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É um desafio envelhecer no Brasil

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Por Victor Marcondes de Oliveira
Atualização:
Victor Marcondes de Oliveira. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O ser humano se apega a um estranho paradoxo: queremos viver mais, mas não queremos envelhecer. Relacionamos envelhecer a adoecer e morrer, e nos apegamos à ideia de que isso é algo "lá pra frente", como um interruptor que uma hora é acionado.

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Estamos sempre negando o óbvio e, consequentemente, não nos preparamos para o envelhecimento: nem o poder público, nem as empresas, nem a família e nem a própria pessoa se preparam para a velhice. Só percebemos que precisamos de atenção especial quando já estamos nela. Tudo isso tem aplicações catastróficas para a pessoa e a sociedade, em especial em um país tão desigual como o nosso: idosos morando em instituições despreparadas para recebê-los ou nas ruas sem condições de se manter financeiramente, internações hospitalares mais frequentes e longas e, por consequência, mau atendimento e saturação do sistema de saúde. Isso para ficar em poucos exemplos.

O conceito de direito dos maiores de 60 anos é recente no Brasil: até o início do século 20, os idosos aqui eram segregados e, muitos, internados em asilos. Foi apenas na Constituição de 1988 que essa parcela da população ganhou seus primeiros direitos de cidadania, o que abriu caminho para a Política Nacional de Saúde do Idoso (1999) e o Estatuto do Idoso (2003), que consolidou os direitos conferidos por diversas leis e definiu, em seu artigo 3, que "é obrigação da família, comunidade, da sociedade e do poder público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária".

Estamos muito atrasados na aplicação desses direitos. E isso é preocupante, já que os dados mostram que, em 10 anos, o Brasil será considerado um país idoso. Segundo o IBGE, temos hoje mais de 30,2 milhões de pessoas na faixa etária acima dos 60 anos. E o percentual tende a dobrar nas próximas décadas. Se, em 1980, a expectativa de vida do brasileiro era de, em média, 62 anos, em 2030 estará próxima de 80 anos. Uma das taxas mais altas de todo o mundo. Hoje, já cunhamos o termo "quarta idade" para nos referir às pessoas acima dos 80.

A pandemia da Covid-19 expôs ainda mais como estamos atrasados em relação aos cuidados com a saúde. Com o isolamento, os idosos - principal grupo de risco -, médicos e todo o sistema de saúde tiveram que buscar alternativas para o atendimento não-presencial. Com isso, a telemedicina ganhou espaço no Brasil. Mas no mundo ela já é usada há tempos como forma de facilitar e agilizar a atenção médica, estabelecendo um contato mais contínuo com os pacientes e, por consequência, melhorando o acompanhamento da saúde de cada um. Temos hoje pessoas se formando em Gerontologia, que estuda o processo de envelhecimento e o que fazer para se ter uma melhor qualidade de vida ao longo dos anos. Estudo e tecnologia juntos, para garantir um envelhecimento digno para todos.

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Outros modelos de atenção especial para o idoso já podem ser encontrados no país, mas ainda de forma tímida. Centros de atenção primária voltados exclusivamente para as demandas especiais dos mais velhos, onde a ideia é acompanhar e monitorar a saúde da pessoa, e não só a doença, também começam a ganhar forças. Locais de convivência, onde os idosos possam passar o dia e se relacionar, realizar atividades e ter acompanhamento, são opções para que eles não fiquem sozinhos em casa. Modelos de cohausing ou coliving são tendências urbanas que começam a atrair idosos independentes e autônomos. Mas tudo isso ainda é pouco perto da demanda. É preciso atenção do Estado e do setor privado para o tema, para que possamos desde já proporcionar atendimento para o envelhecimento da população.

É hora de deixar de lado os preconceitos com envelhecer e tomar as rédeas da nossa saúde e bem-estar, seja físico, financeiro ou emocional. Para uma velhice melhor temos que nos cuidar desde já.

Quanto mais cedo começarmos a pensar no futuro, muito melhor será vivê-lo.

*Victor Marcondes de Oliveira, CEO da Nilo, clínica multidisciplinar digital especializada no público 50+

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