedade saberá também compreender que a credibilidade das instituições, especialmente do Poder Judiciário, somente se fortalecerá na exata medida em que for capaz de manter o regime de estrito cumprimento da lei, seja na apuração e no julgamento desses graves delitos, seja na preservação dos princípios constitucionais da presunção de inocência, do direito à ampla defesa e ao devido processo legal, no âmbito dos quais se insere também o da vedação de prisões provisórias fora dos estritos casos autorizados pelo legislador", sustentou o ministro.

O ministro Gilmar Mendes considerou que as medidas alternativas à prisão são suficientes para a garantia da ordem pública neste momento e por acreditar que inibem a possibilidade de reiteração criminosa, tendo em vista que Ricardo Pessoa renunciou à direção da UTC, que também está impedida de fazer contratos com a Petrobrás.

Citando o julgamento do mensalão, o ministro lamentou que o Brasil esteja marcado pela "triste sina de disputar e ganhar campeonatos mundiais de corrupção" e salientou a gravidade dos fatos desvendados pela operação Lava Jato, cujo desdobramento se dava enquanto o STF julgava a Ação Penal (AP) 470.

"Se no mensalão analisamos pagamentos a parlamentares da base aliada financiados por verbas de contratos de publicidade e empréstimos bancários fajutos, aqui temos quadro potencialmente mais sombrio. A investigação aponta que a Petrobrás - a petroleira que mais investia no mundo - estaria contratando suas obras de engenharia com um grupo de empreiteiras, um suposto cartel, que controlava os preços e devolvia 3% de tudo o que recebia aos corruptos", afirmou.

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Quanto aos demais fundamentos que embasaram a prisão de Pessoa, o ministro afirmou que também não mais se justificam. "Tenho que a decisão que decretou as prisões preventivas indica prova robusta da existência de crimes graves e indícios suficientes de sua autoria. Estamos longe também de falar em excesso de prazo nas prisões. Pelo contrário: para um caso com esse número de réus e complexidade, o desenvolvimento da instrução é mais que satisfatório. O paciente foi preso em 14/11/2014. O encerramento da instrução, com o interrogatório dos últimos réus, está marcado para o 11 próximo. No que se refere aos fundamentos do decreto, a prisão já não se justifica pela conveniência da instrução criminal ou para a assegurar a aplicação da lei penal. As testemunhas relevantes foram inquiridas, o risco de fuga não é concreto", afirmou.

Divergência. A ministra Cármen Lúcia divergiu do voto do relator e votou por negar o pedido de habeas corpus feito pela defesa de Ricardo Ribeiro Pessoa. No seu entendimento, o decreto da prisão preventiva se fundou nas evidências de prática de crimes de alta gravidade contra a administração pública e de lavagem de dinheiro. Ainda que a suspensão das práticas delitivas com a prisão preventiva esgotem seu fim com o encerramento da instrução criminal, esta ainda não foi totalmente encerrada.

Para a ministra, mesmo com interrogatório já marcado para a próxima semana, seu resultado pode levar à realização de novas diligências, e testemunhas podem ser novamente inqueridas. Se depois do último interrogatório houver o encerramento da instrução criminal, pode haver a modificação desse quadro. "Não existe instrução quase acabada."

Outro ponto ressaltado pela ministra foi a continuidade dos contratos da UTC com a Petrobrás e com a administração pública, e a possível participação do acusado na gestão da empresa, mesmo com seu afastamento formal da direção. Ainda em casa é possível ao acusado seguir com a comunicação virtual e a circulação de pessoas, possibilitando a participação nos negócios da empresa. A suspensão de novos contratos com a Petrobras não impede a continuidade de contratos em curso e obras em andamento - os quais, segundo os dados do Ministério Público Federal, superam R$ 7 bilhões - nem a realização de novos contratos com o poder público. Assim, diz a ministra, seria difícil saber da eficácia das medidas restritivas alternativas à prisão propostas no voto do relator. "Não sei como essas medidas poderiam ser impostas com controle absoluto", afirmou, ao negar o HC.

