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Dnit e poder de multa em veículos de passeio por excesso de velocidade

Por Andre Luis Alves de Melo
Atualização:
André Luís Alves de Melo. FOTO: MPD/DIVULGAÇÃO Foto: Estadão

O tema sobre o poder de multa do DNIT, e órgãos similares, para excesso de velocidade em veículos de passeio ainda gera discussões jurídicas, uma vez que o STJ não esgotou o tema, como se acredita.

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Prima facie, registra-se que o DNIT   não é um órgão genuinamente de trânsito, mas sim de conservação rodoviária. No entanto, tem focado muito em medidas de controle de velocidade, inclusive de veículos particulares, em vez de peso de cargas em caminhões e fiscalização de transporte coletivo, as quais são suas atribuições inatas também.

Muito embora o DNIT alegue que tem legitimidade concedida pelo CONTRAN, este não pode conceder o que não tem. Ou seja, não pode outorgar pode de fiscalização, pois CONTRAN não é órgão de fiscalização, mas apenas normativo.

Nos termos do art. 21, VIII, do CTB, o DNIT é um órgão executivo rodoviário, logo pode aplicar multas por excesso de peso, mas não por excesso de velocidade para veículos particulares, o que é prerrogativa dos órgãos executivos de trânsito, os quais estão elencados no art. 22 do CTB.

O DNIT apenas poderia multar por excesso de velocidade se tivesse um convênio com algum dos órgãos executivos de trânsito, como a PRF, e isto inexiste.          

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As atribuições do CONTRAN estão elencadas no art. 14 do CTB e não consta no rol o poder normativo para transformar órgãos rodoviários em órgãos de trânsito.  Nem mesmo tem tal atribuição o CONTRAN/DENATRAN.

Logo, é nulo auto de infração sobre velocidade de veículo particular emitido pelo DNIT, salvo se tiver convênio com Polícia Rodoviária Federal, conforme art. 23 do CTB, ou outro órgão de trânsito, o que inexiste até a presente data.

Outrossim, o STJ não transformou o DNIT, e órgãos similares. em órgãos executivos de trânsito, apenas afirmou que podem exercer tal competência mediante convênio, caso contrário atuam apenas na competência do art. 21 do CTB. REsp. n. 1.588.969 e n. 1.613.733 - 28.02.18

Segundo o STJ, com o advento da Lei 10.561/02, o DNIT foi "expressamente autorizado a exercer, em sua esfera de atuação - ou seja, nas rodovias federais, consoante disposto no artigo 81, II, da referida Lei 10.233/01 -, diretamente ou mediante convênio, as competências expressas no artigo 21 do Código de Trânsito Brasileiro". No entanto, o STJ consta do voto que ficou definido como "inconteste" a competência do DNIT para fiscalizar o trânsito, devendo esse trabalho ser feito em conjunto com o Departamento de Polícia Rodoviária Federal, "para a realização de uma efetiva fiscalização do trânsito, com o escopo de assegurar o exercício do direito social à segurança, previsto no artigo 6º, caput, da Constituição Federal de 1988", afirmou a relatora.

Logo, ainda que se entenda que pode exercer atividade de órgão executivo de trânsito, esta depende de convênio com a PRF, quando para fiscalizar veículos de passeio, e não com autorização pelo CONTRAN. Afinal, atuação em conjunto depende de convênio, inclusive para que a PRF possa manifestar sobre os locais que mais precisam de radar, por exemplo, e quais as velocidades sugeridas. Em geral nos Estudos Técnicos do DNIT a PRF nem foi ouvida sobre os mesmos. 

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Art. 2o  A Lei no 10.233, de 5 de junho de 2001, passa a vigorar com as seguintes alterações:

"Art. 24. .............................................................

.............................................................

XVII - exercer, diretamente ou mediante convênio, as competências expressas no inciso VIII do art. 21 da Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro, nas rodovias federais por ela administradas.

Ocorre que as competências do art. 21 do CTB é de órgão executivo rodoviário e não de órgão de trânsito.  As competências de órgão executivo de trânsito estão previstas no art. 22 do CTB, e esta competência a lei não outorgou ao DNIT. Vejamos abaixo a diferença entre órgãos de trânsito e órgãos rodoviários no CTB:

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Art. 21. Compete aos órgãos e entidades executivos rodoviários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição:

        I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de suas atribuições;

        II - planejar, projetar, regulamentar e operar o trânsito de veículos, de pedestres e de animais, e promover o desenvolvimento da circulação e da segurança de ciclistas;

        III - implantar, manter e operar o sistema de sinalização, os dispositivos e os equipamentos de controle viário;

        IV - coletar dados e elaborar estudos sobre os acidentes de trânsito e suas causas;

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        V - estabelecer, em conjunto com os órgãos de policiamento ostensivo de trânsito, as respectivas diretrizes para o policiamento ostensivo de trânsito;

        VI - executar a fiscalização de trânsito, autuar, aplicar as penalidades de advertência, por escrito, e ainda as multas e medidas administrativas cabíveis, notificando os infratores e arrecadando as multas que aplicar;

