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Empreiteiro explica que propina ia para campanhas via diretório

Ricardo Pessoa detalhou ao juiz da Lava Jato que UTC Engenharia repassou R$ 20 milhões ao PT via Vaccari entre 2004 e 2014; doações eleitorais eram tratadas com candidatos e não eram condicionadas a contratos, mas envolviam caixa 2 e interesses em negócios

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Por Ricardo Brandt , Fausto Macedo e Julia Affonso
Atualização:

Ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto foi criminalmente condenado por levar propinas ao partido. Foto: André Dusek/Estadão

O dono da UTC Engenharia, Ricardo Ribeiro Pessoa, afirmou à Justiça Federal nesta segunda-feira, 9, que o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto era quem distribuía internamente a propina da Petrobrás para candidatos nas disputas eleitorais. Primeiro grande executivo a se tornar delator da Lava Jato, ele voltou a apontar o pagamento de cerca de R$ 20 milhões ao partido entre 2004 e 2014, sendo que R$ 3,5 milhões desses em dinheiro vivo, via caixa 2, e o restante por doações oficiais.

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"A decisão era dele (Vaccari), eu botava no partido", afirmou Pessoa ao ser questionado pelo juiz federal Sérgio Moro - que conduz os processos da Lava Jato, em processo envolvendo propina paga ao ex-ministro José Dirceu, Vaccari e o ex-diretor da Petrobrás sustentado pelo partido Renato Duque. Segundo ele, os valores eram repassados via diretório nacional.

Em sua delação premiada, Pessoa revelou à força-tarefa da Lava Jato, em maio deste ano, que "as doações políticas são feitas para que se obtenha uma vantagem, seja ele devida ou indevida, seja para que partido for." Moro mostrou ao delator duas tabelas entregues por ele na delação, que seriam os registros dos R$ 20 milhões pagos ao PT referentes aos contratos da Petrobrás.

 

O valor, segundo Pessoa, era referente à propina acertada com Vaccari e Duque em relação às obras da Petrobrás. Uma tabela seria o registro de R$ 3,6 milhões pagos em dinheiro vivo ao partido, por intermédio do ex-tesoureiro, e o restante "em doações oficiais".

O juiz quis saber se todas as doações oficiais foram pagas com recursos de propina ou se havia uma diferenciação. "Na época de campanha as contribuições de campanha não tinham nada a ver com propina, eram contribuições de campanha mesmo. O restante não, o restante era como se pagava a comissão da propina da Petrobrás."

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Moro insistiu para que Pessoa explicasse se no caso de doações eleitorais de campanha havia vinculação direta com os contratos da Petrobrás. "Na época de campanha o senhor não fez doações em decorrência desses acertos?"

"Vinculada não, não senhor. Não porque as doações de campanha vinham geralmente com pedidos específicos para os candidatos. O Vaccari também, às vezes, pedia doação de campanha e não vinculava a isso (acertos da Petrobrás)".

Moro perguntou: "As doações que o sr fazia oficiais envolvendo esses valores de propina não eram então para políticos específicos?"

Pessoa - "Não, a decisão era dele, eu botava no partido."

"No diretório... ?", perguntou o magistrado.

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"Diretório nacional, geralmente diretório nacional."

 
 

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Caixa 2. Um dos coordenadores do cartel de empreiteiras acusado na Lava Jato, Ricardo Pessoa revelou em sua delação que mesmo as doações feitas para candidatos eram relacionadas ao caixa 2 da UTC - que tem como principal cliente a Petrobrás.

"Nunca foi pedido nada em troca, mas as doações abriram portas de acesso e colocavam a UTC em uma composição de destaque." Segundo Pessoa, "os candidatos em geral sabiam que em futuras eleições o apoio do declarante seria importante e isto fazia com que ele tivesse uma forma de 'poder'.

Só na campanha de 2014, Pessoa listou o repasse de R$ 54 milhões em doações - valor acima da média de R$ 20 milhões feitas até então. A força-tarefa quis saber qual a relação entre o aumento de doações é os novos negócios e o delator explicou que "o relacionamento com autoridades eleitas propicia a abertura de portas para que você tenha legitimidade para propor e discutir oportunidade de negócios".

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No termo de delação número 28, assinado com a PGR, Pessoa explica que usou o "caixa 2" da UTC para fazer "doações políticas". "Os candidatos em geral sabiam que em futuras eleições o apoio do declarante seria importante e isto fazia com que ele tivesse uma forma de 'poder'", registrou a força-tarefa.

Um dos casos que ele cita é a campanha de governador de São Paulo do atual ministro da Educação, Aloizio Mercadante, pelo PT, em 2010. Ele relata um encontro na casa do então candidato, no bairro Alto de Pinheiros, em São Paulo, onde estavam, além dos dois, Emídio de Souza, que era o coordenador da campanha petista, e João Santana, o presidente da Constran - comprada pela UTC em 2010.

"Ficou acertado que a doação seria de R$ 500 mil", diz Pessoa. "Emídio solicitou ao declarante que fizesse a doação oficial no valor de R$ 250 mil e o restante fosse dado em espécie." O delator acrescentou que "os R$ 250 mil dados em espécie saiu do caixa 2 do grupo UTC".

 

"Esses valores de caixa 2 foram viabilizados por meio do escritório de advocacia Roberto Trombeta", explicou Pessoa. Trombeta é um dos novos delatores da Lava Jato, que admitiu atuar na emissão de notas por falsos serviços que cobriram movimentação de propina no esquema alvo da Lava Jato. Além da UTC, ele teria atuado para outras empreiteiras do cartel, como a OAS. "Aloizio Mercadante presenciou o pedido de pagamento da parcela em espécie mas não fez nenhum comentário".

Pessoa deu outro exemplo de doação para campanha, ao mencionar visita que fez em 2010 ao candidato ao governo de Minas Helio Costa, em seu escritório político situado em Belo Horizonte.

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"Quem fez a intermediação foi o captador de recursos para a campanha de Helio Costa, cujo nome não se recorda sabendo apenas que o sobrenome era Guimarães. "Foi acertada a doação de R$ 500 mil; que Guimarães solicitou que a doação fosse feita da seguinte forma: R$ 250 mil de forma oficia e outros R$ 250 mil em espécie. Pessoa disse que o candidato Hélio Costa presenciou a tratativa.

O dono da UTC reconheceu em foto apresentada pela Procuradoria de Ivan Guimarães, como sendo o assessor de Helio Costa que acertou a doação, ser a mesma pessoa. Guimarães foi presidente do Banco Popular. O valor foi efetivamente repassado e que também era proveniente do "caixa 2" da empreiteira e também foi operacionalizado por Trombeta.

Mercadante e Costa têm negado qualquer irregularidade em suas arrecadações de campanha e envolvimento no esquema alvo da Lava Jato.

COM A PALAVRA, O MINISTRO EDINHO SILVA:

O ministro da Secom, Edinho SIlva, afirmou ao Estado que o depoimento de Ricardo Pessoa "reforça" a alegação dele de que a campanha da presidente Dilma respeitou a legislação eleitoral.

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"A fala dele só reforça aquilo que temos dito desde o início, todas as doações da campanha da presidenta Dilma ocorreram dentro da legalidade", disse.

A reportagem não localizou a defesa de João Vaccari Neto para comentar o caso. A reportagem tentou entrar em contato com a advogada Carla Domenico, que defende Ricardo Pessoa, mas ela não atendeu o telefone.

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