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É possível uma súmula contra a lei?

Clara necessidade de adequação da Súmula n.º 568 do STJ ao artigo 932 do CPC

Por Hugo Filardi e Júlia Brand
Atualização:

Hugo Filardi. FOTO: DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

Não, definitivamente não é possível a manutenção de um verbete de súmula em claro desacordo com a lei. A resposta à provocação constante do titulo nos parece bastante óbvia. Contudo, a subsistência da Súmula n° 568 do Superior Tribunal de Justiça, publicada no dia 17 de março de 2015, mesmo após a entrada em vigor do CPC/15, no ano seguinte, nos remete à uma clara afronta à regra dos julgamentos colegiados, além de violações aos princípios da motivação das decisões judiciais, devido processo legal e da segurança jurídica. Mostra-se ilegal e ilegítima a manutenção de súmula do STJ que prestigie julgamentos monocráticos e permita ampliar os poderes do Relator em desconformidade com o que é legalmente previsto pelo CPC/15.

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A referida Súmula n° 568/STJ diz que: "O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema." Vejam que o enunciado de súmula é baseado em conceito jurídico indeterminado e que sua aplicação, por si só, já viola o artigo 489 do CPC. A margem de ilegalidade gerada pela súmula n° 568/STJ é ampliada de sobremaneira com a leitura da redação artigo 932 do CPC, que estabelece em rol taxativo as hipóteses plausíveis de afastamento da regra do julgamento do colegiado em delegação de poderes aos Ministros Relatores.

Nesse sentido, o campo nebuloso da Súmula n° 568/STJ, que poderia ser conferido à falta de esclarecimento da expressão "entendimento dominante", possui sua ilegalidade robustecida pela clara desconformidade com o artigo 932, incisos IV e V, do CPC. A malfadada súmula em questão alarga, sem consentimento normativo, o campo de discricionariedade do relator e permite uma indesejada insegurança jurídica.

Assumir um julgamento monocrático, sem que a questão passe pelo colegiado, é exceção às garantias fundamentais do processo e alargamentos não previstos pelo sistema normativo criam indesejada ondas de não justificação e compreensão do papel constitucional do Poder Judiciário. O Poder Judiciário precisa coibir atividades arbitrárias e não chancela-las por meio de súmulas ilegais.

O que se espera de um julgamento colegiado é que a resolução do caso possa ser feita a partir de um debate entre as teses conflitantes das partes e construção colaborativa de decisão compreensível pelos jurisdicionados. A sociedade civil não tolera mais "escapismos judiciais", decisões não exaustivamente motivadas e entregas jurisdicionais artificiais.

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Logo, mostra-se imperiosa a necessidade de revogação, cancelamento ou até adequação da Súmula n° 568/STJ aos princípios constitucionais do devido processo legal, da legalidade, da motivação das decisões judiciais e da segurança jurídica, à regra do julgamento pelo colegiado e ao sistema de precedentes estabelecido pelo CPC em vigor.

A subsistência da Súmula n° 568/STJ é uma afronta aos julgamentos seguros e abre margem à entrega jurisdicional em desacordo às expectativas concretas dos jurisdicionados no Estado Democrático de Direito. Os julgamentos precisam cada vez mais reforçar os ideais de justiça participativa e de decisões compromissadas com a resolução do mérito dos casos postos para apreciação do Poder Judiciário.

*Hugo Filardi, doutor e Mestre em Direito pela PUCSP. Bacharel em Direito pela Faculdade Nacional de Direito/UFRJ. Advogado e professor

*Júlia Brand, graduanda em Direito pela Faculdade Nacional de Direito/UFRJ

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