        VII - arrecadar valores provenientes de estada e remoção de veículos e objetos, e escolta de veículos de cargas superdimensionadas ou perigosas;

      VIII - fiscalizar, autuar, aplicar as penalidades e medidas administrativas cabíveis, relativas a infrações por excesso de peso, dimensões e lotação dos veículos, bem como notificar e arrecadar as multas que aplicar;

        IX - fiscalizar o cumprimento da norma contida no art. 95, aplicando as penalidades e arrecadando as multas nele previstas;

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        X - implementar as medidas da Política Nacional de Trânsito e do Programa Nacional de Trânsito;

        XI - promover e participar de projetos e programas de educação e segurança, de acordo com as diretrizes estabelecidas pelo CONTRAN;

        XII - integrar-se a outros órgãos e entidades do Sistema Nacional de Trânsito para fins de arrecadação e compensação de multas impostas na área de sua competência, com vistas à unificação do licenciamento, à simplificação e à celeridade das transferências de veículos e de prontuários de condutores de uma para outra unidade da Federação;

        XIII - fiscalizar o nível de emissão de poluentes e ruído produzidos pelos veículos automotores ou pela sua carga, de acordo com o estabelecido no art. 66, além de dar apoio às ações específicas dos órgãos ambientais locais, quando solicitado;

        XIV - vistoriar veículos que necessitem de autorização especial para transitar e estabelecer os requisitos técnicos a serem observados para a circulação desses veículos.

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        XV - aplicar a penalidade de suspensão do direito de dirigir, quando prevista de forma específica para a infração cometida, e comunicar a aplicação da penalidade ao órgão máximo executivo de trânsito da União.     (Incluído pela Lei nº 14.071, de 2020)     (Vigência)

        Parágrafo único.  (VETADO) 

        Art. 22. Compete aos órgãos ou entidades executivos de trânsito dos Estados e do Distrito Federal, no âmbito de sua circunscrição:

        I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito das respectivas atribuições;

        II - realizar, fiscalizar e controlar o processo de formação, de aperfeiçoamento, de reciclagem e de suspensão de condutores e expedir e cassar Licença de Aprendizagem, Permissão para Dirigir e Carteira Nacional de Habilitação, mediante delegação do órgão máximo executivo de trânsito da União;        (Redação dada pela Lei nº 14.071, de 2020)     (Vigência)

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         III - vistoriar, inspecionar as condições de segurança veicular, registrar, emplacar e licenciar veículos, com a expedição dos Certificados de Registro de Veículo e de Licenciamento Anual, mediante delegação do órgão máximo executivo de trânsito da União;         (Redação dada pela Lei nº 14.071, de 2020)     (Vigência)

        IV - estabelecer, em conjunto com as Polícias Militares, as diretrizes para o policiamento ostensivo de trânsito;

        V - executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis pelas infrações previstas neste Código, excetuadas aquelas relacionadas nos incisos VI e VIII do art. 24, no exercício regular do Poder de Polícia de Trânsito;

        VI - aplicar as penalidades por infrações previstas neste Código, com exceção daquelas relacionadas nos incisos VII e VIII do art. 24, notificando os infratores e arrecadando as multas que aplicar;

        VII - arrecadar valores provenientes de estada e remoção de veículos e objetos;

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        VIII - comunicar ao órgão executivo de trânsito da União a suspensão e a cassação do direito de dirigir e o recolhimento da Carteira Nacional de Habilitação;

        IX - coletar dados estatísticos e elaborar estudos sobre acidentes de trânsito e suas causas;

        X - credenciar órgãos ou entidades para a execução de atividades previstas na legislação de trânsito, na forma estabelecida em norma do CONTRAN;

        XI - implementar as medidas da Política Nacional de Trânsito e do Programa Nacional de Trânsito;

        XII - promover e participar de projetos e programas de educação e segurança de trânsito de acordo com as diretrizes estabelecidas pelo CONTRAN;

        XIII - integrar-se a outros órgãos e entidades do Sistema Nacional de Trânsito para fins de arrecadação e compensação de multas impostas na área de sua competência, com vistas à unificação do licenciamento, à simplificação e à celeridade das transferências de veículos e de prontuários de condutores de uma para outra unidade da Federação;

   XIV - fornecer, aos órgãos e entidades executivos de trânsito e executivos rodoviários municipais, os dados cadastrais dos veículos registrados e dos condutores habilitados, para fins de imposição e notificação de penalidades e de arrecadação de multas nas áreas de suas competências;

        XV - fiscalizar o nível de emissão de poluentes e ruído produzidos pelos veículos automotores ou pela sua carga, de acordo com o estabelecido no art. 66, além de dar apoio, quando solicitado, às ações específicas dos órgãos ambientais locais;

        XVI - articular-se com os demais órgãos do Sistema Nacional de Trânsito no Estado, sob coordenação do respectivo CETRAN.