Último a votar, o decano da Corte acompanhou a divergência aberta pela ministra Cármen Lúcia. Para ele, ainda persistem os motivos que ensejaram a edição do decreto prisional do empresário: a periculosidade do réu e a probabilidade de continuidade dos graves delitos de organização criminosa, corrupção ativa e lavagem de dinheiro. Para o ministro, é inviável a conversão da prisão preventiva nas medidas cautelares constantes do artigo 319 do CPP.

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Segundo o ministro, as circunstâncias que justificaram a prisão cautelar do empresário não se exauriram definitivamente, especialmente pelo fato de que ainda há a possibilidade de nova inquirição das testemunhas que já depuseram. De acordo com a denúncia, mesmo durante as investigações, negociava-se, com envolvimento da UTC, pagamento de propinas e cooptação de agentes públicos.

"Torna-se inviável a conversão da prisão preventiva em medidas cautelares alternativas quando a privação cautelar da liberdade individual tem fundamento, como sucede na espécie, na periculosidade do réu em face da probabilidade real e efetiva de continuidade da prática de delitos gravíssimos, como os de organização criminosa, de corrupção ativa e de lavagem de valores e de capitais", disse o ministro.

COM A PALAVRA, A DEFESA DA GALVÃO ENGENHARIA.

Segue declaração do advogado José Luís Oliveira Lima, que conduz a defesa do diretor da Galvão Engenharia Erton Medeiros Fonseca, sobre a decisão do ministro Teori Zavascki que beneficiou o executivo.

"Essa decisão do STF recoloca o processo nos trilhos da presunção de inocência e do devido processo legal, além de assegurar a ampla defesa."

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Segundo Oliveira Lima, nos trâmites normais, Erton Fonseca será liberado pela Polícia Federal amanhã, dia 29 de abril, à primeira hora.

COM A PALAVRA, O CRIMINALISTA ALBERTO ZACHARIAS TORON, QUE DEFENDE O EMPREITEIRO RICARDO PESSOA.

"O julgamento pelo Supremo resgata uma das suas mais importantes características que é a proteção dos direitos fundamentais do acusado no processo penal. Reafirma a democracia em detrimento da irracionalidade do clamor público. Se os acusados do mensalão puderam ficar em liberdade durante todo o julgamento não há razão plausível para que neste caso (Lava Jato) os acusados também não possam ficar em liberdade."

Toron afirmou que todas as determinações impostas pelo STF serão acatadas por Ricardo Pessoa.

COM A PALAVRA, A CRIMINALISTA BEATRIZ CATTA PRETA, QUE CONDUZIU AS PRINCIPAIS DELAÇÕES PREMIADAS DA LAVA JATO.

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"A decisão do Supremo Tribunal Federal restabelece os direitos do cidadão, impedindo que a prisão preventiva se transforme em execução antecipada de pena. Porém, a meu ver, não há que se falar em prisão para forçar alguém a decidir por fazer uma delação premiada. Isso absolutamente inexiste. Note-se que, de todos os acordos de delação premiada em que atuei, desde 2004, houve apenas um único colaborador que tomou a decisão preso. Todos os outros estavam soltos, alguns respondendo a ações penais em franco andamento, outros a inquéritos policiais e, ainda, houve aqueles que optaram por colaborar sem sequer estar respondendo a procedimento algum."

COM A PALAVRA, O CRIMINALISTA CELSO VILARDI.

O criminalista Celso Vilardi, que defende o empresário João Ricardo Auler, da Camargo Corrêa, disse que "desde o início (da Operação Lava Jato) todos sabiam que a prisão decretada não encontrava respaldo na jurisprudência dos nossos tribunais".

"Tanto isso é verdade que o Tribunal Regional Federal da 4.ª Região chegou a falar em releitura da jurisprudência", assinala Vilardi. "E não cabe releitura em função da repercussão do caso."

Celso Vilardi enalteceu os ministros do Supremo Tribunal Federal. "Coube à Suprema Corte, guardiã maior da Constituição, preservar o princípio da presunção da inocência e decretar a ilegalidade das prisões."

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