Uma boa notícia no mundo corporativo é que percebemos um movimento, entre as empresas e organizações já sintonizadas com as boas práticas de governança e sustentabilidade, em direção ao que chamamos de segunda fase em suas estratégias de mapeamento da cadeia de valor.
Até hoje, ao investir em minimizar os riscos envolvendo suas relações com fornecedores, distribuidores e consumidores, as corporações procuravam focar o desenho de suas matrizes de risco no mapeamento de trabalho infantil, do trabalho análogo ao escravo, nos crimes ambientais e no combate à corrupção como forma de estar em dia com as regras do compliance. Agora, além destas, o levantamento que deve estar no radar inclui as questões voltadas à Diversidade e Inclusão.
Com tal direcionamento, certamente, ganham preciosos pontos em sua imagem. Mas, ao dar esse grande passo, uma questão se faz relevante: por onde começar, visto que a cadeia de valor das organizações é, em muitos casos, gigante?
Pelo que temos acompanhado, as primeiras e prioritárias ações devem se iniciar com as prestadoras de serviço e representantes que atendem aos clientes e consumidores, paralelamente ao trabalho que vem sendo desenvolvido com os colaboradores. Isso porque temos visto, diariamente, grandes grupos corporativos desrespeitarem os direitos humanos, andando na contramão do que prega a sociedade e, assim, manchando suas imagens perante seus diversos públicos.
Aqui no Brasil, também recentemente, o caso envolvendo uma loja da rede de supermercados Carrefour em Porto Alegre, onde um homem negro de 40 anos foi espancado até a morte por dois seguranças brancos da loja devido a um desentendimento com uma funcionária do caixa. Mais um exemplo que denota o racismo estrutural na sociedade brasileira foi a notícia, publicada agora em agosto, de outro homem negro, metalúrgico de 56 anos, ter sido obrigado a tirar parte de sua roupa em público, dentro de um supermercado da rede Assaí Atacadista, em Limeira (SP), para provar que não cometeu nenhum furto no estabelecimento.
Hoje, atos como estes, envolvendo desrespeito, preconceito e discriminação, já não são mais tolerados pela sociedade moderna. E as empresas estão percebendo isso e levando estas questões para os seus públicos internos. No entanto, no que diz respeito à D&I, o olhar para a equipe fixa da organização é importante, mas limitado. As empresas, especialmente as de consumo, têm outros públicos que devem ser incluídos na matriz de riscos. Por exemplo, os terceiros, representantes e distribuidores. Isso porque, notadamente entre os colaboradores que atendem ao público externo, ainda é muito grande a falta de capacitação, políticas e processos voltados às práticas de compliance.
O modelo de trabalho terceirizado tem sido visto pela maioria das empresas, até agora, somente como uma forma de reduzir custos. Não se percebe, ainda, dentro das corporações, um olhar mais atento para a capacitação e preparação dessas empresas para o atendimento dos clientes e públicos relacionados das organizações. E o barato, como exibem as manchetes dos jornais, tem saído caro para elas.
Ao invés de esperar pela ofensa, pelo escândalo, as empresas podem e devem atuar na prevenção dessas práticas. E a elaboração de um plano de comunicação e formação das pessoas - TODAS -, voltado para estas questões é inadiável. Melhor explicar ao acionista o investimento do que a manchete nos jornais.
Indo mais além, a prática preventiva, além de trazer benefícios para a reputação, pode estar atrelada ao impacto social que buscamos. Cada vez mais, a diversidade pode ser vista como uma estratégia de negócios, além da importante criação de uma nova estrutura social em nosso País.
Trabalhar com diversidade não pode ser moda, nem custo, muito menos Marketing. Deve ser um caminho estratégico no desenvolvimento de novos produtos e serviços, no estabelecimento de políticas afirmativas, de processos inovadores que atendam e incluam pessoas há muito tempo tratadas como invisíveis. As opções são claras: investir na prevenção - com capacitação, discussão e rodas de diálogo - ou pagar indenizações milionárias e ter a reputação abalada? Que escolha sua empresa está fazendo?
*Deives Rezende Filho é CEO e fundador da Condurú Consultoria
*Emilio Martos é head de Planejamento e Desenvolvimento Humano da Condurú Consultoria
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