        XVII - criar, implantar e manter escolas públicas de trânsito, destinadas à educação de crianças e adolescentes, por meio de aulas teóricas e práticas sobre legislação, sinalização e comportamento no trânsito.      (Incluído pela Lei nº 14.071, de 2020)     (Vigência)

        Parágrafo único. As competências descritas no inciso II do caput deste artigo relativas ao processo de suspensão de condutores serão exercidas quando:        (Incluído pela Lei nº 14.071, de 2020)    (Vigência)

        I - o condutor atingir o limite de pontos estabelecido no inciso I do art. 261 deste Código;       (Incluído pela Lei nº 14.071, de 2020)    (Vigência)

        II - a infração previr a penalidade de suspensão do direito de dirigir de forma específica e a autuação tiver sido efetuada pelo próprio órgão executivo estadual de trânsito.    (Incluído pela Lei nº 14.071, de 2020)    (Vigência) 

                        Em suma, o DNIT é um órgão executivo rodoviário, e nos termos do art. 21, I, do CTB deve CUMPRIR e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de suas atribuições, o que corrobora com o inc VI do mesmo artigo. Logo, pode fiscalizar velocidade de caminhões e ônibus, transporte de cargas e profissional de pessoas, os quais exigem autorização especial para tráfego, mas não de veículos particulares, pois apenas a PRF nas rodovias federais, exceto se PRF fizer convênio com DNIT, este teria competência ampliada, o que inexiste.

                        Já a Resolução 289/08 do CONTRAN fala que o DNIT pode exercer as atribuições de fiscalização de cargas e de controle de velocidade no limite de suas atribuições. Tal decisão do CONTRAN foi dada em sede de conflito de atribuições entre PRF e DNIT, isto em 2008, e não para atuação conjunta como decidiu o STJ em 2018, e nenhum dos documentos fala que DNIT atua como órgão executivo de trânsito, com amplos poderes de atuação, e a interpretação para atribuição punitiva deve ser restritiva e não ampliativa. Nesse sentido, segue:

RESOLUÇÃO CONTRAN Nº 289, DE 29 DE AGOSTO DE 2008.

Dispõe sobre normas de atuação a serem adotadas pelo Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes - DNIT e o Departamento de Polícia Rodoviária Federal - DPRF na fiscalização do trânsito nas rodovias federais. O CONSELHO NACIONAL DE TRÂNSITO - CONTRAN, usando da competência que lhe confere o art. 12, inciso I, da Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997, que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro - CTB, e conforme Decreto n° 4.711, de 29 de maio de 2003, que trata da coordenação do Sistema Nacional de Trânsito, Considerando a necessidade de intensificar a fiscalização do trânsito nas rodovias federais, objetivando a redução dos altos índices de acidentes e a conservação do pavimento, coibindo o desrespeito aos limites de velocidades e o tráfego de veículos com excesso de peso; Considerando o disposto no inciso XIV do artigo 12 do CTB, resolve: 

 Art. 1° Compete ao Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes - DNIT, Órgão Executivo Rodoviário da União, no âmbito de sua circunscrição: 

I - exercer a fiscalização do excesso de peso dos veículos nas rodovias federais, aplicando aos infratores as penalidades previstas no Código de Trânsito Brasileiro - CTB, respeitadas as competências outorgadas à Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT pelos arts. 24, inciso XVII, e 82, § 1º, da Lei nº 10.233, de 5 de junho de 2001, com a redação dada pela Lei nº 10.561, de 13 de novembro de 2002; e

II - exercer a fiscalização eletrônica de velocidade nas rodovias federais, utilizando instrumento ou redutor eletrônico de velocidade tipo fixo, assim como a engenharia de tráfego para implantação de novos pontos de redução de velocidade.

Art. 2º Compete ao Departamento de Polícia Rodoviária Federal - DPRF: 

I - exercer a fiscalização por excesso de peso nas rodovias federais, isoladamente, ou a título de apoio operacional ao DNIT, aplicando aos infratores as penalidades previstas no CTB; e 

 II - exercer a fiscalização eletrônica de velocidade nas rodovias federais com a utilização de instrumento ou medidor de velocidade do tipo portátil, móvel, estático e fixo, exceto redutor de velocidade, aplicando aos infratores as penalidades previstas no Código de Trânsito Brasileiro - CTB. 

Registra-se que na solução de conflito acima julgada pelo CONTRAN apenas ficou claro que o Dnit, o texto não mencionou a aplicação das penalidades, apenas a incumbência de exercer a fiscalização eletrônica, mas, o texto não mencionou a aplicação das penalidades e seus limites. 

Outro aspecto é que o DNIT não vem cumprindo o art. 6º, §3º da Resolução 798/20 do CONTRAN e não tem disponibilizado os Estudos Técnicos no site do órgão, o que em tese, implica em nulidade dos autos de infração em razão da flagrante ilegalidade.

Por fim, ressalta-se que a atribuição do DNIT ainda não se encontra pacificada pelo STJ e pelo CONTRAN como defende o órgão, uma vez que como demonstrado acima, as decisões não abordam a matéria de forma exaustiva, deixando margens e lacunas para interpretação, sendo que há necessidade de ser revolver estes vazios interpretativos para que haja segurança jurídica.

*Andre Luis Alves de Melo, promotor em MG e doutor pela PUC-SP. Associado do Movimento do Ministério Público Democrático

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